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Deputado Marcos Rogério apresentou relatório em que pede a cassação de Eduardo Cunha. | Lucio Bernardo Junior/Câmara dos Deputados
Deputado Marcos Rogério apresentou relatório em que pede a cassação de Eduardo Cunha.| Foto: Lucio Bernardo Junior/Câmara dos Deputados

Após quatro horas de sessão no Conselho de Ética, o relator do processo contra o deputado afastado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), Marcos Rogério (DEM-RO) concluiu a leitura de seu relatório e de seu voto pela cassação do deputado.

Rogério destacou não ser agradável, para ele, votar pela perda do mandato de um colega e chegou a tecer elogios a Cunha na conclusão do relatório. Rogério se emocionou, com um princípio de choro, e recebeu palmas tímidas enquanto terminava a leitura. Algumas pessoas carregavam placas e gritavam “Fora Cunha” no fundo da sala.

“Não é fácil nem prazeroso para um parlamentar concluir pela cassação do mandato de um colega. Mas o dever ético e o compromisso firmado com o povo de meu Estado e com toda a sociedade brasileira não permitem afastar da conclusão de que houve por parte do representado a quebra do decoro parlamentar”, diz o voto de Rogério.

“Por todo o exposto voto pela cassação do mandato do deputado Eduardo Cosentino Cunha tendo em vista a prática de conduta tipificada no artigo 4º, inciso V, do Código de Ética e Decoro Parlamentar, pelas fartas razões contidas no presente voto.”

Na conclusão, que representa 10 páginas de um total de 86 do relatório, Rogério chama Cunha de um “notável talento da política brasileira”, mas que sua história, valores e talentos não foram suficientes para “alçá-lo aos píncaros do poder”. O relator contextualiza ainda a extensão da corrupção no País. “A quadra vivida pelo representado é pedagógica. Não é única. É sintomática. Mais que isso: é sistêmica e sistemática”, diz o texto. “Não se olvida que tenha ocorrido ao representado o que tem sido infelizmente comum acontecer com tantos homens públicos, os quais, mesmo sendo quadros de grande envergadura e valor, não conseguem se preservar isentos do voraz sistema corrupto que se instalou na política brasileira”, complementou em outro trecho.

Rogério conclui que Cunha praticou “omissão deliberada, seguida de requinte e tecnicidade buscadas com o fito de esconder práticas ilícitas diretamente ligadas ao representado”. “A movimentação milionária de recursos pelo representado restou provada ao longo da instrução, sem a mínima demonstração de que não tenha tido as origens ilícitas.” O relator volta a citar que há “provas robustas” e “evidências documentais”, como extratos bancários e declarações de autoridades e bancos estrangeiros, além do depoimentos de ao menos oito pessoas nas investigações da Lava Jato que demonstram o recebimento de propinas por Cunha no esquema de corrupção da Petrobras.

Ele alega que a defesa do peemedebista não conseguiu apresentar provas convincentes para corroborar sua tese. Rogério volta a criticar as tentativa de Cunha e de seus aliados de protelarem o processo no Conselho de Ética. “O jogo de palavras utilizado durante a instrução processual não teve o condão de afastar as provas coligidas aos autos. (...) Ainda que não houvesse a robustez de provas, a culpa do representado se mostrou patente também pelas evasivas e pelas tentativas de afastar-se do objeto da apuração. O titular de um mandato eletivo não pode se ocultar sob as sombras de dúvidas por ele mesmo criadas, sendo seu o dever de espancar tais dúvidas e demonstrar sua pureza.”

Rogério chega a ironizar a argumentação da defesa de Cunha de que o parlamentar teria constituído seu patrimônio através da operação de uma empresa exportadora de carne. “Não há registro da empresa que ele teria constituído na década de 80, não sobrou uma latinha de carne, sequer um rótulo; seu saldo bancário na Suíça continuou subindo radicalmente nos anos 2000, apesar das atividades da suposta empresa de exportação já terem terminado há muito tempo”, diz o documento ao concluir que Cunha mentiu “deliberadamente” à CPI da Petrobras quando disse não ter recebido qualquer vantagem indevida.

“Parece claro que o representado desvirtuou o uso do cargo de deputado federal, utilizando-o com o propósito de achacar particulares, criando dificuldades para, posteriormente, vender facilidades.”

Decoro

O relatório de Rogério destaca que o processo por quebra de decoro é distinto de um processo penal. “Como já assentado, os princípios que norteiam o processo penal são distintos daqueles que dão suporte e direção ao processo disciplinar, aplicado aos agentes públicos em geral”, diz ao citar o Estatuto do Servidor Público Federal que considera infrações atos ligados à lealdade, probidade, transparência e lisura. “O cometimento de ações impróprias por congressistas produz, como efeito colateral, um dano à imagem social desfrutada pelo Poder Legislativo. A instituição prejudica-se em razão dos atos dos respectivos membros.”

O texto do relatório de Rogério lembra que os casos recentes de cassação na Câmara, dos ex-deputados André Vargas, no caso Labogen, e de Luiz Argolo, envolvido em recebimento de propina através do doleiro Alberto Youssef, mostram-se decisões corretas do colegiado. Os dois acabaram condenados nos processos judiciais que se seguiram.

Pedidos de vista

Como anunciaram logo no início da sessão, integrantes da chamada “tropa de choque” de Cunha pediram vista ao relatório de Marcos Rogério, em mais uma medida protelatória do processo que pode levar à cassação do presidente afastado da Câmara. Entre os aliados que pediriam vista estavam Carlos Marun (PMDB-MS) e João Carlos Bacelar (PTN-BA).

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