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O Senado começou nesta segunda-feira (20) um período de recesso parlamentar - no qual não há votações -, depois de um início de ano marcado por denúncias de atos secretos, afastamento de diretores e revelação da existência de contas ocultas. Nesse primeiro semestre em crise, senadores foram autores de 17,2% dos projetos de lei aprovados na Casa em caráter final.

De acordo com números disponíveis no site do Senado, entre fevereiro e 17 de julho (último dia de atividade legislativa antes do recesso do meio do ano), os senadores aprovaram um total de 327 matérias (188 projetos de lei, 15 medidas provisórias, duas propostas de emenda à Constituição, 21 projetos de resolução, 64 indicações de embaixadores e autoridades e 37 projetos de decreto legislativo).

Esse número é ainda maior, se levados em conta requerimentos e projetos de decreto legislativo referentes a concessões de serviços de radiodifusão, não contabilizados no levantamento, efetuado pela Secretaria-Geral do Senado.

Das 327 matérias aprovadas, 64 resultaram em textos já sancionados ou levados à sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para virar lei, dos quais 11 são de autoria de senadores (17,2%), segundo levantamento do G1 com base nos dados do Senado. A maioria dos projetos aprovados neste ano pelos senadores são de autoria do Executivo ou de deputados.

O Senado votou ainda, no plenário e em comissões, outros 124 projetos de lei, substitutivos, emendas a projetos e duas emendas à Constituição que foram remetidos à Câmara e estão em tramitação (ainda não têm aprovação final).

Para o primeiro-secretário do Senado, Heráclito Fortes (DEM-PI), a crise "atrapalhou" a produtividade da Casa no primeiro semestre do ano. No entanto, ele cita a quantidade de medidas provisórias (MPs) do Executivo como causa da "paralisação" do plenário.

Poder Legislativo x Executivo

Oficialmente, o site do Senado descreve como principal papel do senador "propor, discutir e deliberar sobre a estrutura legislativa do país". Já o Poder Executivo tem entre suas funções exclusivas legislar sobre matérias do direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho, entre outros.

O cientista político Ricardo Oliveira, professor da Universidade Federal do Paraná (UFPR), diz que as políticas públicas e o cronograma de votação do Congresso são definidos pelo Executivo, o que fica evidente pelo grande número de medidas provisórias. Segundo ele, pelo que se observa desde a redemocratização, e especialmente nos últimos dois governos, a maioria dos membros do Legislativo têm apenas o "interesse corporativo" em garantir sua sobrevivência política por meio da aprovação dos projetos propostos pelo governo.

"Na hora em que existe uma ameaça, surge uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito). Mas, no geral, o Legislativo deixa tudo passar", diz o professor. Com senadores e deputados "trabalhando para o governo", ressalta o cientista político, não se cria uma agenda positiva, de ideias variadas, para os problemas do país, uma vez que as soluções partem da mesma fonte.

Oliveira cita o caso do Orçamento da União, que já vem pronto do Executivo, com Câmara e Senado apenas servindo como "homologadores" das contas feitas pelos ministérios – não existe, portanto, questionamento significativo sobre como o dinheiro dos impostos será usado. "Não há iniciativa política no sentido de elaborar leis, não há função legislativa", afirma.

O vice-presidente do Senado, Valdir Raupp (PMDB-RO), afirma que os projetos que têm origem no Congresso demoram muito para ser aprovados em razão da prioridade dada às MPs– que trancam a pauta de votações.

Ele ressalta, no entanto, a quantidade de projetos aprovados em comissões temáticas. "As crises e embates atrapalham, sem dúvida, mas isso é comum em todos os parlamentos", disse.

Para o líder da minoria, Raimundo Colombo (DEM-SC), as MPs impedem um debate "mais consistente".

"Não conseguimos fazer coisas a que nos propusemos, a reforma política, a reforma tributária. A gente não avançou nisso. Essas coisas mais circunstanciais têm pouco efeito na vida das pessoas."

Na opinião do senador Pedro Simon (PMDB-RS), foi "um semestre muito melancólico para o Senado".

"As decisões tomadas foram por medida provisória. A ordem do dia [foi] trancada por medida provisória. O restante, de votação de matérias do Congresso e do Senado foi muito pouco."

Eleito presidente da CPI da Petrobras, motivo de embates entre governo e oposição, o vice-líder do governo, João Pedro (PT- AM), afirma que a produção "baixa" é efeito da crise enfrentada pela Casa.

"Desde a eleição em fevereiro da Casa ninguém conseguiu harmonizar o Senado. E aquilo que poderia ficar dentro do Senado acabou saindo e envolveu toda a sociedade: orçamento dos diretores, comissões, um debate duro dentro da Casa envolvendo o presidente, o que foi extremamente negativo", diz.

Câmara

No primeiro semestre, segundo dados da Câmara, os deputados aprovaram 34 propostas, entre projetos de lei e projetos de lei complementar e uma proposta de emenda à Constituição (PEC), além de 17 medidas provisórias.

A votação de PECs é um importante indicador do trabalho de senadores e deputados, já que, para aprová-las, é necessário o voto da maioria dos componentes das duas casas, isto é, 308 deputados e 41 senadores no mínimo.

As demais matérias aprovadas pelo plenário da Câmara no período são projetos de decreto legislativo (65) e de resolução (6).

Para o presidente interino da Câmara, deputado Marco Maia (PT-RS), a Casa teve "um dos melhores resultados dos últimos anos para um primeiro semestre".

"Foram votadas 123 matérias no plenário e 561 de caráter terminativo, ou seja, que não precisam ir a plenário, nas comissões", afirma.

O deputado credita o desempenho à mudança na tramitação das medidas provisórias (MPs) editadas pelo Executivo, que não trancam mais as votações.

Pela nova interpretação adotada na Câmara, anunciada em março pelo presidente Michel Temer, PECs, projetos de lei complementar, resoluções e decretos legislativos podem ser votados em sessões extraordinárias, mesmo com a pauta trancada por MPs nas sessões ordinárias.

As 17 MPs aprovadas no período representam 50% dos projetos de lei e complementares aprovados. No mesmo período do ano passado, no entanto, foram 37 MPs aprovadas.

Embora considere a nova regra "um avanço", o deputado Ivan Valente (PSOL-SP) afirma que "o sistema de funcionamento da Câmara e particularmente o excesso de MPs criam uma distância da participação do conjunto maior dos deputados." "Muitas coisas são resolvidas na base de acordo com lideranças", diz.

Ele cita como exemplo propostas como a de uma política de assistência farmacêutica; a votação, em segundo turno, do fim do voto secreto e a PEC que trata do trabalho escravo como proposições que aguardam há anos por aprovação na Casa.

Para o deputado, "a metodologia de não votar senão questões acordadas prejudica a imagem da Câmara".

Frequência

Em meio à crise que atingiu o Senado, a taxa de presença de senadores e deputados às sessões deliberativas (em que são votados projetos) foi superior a 80% no período, segundo dados fornecidos pelas duas Casas.

Até a primeira semana de julho, cada sessão teve a presença, em média, de 66 dos 81 senadores (taxa de 83,4%). Na Câmara, no mesmo período, 418 dos 513 deputados (taxa de 81,5%), em média, compareceram às sessões deliberativas. Para o coordenador de projetos da ONG Transparência Brasil, Fabiano Angélico, "é comum que freqüência seja mais alta nas sessões de votação", que para ele representa o "grosso do trabalho" dos parlamentares, mas não "o mais importante".

"Onde é mais importante o trabalho dos deputados e senadores é nas comissões. É ali que o projeto é debatido em seus detalhes, onde são retirados artigos importantes. É ali que os lobistas atuam, principalmente na mais importante delas que é a Comissão de Constituição e Justiça", afirma.

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