Comportamento

Carolina Werneck

Apaixonada por Copa, torcedora explica por que não está torcendo pelo Brasil este ano

Carolina Werneck
21/06/2018 18:52
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Torcedora brasileira se desanima durante o empate por 1 x 1 do Brasil com a Suíça pela primeira partida da Copa 2018, em Rostov, na Rússia. Foto: Jonathan Campos/Gazeta do Povo

Nascida em 1986, Mariana Figueiredo parecia ter absorvido o clima de Copa do Mundo que permeou aquele ano. Desde muito pequena já sabia recitar a escalação completa da seleção brasileira. Torcia luzindo sempre a mesma bandeira. Mas, em 2018, foi acometida pela maior desilusão amorosa de sua vida: o desencanto pela seleção.
Para a Copa de 1994, ela ganhou uma bandeira de presente da mãe. Desde então, só via os jogos enrolada nela. Depois da derrota para a França, na final de 1998, chorou tanto que prometeu para si mesma que, um dia, seria a pessoa “que ficava na beira do campo, que eu nem sabia que era um jornalista”, só para poder perguntar aos jogadores o que tinha acontecido. Virou jornalista mesmo.
Em 2014 ela foi até São Paulo para ver o jogo de abertura da Copa do Brasil. “Eu me preparei financeiramente para aquela Copa. Comprei muitos ingressos, estourei meu cartão com os ingressos. Meu pai comprou uma camisa do Brasil para cada filha e mandou personalizar todas, cada uma custou quase R$ 400.” Morando em Curitiba, a mineira de Coronel Fabriciano esteve no estádio nas quatro partidas disputadas na cidade.
Mariana, à esquerda, faz festa durante a Copa do Mundo de 2014. Foto: Arquivo Pessoal
Mariana, à esquerda, faz festa durante a Copa do Mundo de 2014. Foto: Arquivo Pessoal

“Eu já esperava o 7 x 1”

E o responsável pela falta de ânimo para torcer nem foi o placar de Alemanha 7 x 1 Brasil na Copa de 2014. “O 7 x 1 eu já esperava. Não esperava que seriam sete, mas uns 4 x 0 eu esperava, naquele jogo. Para mim, a seleção já teria parado no Chile [nas oitavas de final, o Brasil empatou em 1 x 1 com a equipe chilena, mas avançou às quartas na disputa por pênaltis]. Eu sabia que a seleção não tinha mérito para ir adiante. Por mais que eu estivesse torcendo, eu sabia que não chegaria.” Mesmo surpresa com a vitória sobre o Chile e, no jogo seguinte, sobre a Colômbia, Mariana chegou a tentar comprar ingressos para a fatídica semifinal contra a Alemanha, mas não teve sucesso.
Só por isso ela não estava no Mineirão, em Belo Horizonte, naquele dia. Embora não considerasse a seleção a mais capacitada para vencer a Copa, ela diz que gostava da equipe do técnico Luiz Felipe Scolari.

“Eu tinha mais simpatia por aquela seleção. A pessoa que gosta de futebol torce primeiro por um bom futebol, um bom espetáculo. Claro que a gente sempre torce pro time do coração, mas na copa do mundo quem gosta torce pelo bom futebol.”

Para ela, o problema do time liderado por Tite para a Copa de 2018 é a escolha dos jogadores. “A gente está acostumado a ver jogadores excepcionais no Brasil. Em 2002 [quando o país conquistou o pentacampeonato], nós tínhamos Roberto Carlos, Lúcio, Rivaldo, Ronaldo, Ronaldinho Gaúcho, Kaká, Marcos. Era fácil escalar.” Mariana lembra que peças importantes da seleção jogavam no Brasil. Era o caso do goleiro Marcos, que defendia o Palmeiras, e do meia Kaká, na época no São Paulo. Na equipe atual, apenas três jogadores atuam no Brasil e, ainda assim, eles não costumam ser titulares.
Diante do desânimo com a Copa deste ano, ela analisa que esse fator também tem uma parcela de culpa. “Eu torço para o Atlético Mineiro, o Atlético Mineiro me tira a sanidade. Se tem um jogador do meu time escalado, é claro que eu vou sentar para assistir. Mas eles pegam só jogadores que jogam na Europa e a maioria das pessoas não acompanha futebol europeu.”
Em 2014, o pai de Mariana deu uma camisa oficial da seleção, personalizada, para cada filha. Foto: Arquivo pessoal
Em 2014, o pai de Mariana deu uma camisa oficial da seleção, personalizada, para cada filha. Foto: Arquivo pessoal

Falta comprometimento

Depois de passar a vida toda acompanhando não só a Copa do Mundo, mas o futebol como um todo, a mineira se revolta com a atitude da geração atual. “A seleção de 1994, por exemplo, tinha uma coisa que eu estava observando esses dias. Eles conseguiam virar o placar. Eu não vejo capacidade de recuperação nesta seleção. Pode perceber no jogo contra a Suíça, quando tomam gol eles se desestabilizam.”
Por causa da postura das estrelas brasileiras, em 2018 a bandeira que a acompanhou em todas as Copas ainda nem saiu do armário. Mariana não vê nos convocados do Brasil muita força de vontade.

“Antigamente o sonho dos jogadores era vestir a camisa da seleção. E, quando isso acontecia, eles davam a alma. Hoje, não. Hoje o negócio é ir para o Real Madri, Barcelona, Paris Saint Germain, ser o melhor do mundo. Então os objetivos mudaram.” Mas ela diz não torcer contra a seleção. “Só abdiquei de torcer”, explica.

Se muito da força da seleção de Tite depende de Neymar, muito da desilusão de Mariana com a equipe também é responsabilidade dele. “Eu não gosto de como o Tite escala o time, mas minha aversão maior é pelo Neymar. Eu não gosto nem de olhar, não gosto do futebol dele. Ele é o tipo de jogador que, se os outros dez jogadores forem muito bons, ele joga bem.”
Ela também critica a postura extracampo do jogador, que já esteve envolvido em alguns processos por suposta sonegação de impostos. “Eu falei que, enquanto o Neymar estiver na seleção, eu não vou torcer. Tem gente que acha meu posicionamento radical, mas acho que a gente tem que se posicionar, porque isso também é corrupção.”
Pela primeira vez Mariana não se empolgou nem com o álbum da Copa. Foto: Marcelo Andrade/Gazeta do Povo
Pela primeira vez Mariana não se empolgou nem com o álbum da Copa. Foto: Marcelo Andrade/Gazeta do Povo

Copa sem festa

Esta é a primeira Copa do Mundo que Mariana praticamente ignora. Em edições anteriores, diz, ela reservava mesas em bares, combinava churrascos e convidava os amigos para acompanhar os jogos. Mesmo antes da primeira partida, seu álbum de figurinhas já estaria completo.  Por isso ninguém entendeu quando, às vésperas da Copa da Rússia, ela soltou um texto em sua página no Facebook dizendo que não estava nem aí para a seleção brasileira.
“Eu recebo dois, três convites por semana para ver os jogos em algum lugar. As pessoas estranham meu comportamento e, mais que isso, elas reprovam. Tem um amigo meu que disse que só vai falar comigo depois que a Copa acabar“, conta, rindo. Isso porque ela já expressou opiniões pouquíssimo populares quanto ao desempenho brasileiro. Quando diz que talvez o país não passe nem da primeira fase, muita gente faz cara feia. “Mas quem acompanha futebol sabe que a gente não tem seleção para pegar o hexa. Se passar da primeira será eliminado nas oitavas ou nas quartas.”
Mariana, que está à direita, sorrindo em uma das Copas passadas. Foto: Arquivo Pessoal
Mariana, que está à direita, sorrindo em uma das Copas passadas. Foto: Arquivo Pessoal

Dá para ter esperança?

Mesmo ignorando as atuações da amarelinha, ela diz que entende por que muitas pessoas ainda torcem durante a Copa. Para a mineira, o futebol funciona como uma válvula de escape para as agruras causadas pela crise política vivida no país. Ali, dentro das quatro linhas, o Brasil é reconhecidamente o melhor do mundo. Ou foi. “Não é porque a gente não está nem aí para a política, mas pelo entendimento de que, no futebol, não tem ninguém melhor que a gente. Até esse brilho, hoje, está bem ofuscado.”
Mas, se o desânimo de Mariana com o futebol canarinho é tão grande, será que algum dia os brasileiros poderão sonhar de verdade com o hexa? “Fiquem tranquilos, gente. O hexa vem em 2026. Porque eu acho que tem que vir uma nova safra de jogadores”, arrisca.

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