Comportamento

Camila Petry Feiler, especial para Gazeta do Povo

“As escolas preparam alunos para os hospitais psiquiátricos”, diz Augusto Cury

Camila Petry Feiler, especial para Gazeta do Povo
19/05/2017 14:00
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O psiquiatra e escritor Augusto Cury lança nesta sexta-feira (19) uma campanha de combate ao jogo Baleia Azul. A ideia é promover nas redes sociais o debate entre jovens e também com os pais. Cury é crítico ao atual sistema de ensino e acredita que a pressão escolar, o excesso de informação e atividades está prejudicando as crianças e jovens.
Para ele, as crianças se tornaram escravas da informação e não têm mais tempo para viver a infância. Ainda que os pais, “desesperados”, assumam seus erros, ele acredita que é nas escolas que estão as grandes falhas. Ao focar unicamente no pensamento lógico, as instituições de ensino deixam de lado o controle emocional.
Foi justamente sobre gestão da emoção que Cury veio falar em Curitiba, no último dia 17, no Teatro Positivo. Em entrevista exclusiva ao Viver Bem, o psiquiatra colocou em xeque o uso da internet, que, segundo ele, está criando vícios e doenças, como a síndrome do Pensamento Acelerado, e afeta cerca de 80% de pessoas no mundo.
Como melhorar a inteligência emocional?
A inteligência emocional não está inserida no código genético, ela é aprendida. Só que nós estamos falando de uma outra inteligência agora, que é a inteligência da gestão da emoção. Inteligência emocional é como se fosse uma montanha, a gestão da emoção é você implodir essa montanha, pegar os blocos, usar argamassa, pisos, azulejos e construir os vários edifícios. E quais são os edifícios?Aprender a pensar antes de reagir, trabalhar perdas e frustrações, filtrar estímulos estressantes, proteger a emoção, gerenciar a ansiedade, se reinventar no caos, desenvolver resiliência, trabalhar perdas e frustrações, ser generoso, ser altruísta e não ser autopunitivo.
E como a internet tem influenciado na gestão das emoções?
A internet trouxe acessibilidade, expansão da produtividade, democratização das informações, mas trouxe também efeitos colaterais gravíssimos. Um deles é a intoxicação digital. Celulares podem viciar como drogas estimulantes, apresentando sintomas da síndrome de abstinência como a cocaína. Por exemplo, quando você retira por um ou dois dias o celular de um jovem que usa o aparelho por 3 ou 4 horas diariamente, ele vai ter síndrome de abstinência. Os sintomas são irritabilidade, baixa limiar para frustração, um tédio intenso, dificuldade de lidar com perdas e frustrações, transtorno do sono e, às vezes, humor depressivo. São as características básicas de uma síndrome de abstinência. E outra consequência importante: a geração minuto. Ou seja, tudo para eles têm que ser rápido e pronto. Essa geração aumentou os níveis de ansiedade numa velocidade nunca antes vista.
Como se caracteriza essa ansiedade?
É uma ansiedade que eu tive o privilégio de descobrir e a infelicidade de saber que grande parte da população é acometida por ela. Chama síndrome do Pensamento Acelerado. Pensar é bom. Pensar com consciência crítica é ótimo. Pensar demais e sem gerenciamento é uma bomba contra a saúde emocional.
Quais os sintomas dessa síndrome?
Os sintomas são acordar cansado, dor de cabeça, dores musculares, sofrimento por antecipação, dificuldade de proteger a emoção nos focos de tensão, dificuldade de conviver com pessoas lentas, transtorno do sono e déficit de memória. Se tiver dois ou três sintomas, já caracteriza a síndrome do pensamento acelerado. Essas pessoas precisam reciclar sua forma de vida, senão serão futuros pacientes de psiquiatras, médicos psicossomáticos ou de clínicos gerais.
A internet é a grande causadora de tudo isso?
A causa é, em primeiro lugar, o excesso de informação. Uma criança de 7 anos de idade tem mais informações do que um imperador romano, uma de 8 a 9 anos tem mais informações que Sócrates, Platão e Aristóteles. Em segundo lugar, o excesso de atividade. Infelizmente nós estamos assistindo a um trabalho infantil escravo intelectual. Crianças que têm tempo para tudo, mas não têm tempo para ter infância. Têm mil atividades, mas não conseguem lidar com o tédio e a ansiedade inerente à psique humana.
E qual o papel da educação, dos pais e professores, diante disso?
Antigamente, os pais nunca assumiam que erraram na educação. Agora, como digo no livro que estou lançando (“20 Regras de Ouro para Educar Filhos e Alunos” Ed. Academia de Inteligência), os pais estão tão desesperados que já assumiram que falharam. E as regras de ouro precisam ser trabalhadas na educação, caso contrário, vamos continuar no erro. As escolas preparam os alunos para os hospitais psiquiátricos. Essa educação cartesiana que bombardeia o córtex cerebral com milhões de dados está doente.
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