Comportamento

Guilherme Grandi

Black Mirror da vida real: chineses podem ser proibidos de viajar de avião e trem

Guilherme Grandi
21/03/2018 17:00
Thumbnail

Os chineses serão classificados em um "ranking de confiança", acessível por todos os órgãos do governo. Foto: Governo da China/Xinhua

A partir do dia 1º de maio, os chineses que transgredirem alguma lei do país serão proibidos de andar de avião ou trem por até um ano, de acordo com uma medida polêmica divulgada na última semana pelo Comitê Nacional de Reformas e Desenvolvimento. A restrição, anunciada oficialmente no dia 2 de março pelo presidente Xi Jinping, faz parte de um sistema de crédito social em que os cidadãos serão pontuados negativamente em uma espécie de “ranking de confiança”.
Entre as transgressões que gerarão pontos negativos, há desde penalidades leves a até algumas mais graves. Quem difundir informações falsas sobre terrorismo, por exemplo, receberá mais pontos. Já quem apenas usar um passe de ônibus vencido, receberá menos. Mas, todos estes pontos serão contados para apontar se um cidadão é ou não confiável.
O presidente do país afirmou ao site do Comitê que o sistema de crédito social tem como base o princípio de “uma vez não confiável, sempre restrito”. O aviso foi assinado por oito ministérios, incluindo o órgão regulador de aviação do país e a Suprema Corte Popular. Todas as repartições governamentais compartilharão as informações de confiabilidade dos seus cidadãos.
Ou seja, se um cidadão transgredir alguma regra do serviço social, o departamento de trânsito irá saber. E assim será, segundo o Comitê, com praticamente todas as áreas de regulação do país.

Transgressões

Veja abaixo algumas das transgressões que vão gerar pontos negativos aos cidadãos:
– difusão de informações falsas sobre terrorismo.
– causar problemas em voos.
– usar passe vencido em ônibus, trem ou metrô.
– fumar no transporte coletivo.
– empregadores que não pagarem seguro social aos seus trabalhadores.
– não pagamento de multas.
– crimes contra o sistema financeiro, como sonegação de impostos ou declarações falsas do imposto de renda.
À agência estatal de notícias Xinhua, o vice-chefe do Comitê, Zhang Yong, afirmou que mais de nove milhões de chineses já foram privados do transporte aéreo e mais de três milhões de pessoas foram proibidas de comprar passes para trens e trem-bala devido ao fraco desempenho de crédito. Ele explicou, ainda, que há também seis mil empresas na “lista negra” do governo chinês.
A versão final do sistema de pontuação deve entrar em vigor em 2020, e emitirá relatórios em tempo real sobre cidadãos para funcionários do governo, policiais e possivelmente até outros cidadãos particulares. Os dados irão se somar a investigações já conduzidas em testes de reconhecimento facial, permitindo que as autoridades reconheçam instantaneamente criminosos procurados ou dissidentes políticos.

Medida nova, mas nem tanto

O sistema de classificação de crédito social começou a ser implantado em 2014 com a participação de cidadãos voluntários, mas a organização internacional Human Rights Watch afirma que muitos deles sequer sabiam disso. Segundo a entidade, um advogado chinês teria sido colocado em uma “lista negra” e proibido de comprar passagens aéreas por acidentalmente difamar o cliente durante um julgamento. Ele foi apontado como ‘não confiável’ pelo sistema.
O Comitê afirmou, ainda, que o objetivo da medida é “recompensar os honestos e punir os desonestos”.
LEIA TAMBÉM: