Comportamento

Guilherme Grandi

Redescoberta dos jogos de tabuleiro ajuda na conexão entre pais e filhos

Guilherme Grandi
11/10/2018 17:00
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Na casa do Felipe, a tradição de jogar jogos de tabuleiros em família é incentivada desde que ele era pequeno. Foto: Guilherme Grandi/Gazeta do Povo.

O fim de semana na casa do jovem Felipe Pereira de Melo, de 14 anos, é um pouco diferente da maioria dos amigos dele. Enquanto os outros ficam trancados no quarto com os olhos vidrados na tela do smartphone, ele se diverte na sala com os pais, o irmão e os primos jogando jogos de tabuleiros.
As antigas brincadeiras de criança, que fizeram a cabeça de muitos adultos até o final do século passado, estão vencendo a resistência da nova geração. Os dedos ágeis que digitam rapidamente nas telas também são velozes a cada movimento de Detetive, Batalha Naval, entre tantos outros.

Conexão com a família

Felipe conta que os jogos de tabuleiro criam uma relação mais próxima com outras pessoas, bem diferente da convivência virtual. Para ele, este tipo de atividade também auxilia na tomada de decisões coletivas.
É mais empolgante jogar assim, no cara a cara. Acho que é legal essa convivência de ajudar e ser ajudado pelo outro, pensar no movimento para não prejudicar a equipe”, analisa o jovem.
O hábito de jogar em família não surgiu à toa. A mãe dele, a administradora Ana Paula Pereira de Melo, sempre procurou impor limites aos celulares e videogames, tanto para Felipe quanto para o irmão Fernando, hoje com 19 anos.
Esse movimento na contramão da tecnologia já vem de anos em casa”, diz a mãe, que se surpreende com as preferências do caçula: os jogos que envolvem grandes estratégias em mundos mágicos de fantasia, como Arcadia Quest, Zombie Side, entre outros. Alguns deles em inglês, que Felipe tira de letra. “Aí nessa hora os mais velhos ficam de fora”, brinca a administradora.

Novos tabuleiros

Os pequenos Nicola e Daniel muitas vezes jogam melhor que o pai, um viciado em games. A mãe, Fernanda, brinca junto. Foto: Guilherme Grandi/Gazeta do Povo.
Os pequenos Nicola e Daniel muitas vezes jogam melhor que o pai, um viciado em games. A mãe, Fernanda, brinca junto. Foto: Guilherme Grandi/Gazeta do Povo.
Diz o velho ditado que “santo de casa não faz milagre”. Mas, no caso do empresário Tiago Penteado, a paixão pelos jogos de tabuleiros, RPG e videogames foi passada de pai para filho.
Nicola e Daniel, de 5 e 6 anos de idade, foram incentivados desde cedo a jogarem alguns jogos adaptados às idades deles. Tiago diz que os meninos já faziam contas nos dedos por volta dos 2 anos, e mais tarde já eram craques em outros games.
“Melhor ainda foi vê-los não somente conseguirem jogar sozinhos o Monopoly Gamer – um jogo para crianças com mais de 8 anos – mas também ensinar outro amiguinho ou os avós a jogar junto com eles”, completa.
Na casa da família, o smartphone até tem vez, mas é o tabuleiro que está sempre montado na mesa da varanda. Entre os jogos que os meninos brincam estão o Banco Imobiliário na versão dos personagens de Super Mario Bros, o Hamster Clan (que incentiva o trabalho em equipe com esquilos, que precisam armazenar cenouras, trevos e trigo antes do inverno chegar), entre outros.

Limites e regras

As crianças do colégio descobriram que fazer os próprios joguinhos também ajudava a tirar os amiguinhos do isolamento do smartphone. Foto: Guilherme Grandi/Gazeta do Povo.
As crianças do colégio descobriram que fazer os próprios joguinhos também ajudava a tirar os amiguinhos do isolamento do smartphone. Foto: Guilherme Grandi/Gazeta do Povo.
Além da interação social e do desenvolvimento do raciocínio lógico, os jogos de tabuleiros ainda ajudam a criar a noção de regras e limites. A psicóloga e psicopedagoga Sheila Lippmann Hey, que coordena as séries iniciais do Colégio Marista Paranaense, diz que este incentivo em casa reflete diretamente no aprendizado da criança em sala de aula.
“Elas estão muito carentes da falta de limites, e os jogos as fazem entender que é preciso seguir regras. Além do ganho pessoal, as estratégias dos tabuleiros também ajudam no desenvolvimento de habilidades especiais e na aceitação de diferentes opiniões, do sim e do não”, analisa.
A psicóloga conta que as crianças chegam ao colégio com uma visão ampliada do mundo, e até se preocupam mais com amiguinhos que muitas vezes nem conhecem. No começo do ano, um grupo de alunos desenvolveu uma atividade para incluir alunos que ficavam isolados na hora do recreio.
“Eles chamaram estes alunos que não conversavam muito e criaram joguinhos feitos com materiais recicláveis, como tabuleiros com tampinhas de garrafas, dominós e futebol de botão, para todos brincarem juntos”, conta.
Para a coordenadora, este tipo de atitude só acontece quando há um incentivo em casa. Sheila explica que a participação dos pais na vida da criança é fundamental, e que não é apenas a escola a função de ensinar.
“O trabalho em casa é complementar, é importantíssimo que os pais participem, conversem, tenham uma relação transparente com a criança”, completa.
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