Comportamento

Katia Michelle, especial para a Gazeta do Povo

Crie seu filho mais independente

Katia Michelle, especial para a Gazeta do Povo
29/07/2016 21:00
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Luciana Guimarães com os filhos: encorajamento da autonomia estimula vínculo familiar. Foto: Henry Milleo/Gazeta do Povo | Gazeta

Dar autonomia aos filhos tem sido um desafio cada vez maior para pais de crianças de todas as idades. Basta considerar as mudanças das últimas décadas para entender os motivos: famílias menores e o aumento da violência, que faz com que as pessoas vivam mais confinadas e teoricamente protegidas. Os tempos mudaram, é certo, mas a busca pela independência e liberdade continuam sendo não apenas uma conquista, mas uma necessidade. Então porque não estimular as crianças desde cedo a alcançá-las, dentro de suas possibilidades?
A empresária Luciana de Mendonça Guimarães, de 39 anos, tem dois filhos: Betina, de 6 anos e Lorenzo, que acaba de completar 3 anos. Para ela, os pais devem estimular desde cedo as crianças a realizar tarefas por conta própria, o que evita a dependência excessiva e faz com que os filhos cresçam com mais autonomia e segurança, sem serem superprotegidos.
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“Acho que esse encorajamento ajuda, inclusive, no vínculo familiar. É importante que as crianças se sintam parte da família”, diz. Ela costuma dar tarefas de acordo com a faixa etária dos filhos e percebe eles se sentem cada vez mais seguros para fazer atividades sozinhos, desde amarrar os sapatos até arrumar a própria cama.
“Um dia a Betina estava dormindo na parte de cima da casa e eu precisava descer. Deixei um bilhete para ela me encontrar lá embaixo, dando algumas instruções”, conta a mãe. A menina se sente cada vez mais capaz de realizar as tarefas sozinha porque, a medida que a mãe percebe que ela tem capacidade, estimula a criança a dar passos maiores rumo à autonomia. Como elas moram em condomínio fechado, Betina já tem autorização para ir à casa das amigas sozinha.
O irmão, por sua vez, observando as atitudes de Betina, quer dar também seus próprios passos sozinho. “Eu percebo que tudo é mais rápido para ele porque ele tem o exemplo da irmã”, diz Luciana. Para ela, cabe aos pais deixar as crianças experimentarem situações sem a interferência obstinada dos adultos. “Quando você presta atenção nas crianças, percebe o que eles podem fazer. Desde calçar um tênis, colocar roupa, lavar a salada”, diz a mãe.
A empresária fala que a cada dia procura estimular mais esses pequenos hábitos nas crianças e acredita que o núcleo familiar fica mais forte com a participação de todos. “Fica menos cansativo também. Quando a gente protege demais, as crianças ficam mais dependentes e acabam nos sobrecarregando. Segurar demais impede o desenvolvimento deles”, fala.
Estímulo
Antes mesmo de aprender a andar, os gêmeos Arthur e Henrique, de 2 anos e meio, já entendiam que lugar de brinquedo, depois de usar, era no cesto de brinquedos e sabiam exatamente o local em que a roupa suja devia ser colocada antes do banho. Essas e outras pequenas ações foram estimuladas pela mãe, a professora Fabiane Siqueira Cavalcanti, 39 anos, desde cedo. “Acho que os pais não devem subestimar a capacidade dos filhos. Desde pequenos, eles podem ser estimulados para fazerem coisas sozinhos até que vire um hábito”, diz.
Alexandre Cavalcanti e Fabiane, com os gêmeos: eles não são subestimados. Foto: Hugo Harada / Gazeta do Povo
Alexandre Cavalcanti e Fabiane, com os gêmeos: eles não são subestimados. Foto: Hugo Harada / Gazeta do Povo
Para ela, as crianças não devem nem ser subestimadas nem super estimadas, ou seja, é preciso prestar atenção na criança e observar a capacidade que cada uma demostra de fazer as coisas por si. “Acho que cada criança mostra o que é capaz de fazer. Também não dá para exigir algo que vá além da capacidade delas para não ter frustração”, diz.
Como mãe de primeira viagem, ela diz que o processo de estímulo é um aprendizado constante, tanto para os adultos quanto para crianças. “O importante é estar sempre disposto a conversar. E essa conversa precisa de atenção especial. É olho no olho para explicar o que a criança já pode fazer sozinha e pedir a participação dela”, diz, concluindo que o erro sempre vai acontecer e que faz parte do processo: “Eles erram, e nós também. O importante é que todos estamos aprendendo”, diz.
Autonomia gera mais cobrança
Para a psicanalista Mônica Bigarella a independência é uma conquista em todas as idades. “E é gradativa, não acontece de uma hora para outra”, explica. Por isso, é importante a boa percepção dos pais ao avaliarem a capacidade das crianças de enfrentar as situações. “Isso vale para pais, professores e qualquer adulto que conviva com a criança”, diz.
Se a criança é capaz de realizar uma tarefa ou ir a um ambiente sozinho, os pais devem permitir e estimular, sempre avaliando riscos e segurança, ressalta a psicanalista. Se uma criança começa a andar de bicicleta e quer aumentar cada vez mais o percurso, a medida que vai crescendo, é bom ficar atento. “A criança precisa saber dos perigos e também das suas responsabilidades, pois com a independência aumenta a responsabilidade”, diz.
Várias atitudes podem servir de baliza: se os pais estimulam que a criança faça a lição de casa sem supervisão, devem ficar atentos se ela cumpre a tarefa no prazo. Caso isso não ocorra, os pais também devem fazer com que a criança perceba as consequências. É preciso combinar e dar limite, sempre. “A independência é um processo de educação e educar dá trabalho”, diz a psicanalista. Mas a recompensa é criar filhos capazes de viver bem e enxergar o mundo em que vivem com autonomia e responsabilidade. Afinal, como diz o ditado, filhos são criados “para o mundo”.