Comportamento

Carolina Werneck

Mãe-polvo existe, sim, e estas mães com até 11 filhos podem provar

Carolina Werneck
12/05/2018 17:00
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Luiza Joczec é mãe de Felipe, seis anos, Manuela, dois anos, e das gêmeas Gabriela e Isabela, de um ano. Foto: Marcelo Andrade/Gazeta do Povo | Gazeta do Povo

Na garagem de um sobrado em São José dos Pinhais, na Região Metropolitana de Curitiba, Felipe Joczec, 6 anos, brinca sozinho com uma bola de futebol. Mas basta que a mãe dele, Luiza, 33, saia para o quintal, que o restante da turminha começa a aparecer. Manuela, de 2 anos, e as gêmeas Gabriela e Isabela, que acabaram de completar 1 aninho, seguem a mãe a toda parte, embora ela não tenha braços suficientes para ficar com as três no colo ao mesmo tempo.
Luiza sempre sonhou ser mãe. “Só não esperava que seria mãe de quatro crianças“, conta, rindo, enquanto termina de preparar a mamadeira de uma das caçulas. Descobriu-se premiada quando Manuela, a segunda filha, tinha seis meses. “Minha gestação da Manu foi bem complicada, eu passei mais tempo internada que em casa. Então tive que fazer um acompanhamento da minha saúde mesmo depois que ela nasceu”, conta. Foi em um desses exames que, acompanhada de Felipe, ela recebeu a notícia de que estava grávida. De novo. E de gêmeas.
“As pessoas me perguntam se eu fiz tratamento para engravidar de gêmeas. Eu costumo brincar que meu tratamento foi o tratamento de choque“, diverte-se. Inesperada, a gravidez foi muito mais tranquila que a anterior. Ela conseguiu trabalhar até os últimos dias – era bancária – e as meninas nasceram perfeitamente saudáveis. E, assim, a família que era para ser de apenas dois filhos ganhou mais um par deles. “A gente até pensava em, talvez, ter um terceiro, mas lá no futuro, nunca naquele momento.”
Enquanto Felipe e Manuela se divertem com um quadro negro, Isabela e Gabriela ganham colo e atenção da mãe, Luiza. Foto Marcelo Andrade/Gazeta do Povo
Enquanto Felipe e Manuela se divertem com um quadro negro, Isabela e Gabriela ganham colo e atenção da mãe, Luiza. Foto Marcelo Andrade/Gazeta do Povo

Contramão

Em tempos de filhos únicos — de acordo com o último Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de 2010, o número de filhos por brasileiras é de 1,9 em média (em 1950, era de 6,2) — mães que desafiam essa lógica são frequentemente olhadas com estranheza. “Você é louca?“, “não tem TV em casa?“, “mas são todos do mesmo pai?”, perguntam muitos, sem se dar conta do quanto isso pode ser ofensivo. Com Luiza já aconteceu muitas vezes. E ela não é a única a ouvir esse tipo de comentário.
Ozana Nadalin tinha 22 anos quando nasceu sua primogênita, Ana Carolina, em Curitiba. Hoje, aos 51 anos, ela é a mãe orgulhosa de nada menos que 11 filhos. Ana Carolina tem 29 anos; Lucas, 27; Ana Paula, 25; Ana Cristina, 23; Ana Flávia, 21; as gêmeas Ana Beatriz e Ana Clara, 19; Luis Felipe, 18; Luis Miguel, 16; Luis Gustavo, 15; e Ana Helena, 13.
“Não planejei ter 11 filhos, mas fui aceitando cada um que chegava e não me arrependo. Depois da terceira as pessoas já estavam me trucidando. Lá pelo sexto eu pensei em dar um tempo, mas meu marido estava empolgado e então entramos em um acordo”, diverte-se. Ela teve, em média, um filho a cada um ano e meio. “Menos quando tive as gêmeas e, 11 meses mais tarde, nasceu o Luis Felipe, prematuro. Aí era quase como ter trigêmeos”, lembra, rindo.
Ozana e o marido, Sérgio, com seus 11 rebentos. Foto: Arquivo Pessoal
Ozana e o marido, Sérgio, com seus 11 rebentos. Foto: Arquivo Pessoal
Aos 38 anos, Caroline Garai desfila por Curitiba acompanhada de nada menos que cinco meninas. A mais velha é Maria Eduarda, de 16 anos. Depois vêm Isabella, de 13, Fernanda, de 9, Rafaella, de 8, e Pietra, de 2. Todas devidamente planejadas. Ela também já ouviu muitas vezes as piadinhas e comentários assustados que incomodam Luiza. “Me perguntam muito se eu estou tentando ter um menino. Mas, na verdade, eu e meu marido sempre quisemos ter família grande mesmo. E estamos muito felizes, mesmo que tenham vindo só meninas.”

Logística

Organizar a rotina e os passeios com muitas perninhas e bracinhos não é tão simples. Tanto Luiza quanto Caroline precisaram trocar de carro para conseguir levar todo mundo de uma vez. “Quando nasceu a quarta o carro ficou apertadinho. Então tivemos que pegar um de sete lugares. Depois que nasceu a última a gente parou de dar carona para a sogra”, brinca Caroline.
As manhãs são sempre movimentadas para os Garai. Enquanto ela continua trabalhando como técnica de patologia clínica no Laboratório Municipal de Curitiba, o marido, Sérgio, é responsável pelo estoque da cozinha do Hard Rock Café. Como ela entra no trabalho às 6h30, quem fica encarregado de levar todo mundo para a escola é ele. Na volta para casa, a mãe orienta o almoço de quem ainda não almoçou e pede ajuda para organizar a casa. “É difícil manter a casa arrumada, porque é muita gente. Fica no máximo por uma hora, dali a pouco já começam as coisas jogadas”, conta.
Da esquerda para a direita, toda a prole de Caroline e Sérgio. Pietra (dois anos), Rafaella (oito anos), Fernanda (nove anos), Isabella (13 anos) e Maria Eduarda (16 anos). Foto: Jonathan Campos
Da esquerda para a direita, toda a prole de Caroline e Sérgio. Pietra (dois anos), Rafaella (oito anos), Fernanda (nove anos), Isabella (13 anos) e Maria Eduarda (16 anos). Foto: Jonathan Campos
Luiza, por sua vez, foi demitida assim que acabou seu período de estabilidade garantido por lei. Ela afirma que perder o emprego complicou bastante o orçamento da família. Manuela, que agora está com dois anos e meio, não voltou para a escolinha particular este ano. A mãe vem tentando vaga em uma escola pública, mas até agora não conseguiu.
Com Manu e as gêmeas em casa em período integral, ela precisa contar com a ajuda de uma funcionária, Diva. “Antes eu ficava frustrada por não conseguir dar conta deles sozinha. Mas, depois, entendi que não preciso ser igual às outras mães e estou bem com isso”, diz Luiza, que agora trabalha vendendo roupas de forma autônoma, mas segue procurando emprego formal.
Formada em serviço social, Ozana trabalhou na empresa da família até ter o terceiro filho. Um dia, um acidente em casa “me fez perceber que não valia a pena trabalhar fora. Então acabei me dedicando realmente a cuidar deles”. Para conseguir organizar toda a prole e ainda manter a casa organizada, ela chegou a ter duas funcionárias ao mesmo tempo.
Além disso, na casa dos Nadalin, sair com todo mundo só se fosse em uma Kombi. E foi assim que ela e o marido transportaram os filhos por muito tempo. Eles só se desfizeram da Kombi no ano passado. Uma decisão tranquila para quem, agora, só tem cinco filhos morando em casa.

Mãe em grandes doses

Quando a família é grande, nada vem em pequenas porções. Tudo parece ser proporcional à quantidade de crianças. “Eu me sentia meio frustrada quando eu tinha menos filhas, porque a gente não tem um manual de instrução. O jeito é ir aprendendo com cada uma. É lógico que é difícil. Eu não sou uma pessoa de posses, não ganho R$ 10 mil por mês, muito menos meu marido. Mas é questão de administrar e ver a realidade, acho que estamos fazendo um bom trabalho”, celebra Caroline.
Mas, se os momentos de alegria têm a intensidade multiplicada, o mesmo acontece com as crises. Na casa de Luiza, quando as três filhas resolvem chorar ao mesmo tempo, “às vezes dá vontade de chorar junto”, brinca a mãe. Ela explica que, então, tenta acalmar uma para poder dar atenção às demais. “A gente respira fundo, porque eu sei que a parte mais difícil já passou. Nesta fase em que elas estão a gente já consegue dormir uma noite inteira, por exemplo. Às vezes elas choram, mas eu já aprendi o que é choro de verdade e o que é só um incômodo no meio da noite.”
Durante o tempo em que as gêmeas eram pequenas e ainda havia outro bebê em casa, Ozana diz que chegou a trocar de ajudante 19 vezes em um ano e meio. “Era uma loucura para dar conta de tudo. Você acaba mesmo deixando de fazer outras coisas para priorizar o atendimento a eles.”
Felipe, Manuela, Isabela e Gabriela brincam no quintal de casa com a mãe, Luiza. Foto: Marcelo Andrade/Gazeta do Povo
Felipe, Manuela, Isabela e Gabriela brincam no quintal de casa com a mãe, Luiza. Foto: Marcelo Andrade/Gazeta do Povo
Mesmo com todas as dificuldades, com os julgamentos e as escolhas que precisaram fazer, Luiza, Ozana e Caroline garantem que estão muito felizes com suas ninhadas. “Eu sou bastante grata por ter tido todos eles. Por mais que pareça uma coisa impossível, é como um rio, você vai achando seu caminho para seguir. Eu penso que valeu a pena e não trocaria todos eles por uma carreira profissional brilhante ou mesmo por uma condição econômica exorbitante”, diz Ozana.
Para Luiza o sentimento é parecido. “A gente se preocupa muito antes da hora. Não precisa disso, deixa acontecer. A gente acha que não dá jeito nas coisas, mas dá. É claro que a preocupação é constante, não é facil, é cansativo. A gente abre mão de muita coisa, mas é maravilhoso. Você sabe que vai ter companheiros para o resto da vida.”
As cinco companheiras de Caroline também não deixam dúvidas para a mãe. “Eu vejo que a gente se adapta a muitas coisas. Estamos no trabalho de criar boas pessoas para a sociedade. Tem aquela história de que a gente cria para o mundo, mas espero que elas não sejam do mundo, que possam ser uma luz, ser diferentes.”

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