Comportamento

Raquel Derevecki

Perdoar exige alguns passos e “previne” hipertensão e obesidade

Raquel Derevecki
13/01/2019 07:00
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Para perdoar, é necessário colocar-se no lugar da pessoa que lhe magoou, sabendo que todos podem cometer falhas. Foto: Bigstock

Para muitas pessoas, perdoar membros do círculo familiar, amigos ou colegas de trabalho que os decepcionaram é quase impossível. Isso acontece quando não há mais confiança ou quando os laços que os aproximavam são cortados pelas ofensas. No entanto, vencer a mágoa e oferecer perdão é necessário para garantir a saúde de quem se sentiu ofendido.
Segundo a especialista em psicologia clínica Patricia Santiago, isso ocorre porque, além de tirar a paz, gerar estresse e prejudicar a qualidade do sono, o fato de nutrir sentimentos negativos influencia no desenvolvimento de diversas doenças como gastrite, hipertensão, diabete e obesidade. “Ou seja, o sofrimento é muito maior”, garante.
E para tratar essas e outras doenças desencadeadas por sentimentos negativos é necessário mais do que visitas constantes ao médico ou o uso de medicamentos. “Tenho atendido pacientes que, após diminuírem o estresse causado pela mágoa e pelo ódio, melhoraram seus quadros de hipertensão e diabete, por exemplo”. Essa melhora, segundo a especialista, ocorre quando o paciente decide perdoar quem o magoou, aliviando sua carga emocional. No entanto, o processo para isso exige alguns passos. Veja quais são:

Passo 1: Reconhecer os sintomas

A Associação Americana do Coração e o Colégio Americano de Cardiologia atualizaram os limites considerados normais para a pressão arterial. Foto: Bigstock
A Associação Americana do Coração e o Colégio Americano de Cardiologia atualizaram os limites considerados normais para a pressão arterial. Foto: Bigstock
De acordo com a especialista, o processo de perdão é tão intenso como o processo do luto. “Quando nos magoamos, há o luto das nossas expectativas e ainda há o luto pelo rompimento do relacionamento, já que o individuo não quer mais falar com o outro”, afirma a psicóloga.
Isso gera estresse e ativa a produção de adrenalina, hormônio que prepara o organismo para atividades que exigem esforço intenso. “Toda vez que nos sentimos ameaçados ou descontentes, temos sinalizadores internos que deixam o corpo pronto para ação. Com isso, suamos mais e o coração fica acelerado, com sensação de disparo cardíaco”, afirma.
Essa reação corporal auxilia em casos de risco, quando há necessidade fuga, ataque ou outro movimento rápido. No entanto, não pode ser constante porque a alta produção da adrenalina exige trabalho árduo do organismo, aumentando a pressão sanguínea.

“Quando você pisa fundo no acelerador de um carro, por exemplo, o veículo consumirá mais combustível e exigirá muito mais da parte mecânica. O mesmo ocorre com o corpo humano, onde a sobrecarga na pressão sanguínea pode influenciar no desenvolvimento da hipertensão e de outras doenças, conforme a genética e os hábitos”, compara a psicóloga.

Aumento de peso e insônia também podem atingir pessoas que nutrem sentimentos de mágoa, ódio, desejo de vingança ou rancor, pois eles influenciam no descanso e nos hábitos alimentares. “O cérebro passa a pedir produtos energéticos, então há o desejo de comer o que é rico em açúcar, como o chocolate”.
Para fazer o procedimento, os médicos avaliam quatro critérios: idade, índice de massa corporal, outras doenças associadas e o tempo de doença. (Foto: Bigstock)
Para fazer o procedimento, os médicos avaliam quatro critérios: idade, índice de massa corporal, outras doenças associadas e o tempo de doença. (Foto: Bigstock)

Passo 2: Conversar com alguém de confiança

Ao perceber que está nutrindo sentimentos negativos ou reconhecer algum sintoma, é necessário falar com alguém a respeito do assunto. “Os sentimentos são subjetivos, então não dá para organizá-los da forma como fazemos com nossa escrivaninha, separando os objetos e colocando de um lado para o outro. Por isso, falar é a melhor maneira de o cérebro se organizar”, orienta Patricia.
Mas não dá para sair conversando com qualquer um. Segundo a especialista, ao abrir seus sentimentos com alguém, é necessário que a pessoa escolhida seja de confiança, para evitar que os segredos se espalhem. “O ideal é falar com alguém da família, um amigo íntimo ou com um terapeuta, que é capacitado para ouvi-lo de forma neutra”.

Passo 3: Ter empatia

Durante a conversa com esse familiar, amigo ou terapeuta, é necessário colocar-se no lugar da pessoa que lhe magoou, pois todos podem cometer falhas. “Precisamos entender que não somos perfeitos o suficiente nem mesmo para atender nossas próprias expectativas, e que a situação é ainda mais difícil quando pensamos em atender a expectativa do outro”, afirma a psicóloga.
Além disso, é necessário deixar o ego de lado, deixando de lado a posição de “dono da razão”. “Enquanto você estiver carregando toda a razão no seu colo, não poderá enxergar o lado do outro porque há algo prejudicando seu olhar. Então, antes de conseguir perdoar, será necessário abdicar de ter razão e de engrandecer seu ego”.

Passo 4: Conversar de forma assertiva

Com empatia, será possível entrar em contato com a pessoa que lhe magoou para ouvir o outro lado da história. Isso o ajudará a entender os motivos que causaram o desentendimento e poderá resolver a situação. No entanto, essa conversa precisa ser assertiva, transmitindo as ideias e sentimentos dos envolvidos de forma segura, sem dúvidas ou falhas que tragam novos conflitos ou mal-entendidos.

“Podem existir problemas na maneira como você aprendeu a se comunicar. Talvez você não tenha aprendido a ouvir ou só consegue falar de forma agressiva, sempre acusando. Isso faz com que o outro não consiga se comunicar com você”, esclarece Patricia.

Nesses casos, é necessário treinamento de assertividade para corrigir as falhas de diálogo. Isso pode ser realizado com o auxílio de um terapeuta, que também ajudará na “tradução” do que realmente se queria dizer quando as coisas fugiram do controle. “A pessoa pode ter falado sem pensar, ter escolhido mal as palavras ou nem ter falado aquilo, como ocorre na brincadeira ‘telefone sem fio’, em que a informação muda completamente ao passar de uma pessoa para outra”.
Como essa conversa assertiva não é possível nos casos em que um dos indivíduos envolvidos já é falecido, por exemplo, a explanação da mágoa também pode ocorrer por meio de cartas. “Escreva como se fosse literal, mostrando como aquilo o incomodou. Isso vai materializar o que aconteceu e ajudá-lo a lidar com essas emoções”, aconselha a especialista.

Passo 5: Escolher perdoar

após dizer “eu te perdoo” é necessário escolher perdoar e estar disposto a tratar as feridas até alcançar a cura completa. Foto: Bigstock
após dizer “eu te perdoo” é necessário escolher perdoar e estar disposto a tratar as feridas até alcançar a cura completa. Foto: Bigstock
Apenas colocar-se no lugar do outro e ouvir o outro lado da história podem não ser suficientes para enterrar a mágoa e seguir em frente. Nesses casos, o maior passo a ser alcançado é amar-se.

“O próprio Deus fala na Bíblia [em Isaías 43:25] que nos perdoa por amor a Ele mesmo. Ou seja, nós devemos perdoar os outros como uma forma de ter amor próprio, deixando de lado aquilo que nos faz sofrer”, pontua Patrícia.

Para isso, após dizer “eu te perdoo” é preciso escolher perdoar e estar disposto a tratar as feridas até alcançar a cura completa. “No início você ainda vai sentir a mágoa e estará incomodado porque as coisas ainda não estão organizadas”. No entanto, a especialista garante que essa dor diminuirá com o tempo. “Primeiro proponha-se a perdoar. Depois, os sentimentos mudarão e você não sentirá mais esse incômodo ao lembrar do fato”, finaliza.
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