Comportamento

Luciane Belin, especial para a Gazeta do Povo

“Pensei que ter filho era agora ou nunca”: os riscos e benefícios de ser mãe após os 40

Luciane Belin, especial para a Gazeta do Povo
26/03/2019 18:00
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Juliana Horst com o filho Joaquim e o esposo João. Acompanhamento próximo das equipes médicas garantiu sucesso da gestação. Foto: Letícia Akemi. | Leticia Akemi

Elas querem explorar ao máximo a juventude, estudos e carreira, mas sem deixar de lado o sonho de serem mães. Foi com essa ideia que Cláudia Fütz e seu marido Gelde adiaram a vinda de bebês. Hoje com quase dois anos, Rhayan veio no que a mãe define como “a hora que tinha que ser”, aos 41 anos.

“Eu estava com 40 anos e em um relacionamento de quase 20. Ou era agora, ou não teria mais como acontecer. A gente sempre foi muito aventureiro, gostamos de viajar de moto pelo país e sabíamos que quando ele nascesse, tudo isso iria mudar”, conta.

E, de fato, mudou. Para Cláudia, naquela idade ela se enxergava uma pessoa mais experiente para ser mãe. A gravidez tardia também acabou mexendo bastante com a própria família. “Foi bom porque ele trouxe um fôlego novo para a família, todo mundo resgatou uma energia que nem sabia que tínhamos mais – os avós, os tios e mesmo nós, os pais.”
Mãe aos 45 anos
Se, para Cláudia Fütz, a gestação foi uma decisão consciente: “parei de tomar a pílula em janeiro e, em junho, engravidei”, recorda, para outra Claudia, a notícia foi um susto. Ela, que engravidou aos 45 anos, quando já tinha dois filhos adultos, não tinha outra maternidade em seus planos.
“Tive uma falta na menstruação e achei que fosse a menopausa. Fui ao médico, ele me pediu vários exames, eu fiz, achando que a chance de engravidar nessa idade era mínima, até que comecei a ter enjoo, tontura, fui fazer o exame e peguei o resultado positivo. Tinha parado de tomar o anticoncepcional havia um mês”, lembra Claudia Regiane Gracez Dias.
Gestação de alto risco?
Se a gestante não apresenta problemas de saúde como a diabetes e a pressão alta, a gravidez entre os 35 e os 40 anos ainda não é tida como de alto risco, embora alguns médicos já sugiram um acompanhamento mais cauteloso.
É a partir dos 40, no entanto, que cada gestante que chega aos hospitais parece vir acompanhada de uma luz de alerta – ao menos essa é a impressão de boa parte das mães que passaram pela gravidez nessa fase da vida.

“Não tive nada, trabalhei até a véspera do parto, fazia dança do ventre e dancei até a última semana. Coisas que eu sentia antes, como dor nas costas, não senti quando estava grávida. Eu brinco que fiquei mais saudável durante a gestação. Mas os médicos ficam mais receosos, então eu sempre ouvia: “está tudo bem, mas temos que ter cuidado por conta da idade da mãe’, conta Cláudia Fütz.

Segundo Cláudia Fütz, o único motivo pelo qual não optou por um parto normal para o filho foi por essa cautela da equipe médica. Para os médicos, esse cuidado não é exagero. Segundo o ginecologista e obstetra Antonio Fábio Barreiros Cruz, que há três décadas atua no acompanhamento de gestantes de alto risco, existem alguns aspectos nos quais uma mãe que tem mais de 40 anos se torna mais vulnerável. “Ela tem mais chances de desenvolver hipertensão e diabetes do que uma mulher de 20. E, muitas vezes, essas patologias podem levar a uma cesariana até mais prematura”, detalha.

Dados divulgados pelo Ministério da Saúde brasileiro em 2011 confirmam que a hipertensão de fato atinge mais as mulheres conforme o avanço da idade. Entre os 18 e os 24 anos, apenas 8% delas têm a doença, contra 50% das que estão na faixa etária de 55 anos ou mais de idade.
Idade cronológica x idade biológica
No entanto, quando as mulheres têm uma boa saúde e hábitos saudáveis, o obstetra afirma que a gravidez pode ser tão tranquila quanto a de mães mais jovens.

“Existe uma diferença entre a idade cronológica e a biológica. Os hábitos de vida podem aumentar a idade biológica. Se a pessoa desenvolve diabetes, ela aumenta a curva de envelhecimento, então fica mais sujeita a complicações das doenças, e isso impacta também na gravidez. Então é importante a mulher que está postergando a gestação cuide da saúde de forma global”, recomenda o médico.

Mais do que a saúde de gestação, a principal preocupação de quem posterga a maternidade é a dificuldade para engravidar. “Após os 30, acontece a diminuição do número de óvulos, a mulher fica menos fértil e diminui a probabilidade para engravidar. Aos 35 anos acontece um declínio ainda mais acentuado nesse sentido”, reforça.
Um mapeamento realizado em 2010 na Universidade de Edimburgo, no Reino Unido, sugere que a mulher perde 90% dos óvulos na fase dos 30 anos e que, aos 40, terá apenas 3%.
“Além disso, como nascemos com nossos óvulos todos formados, eles têm a mesma idade que nós, por isso há mais probabilidade desses óvulos, que já estão mais velhos, apresentarem algum problema durante a fecundação”, diz a professora do curso de Enfermagem da Universidade Federal do Paraná Marilene Loewen Wall.
O aumento da probabilidade de a criança nascer com a Síndrome de Down, por exemplo, é consenso na comunidade médica: uma mãe de 25 anos apresenta a chance de 1 para 1200, enquanto para mulheres com 35 anos, esse número sobe para 1 em 385 e, depois dos 40 anos, para 1 em cada 106.
A possibilidade de antecipar e acompanhar mais detalhadamente estas alterações, no entanto, é uma vantagem da evolução das técnicas de acompanhamento gestacional.

“A medicina se desenvolveu bastante no rastreamento dessas questões no período gestacional, através de exames laboratoriais, ecografia. Mas ainda não há forma de prevenir essas doenças cromossômicas”, complementa dr. Antonio Cruz.

Complicações e cuidados
Junto à enfermeira Juliane Aldrighi, a professora Marilene Wall desenvolve desde 2015 um projeto de pesquisa com gestantes acima dos 35 para verificar os impactos físicos da gestação sobre as mulheres.
Embora ainda não esteja concluído, os resultados preliminares do estudo apontam uma correlação entre a idade de 35 a 40 anos e a maior probabilidade de desenvolver pré-eclâmpsia – uma complicação da hipertensão durante a gestação –, aborto espontâneo e placenta prévia, uma anomalia na inserção da placenta.
Os dados são referentes às gestantes atendidas no Hospital de Clínicas da UFPR, em Curitiba, entre 2012 e 2016. “Já temos dados de 993 mulheres com mais de 35 anos que tiveram suas gestações e partos nesse período. Do total, 208 mulheres, ou seja, 20,9%, tiveram pré-eclâmpsia e 256 mulheres, 25,7%, diabetes gestacional. O percentual de abortos foi de 1,5%, ou seja, 15 das 993 mulheres. Além disso, 21% das pacientes acompanhadas tiveram partos prematuros. Esses dados ainda não foram publicados, pois estão em fase de análise”, explica a professora.
Juliana Horst com o filho Joaquim e o esposo João. Acompanhamento próximo das equipes médicas garantiu sucesso da gestação. Foto: Letícia Akemi.
Juliana Horst com o filho Joaquim e o esposo João. Acompanhamento próximo das equipes médicas garantiu sucesso da gestação. Foto: Letícia Akemi.
Juliana Horst é uma das mulheres que passou pelo Hospital das Clínicas durante a realização do estudo comandado por Wall e Aldrighi. Em 2016, aos 40 anos, engravidou pela primeira vez e acabou perdendo o bebê por uma complicação na produção de líquido amniótico na gravidez.
Cinco meses depois, ela engravidou novamente. “Por causa da primeira gestação, a segunda foi assistida também, por conta da idade, mas existia esse problema da produção do líquido amniótico”, recorda Juliana.
A análise da placenta da primeira gestação indicou que, no caso de Juliana, o que ocasionou o parto prematuro foi um infarto placentário, uma espécie de inflamação nas membranas da placenta.

“Para evitar que acontecesse de novo, me receitaram AAS [ácido acetilsalicílico], que tomei a gestação inteira. Era assistida tanto no posto quanto no HC, foi uma gravidez tranquila, não tive problema de pressão alta, diabetes, nenhum problema de saúde”, recorda ela sobre a gestação do filho Joaquim, que nasceu de 38 semanas e meia e hoje tem um ano e seis meses.

Segundo o obstetra Antonio Cruz, casos como o de Juliana mostram que a gravidez tardia pode ser tão bem-sucedida quanto qualquer outra, desde que haja um acompanhamento periódico pré-natal, assim como acontece com os partos de mulheres mais jovens.
“É sempre recomendado fazer um check-up de exames, pelve, condições de útero e ovário, dosagem hormonal, investigação de algumas doenças infecciosas como toxoplasmose, avaliar calendário de vacinas – contra rubéola e gripe, por exemplo.”
Avanço da gravidez tardia
Segundo dados do Data SUS (Tecnologia da Informação a Serviço do Sistema Único de Saúde), o número de gestações entre mulheres de 35 a 39 anos mais do que duplicou entre 1994 e 2016, com um aumento de 103,51%, de 151 para mais de 307 mil.
Dos 40 aos 44, esse crescimento foi de 77,94% e, até mesmo na faixa entre 45 aos 49 foi observado um crescimento de 11,77%. No mesmo período, o número de gestações entre mulheres de 20 a 29 subiu apenas 1,48%, com uma queda de 6,9% se considerada apenas a faixa dos 20 aos 24.
Mesmo os estudos que evidenciam risco 50% maior de mortalidade perinatal quando a mãe tem entre 40 e 49 anos, em relação àquelas entre 20 e 29 anos, não assustam essas mulheres. Muitas buscam um equilíbrio maior entre os diferentes aspectos da vida e enxergam a chegada de um filho como uma enorme transformação – grande o suficiente para adiar o máximo possível.
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