Comportamento

Bruna Covacci

“Eu não estou de babá!” Marcos Piangers conta como é ser um pai participativo

Bruna Covacci
26/01/2017 09:00
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Piangers com as filhas Anita e Aurora. Foto: Marcos Piangers com as filhas Anita e Aurora. Foto: Giselle Sauer/Divulgação.

Crescer com a dificuldade da ausência de um pai fez o jornalista catarinense Marcos Piangers, 36 anos, querer fazer diferente quando construiu a sua própria família. Ele não se importa em dizer não para o happy hour com os amigos para dizer sim ao fim de tarde passeando com suas filhas Anita, de 11 anos, e Aurora, de 4 anos. Piangers é o pai que está lá para brincar, conversar, dar broncas e acompanhar cada evolução das filhas (com direito a muita emoção!). Autor da publicação “O Papai é Pop”, não conheceu o pai biológico quando criança e sabe que, infelizmente, a sua história é muito comum: muitas mulheres brasileiras precisam criar os filhos sozinhos. Elas conseguem, é claro. Ele é a prova disso. E a sua conclusão de que quem mais perde nessa relação de ausência é o próprio pai. “Eu não sei o que é ter um pai, mas sei o que é ter um filho. E isso é a melhor coisa do mundo”. Sua experiência é exemplo para muitos homens que têm se dado conta da importância de participar ativamente da vida dos filhos. Os livros do jornalista chegaram aos principais rankings de leitura do país e ele acumula quase 900 mil curtidas no Facebook. A seguir, confira o bate-papo com o autor sobre os desafios da paternidade.
O pai ao lado das filhas. Foto: Giselle Sauer/Divulgação.
O pai ao lado das filhas. Foto: Giselle Sauer/Divulgação.
A paternidade te realiza? Como ela mudou a sua vida?
A paternidade muda a nossa vida automaticamente, mas de forma diferente da maternidade por conta da questão fisiológica em que a mulher tem nove meses para se adaptar com a ideia do filho e tem um laço fisiológico. Eu, que nunca convivi com uma família grande e cresci com minha mãe me criando sozinha, sem ter bagunça em casa, crianças ou irmãos, sempre quis ter filhos. Ao nascer uma menininha chamada Anita a minha vida mudou e a forma com que eu vejo o mundo também. O filho traz um benefício automaticamente que é o de perceber que você não é tão importante. Você cria empatia e passa a pensar em como pode ser mais gentil, amoroso e dedicado para mudar a vida das outras pessoas e não só a sua.
Como você enxerga o papel do pai atualmente?
Sempre foi importante ter um pai, ter um tutor. A relação familiar é baseada no afeto, por isso eu acredito que mais importante do que ter pai ou mãe é contar com pessoas que vão te ajudar a passar por um período difícil da sua vida e a chegar à fase adulta com segurança, ferramentas e o repertório necessário como ser gentil, educado, saber cultivar as amizades e entender a importância de ajudar o próximo. São valores que vão ajudar você a se tornar uma pessoa mais feliz e quem vai te ensinar tudo isso é o seu tutor. Na maioria dos casos esse é o papel da mãe, já que os pais são muito ausentes. Por isso a importância de um pai hoje é a mesma de sempre: formar seres humanos para o mundo, tentando deixa-lo um pouquinho melhor.
Mas nos dias de hoje esse desafio é mais difícil?
O desafio é maior por conta da transição do analógico e digital, com todas as crianças com celular e videogame. O problema do século é nunca estarmos no lugar que queremos na hora em que estamos: nunca somos felizes que com o que temos e sempre desejamos algo que está acontecendo em outro lugar hipotético e que acreditamos ser melhor do que aquilo que está acontecendo em nossa vida naquele momento. O Instagram nos leva a lugares maravilhosos. Saímos do nosso quarto, casa e emprego querendo viver uma vida de sonhos que, na verdade, não existe nem na rede social, nem para a pessoa que atualizou o feed com a foto e nem na nossa vida. Isso cria uma insatisfação constante na nova geração. Meu papei de pai é o de avisar minhas filhas que esse mundo não existe, que é fantasia. Elas precisam saber que não existe vida perfeita e que toda trajetória é feita de percalços, desafios e muitas derrotas. As derrotas servem para nos tornar pessoas melhores e preparadas para o outro dia, para a vitória.
Você já disse que os homens não são treinados para serem pais. Pensando nisso, como surge um bom pai?
Um bom pai surge quando ele tem espaço para discutir paternidade, quando ele vê um vídeo ou lê um texto que o incentiva a ter uma participação mais efetiva. Surge no momento em que a esposa começa a cobrar mais a presença dele e ele se dá conta do quanto é bom ser pai, encontrando prazer ao dizer não ao happy hour ou churrasco com amigos para dizer sim ao fim de tarde com as filhas, para ajudar no dever de casa e jogar quebra-cabeça no sábado à noite. Quando ele descobre que isso é realmente bom e o transforma em um homem melhor. Esse é o sentido da vida.
Você costuma falar que o pai que não tenta ensinar não é pai, é tio. Qual é a medida certa entre ser duro ou maleável?
É um grande desafio saber a hora de dizer sim ou não. Dá trabalho. Você precisa prestar atenção, saber como o seu filho passou o dia, se ele está indo bem na escola. Precisa se envolver na escola, no condomínio, conversar com a criança para saber se ela está sendo uma boa pessoa e obediente como você deseja; só assim você vai saber reagir quando ele quiser jogar mais um pouco de videogame, dormir mais tarde ou ser presenteado por alguma coisa. Se você acompanha você vai poder dizer: filho, você merece. Você está mandando bem. E é algo que não acontece com frequência. Mas o contato também serve para o outro lado, para saber quando ele está sendo malcriado e que você precisa ser mais duro, ser seu guia. É por isso que muitos pais são só duros ou liberais, porque é fácil. Você não pode cair na armadilha da paternidade fácil, porque se está fácil demais alguma coisa está errada. Os filhos são como nossa obra prima sendo feita todos os dias, vamos moldando, melhorando. É por isso que choramos e nos emocionamos quando nosso filho entra para a faculdade, ajuda uma pessoa, arruma um emprego incrível ou faz alguma diferença social. A medida certa é estar lá, prestar atenção e conversar bastante. E conversar sozinho com seu filho é difícil, conseguir tirar ele da frente da sua mulher, dos irmãos…
Quais os principais comentários que você escuta sobre paternidade?
Eu escuto ainda “ah, isso é coisa de mulher ou coisa de mãe”. Quando estou com minhas filhas muita gente diz “ah, você está de babá hoje?”. Não, eu não estou de babá. Eu estou cuidando das minhas filhas, estou de pai. Pai também cuida e participa e isso é difícil das pessoas entenderem.
Existe muita cobrança em cima das mulheres para que elas sejam “mães perfeitas”. Os homens recebem algum tipo de cobrança quando se trata da paternidade?
Zero! Meu chefe não vai ficar preocupado se minha esposa engravidar. O contrário acontece com a mulher, o chefe pensa que ela vai faltar, tirar licença maternidade… As pessoas costumam cobrar das mulheres de que os filhos estejam arrumados, alimentados e dormindo bem. Cobram para que elas façam parto natural porque a cesariana é muito prática e para amamentar no peito, porque se ela não tiver leite é porque está sendo preguiçosa. Eu fico intimidado e chocado com a quantidade de cobrança que a mulher tem. O papel do homem é aliviar isso. Para a gente é de boa e mesmo assim a gente se apavora.