Comportamento

The New York Times/por Jane E. Brody

Uma em cada três pessoas admite preferir celular a sexo

The New York Times/por Jane E. Brody
25/01/2017 09:00
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O apego exagerado ao smartphone também pode ser considerado um vício. Foto: Visualhunt

Os homens, mulheres e crianças que passam o dia colados ao smartphone e às redes sociais podem aprender alguma coisa com Lin-Manuel Miranda, criador do inovador sucesso “Hamilton”: o entrevistador da revista Delta Sky lhe perguntou quando e onde encontrava tempo para ser criativo, e Miranda, ávido leitor de livros e entusiasta da inatividade irrestrita, respondeu: “As boas ideias vêm no momento de descanso, no chuveiro, quando você está rabiscando ou brincando de trenzinho com seu filho. ‘Hamilton’ me forçou a prestar mais atenção às inspirações vindas do simples fato de viver a vida”.
A observação de Miranda não é um bom presságio para o futuro não só da criatividade, mas também dos corpos, mentes e relacionamentos saudáveis. Sem dúvida, você já viu algumas dessas cenas, provavelmente muitas vezes:
– Casais de jovens jantando fora pegam o celular para verificar mensagens, e-mails e redes sociais antes mesmo de examinar o cardápio e conferem seus telefones repetidamente durante a refeição.
– Pessoas na fila, gente atravessando ruas movimentadas, até mesmo ciclistas e motoristas cujos olhos estão nos celulares, não em seu ambiente.
– Carrinhos de bebê com crianças brincando com um dispositivo digital, dos pais ou talvez até mesmo deles próprios, em vez de observar e aprender com o mundo que os rodeia.
– Pessoas andando pela rua com os olhos no telefone, esbarrando umas nas outras, tropeçando ou se chocando contra obstáculos.
Observações como essas fizeram uma psicoterapeuta de Nova York se perguntar: “O que realmente importa na vida?”. Em seu novo livro, bastante esclarecedor, “The Power of Off” (O poder de desligar), Nancy Colier observa: “Estamos passando grande parte do nosso tempo fazendo coisas que realmente não nos importam”. Dentro e fora de seu trabalho, ela encontrou muitas pessoas que acabaram “se desconectado do que realmente é importante, do que faz que nos sintamos nutridos e conectados com o ato de ser humano”.
Começando cedo
O acesso quase universal à tecnologia digital, começando cada vez mais cedo na vida, está transformando a sociedade moderna de uma maneira que pode ter efeitos negativos sobre a saúde física e mental, o desenvolvimento neurológico e as relações pessoais, sem falar na segurança pelas ruas e calçadas.
Não me interpretem mal; não sou uma ludita. Adoro tecnologia, a conveniência e o auxílio oferecidos pela miríade de aplicativos no meu celular, verdadeiro banco de dados de bolso. Eu me lembro de ter ficado espantada, ainda repórter do Times, no início dos anos 1980, quando comecei a usar um processador de texto e percebi que poderia escrever um artigo com muito mais rapidez. Agora, os computadores economizam toneladas de tempo e trabalho e evitam inúmeros erros embaraçosos porque posso checar fatos, números, ortografia, definições e publicações acadêmicas sem sair da minha cadeira ergonômica.
Mas também gosto de deixar meu computador no modo “hibernar” e dar uma volta com meu cachorro, encontrar e conversar com amigos, conhecidos e desconhecidos – alguns dos quais se tornaram amigos.
E, como tantas outras coisas na vida, a moderação no mundo digital deve ser a marca de uma relação saudável com a tecnologia. Muitos se tornaram escravos dos dispositivos que deveriam nos libertar, que nos dariam mais tempo para viver a vida e conviver com as pessoas que amamos. Em vez disso, somos constantemente bombardeados por sinos, zumbidos e toques de alerta de mensagens que nos sentimos obrigados a visualizar e a responder imediatamente.
“A maioria das pessoas hoje verifica seus smartphones 150 vezes por dia, ou uma a cada seis minutos. E os jovens enviam uma média de 110 mensagens de texto por dia”, escreveu Nancy. Além disso, acrescentou: “Quarenta e seis por cento dos usuários de smartphone afirmam ‘não poder viver sem’ seus dispositivos”.
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 Síndrome de abstinência
Em “The World Unplugged Project”, pesquisadores da Universidade de Maryland relataram que “a grande maioria” de estudantes de 10 países estudados se sente em apuros quando tenta passar 24 horas sem seus dispositivos. Uma em cada três pessoas admitiu que prefere desistir do sexo do que do smartphone.
Tenho medo de que estejamos nos transformando em robôs digitais. As gerações futuras saberão como conversar cara a cara? Vão notar os pássaros, as árvores, o nascer do sol e as pessoas com quem partilham o planeta?
Em vez de visitar galerias de arte, assistir a concertos ou andar por matas pitorescas, uma mulher que eu conheço que veio para Woodstock, Nova York, em meados de 2016, passou o fim de semana no iPad conversando com seus muitos “amigos” no Facebook. Tudo o que eu conseguia pensar era “Que desperdício!”.
Você pode se perguntar por que é tão importante limitar nossas vidas digitais. “Sem tempo de inatividade e ar livre, o sistema nervoso nunca desliga, está sempre no modo ‘alerta e a postos’. Estamos ligados e cansados o tempo todo. Até mesmo os computadores precisam reinicializar, mas nós não fazemos isso”, disse Nancy em uma entrevista.
Ela continuou: “São as conexões com outros seres humanos – as reais, não digitais – que nos alimentam e nos fazem sentir que somos importantes. Nossa presença, nossa atenção irrestrita é a coisa mais importante que podemos dar uns aos outros. A comunicação digital não resulta em conexões mais profundas, na sensação de ser amado e apoiado”.
Quantas vezes seu trabalho é interrompido por toques de seu smartphone que você acha impossível ignorar? Você alguma vez evitou a intimidade com seu parceiro porque está no meio de um jogo no iPhone? Por acaso tirar inúmeras selfies e postar cada movimento e pensamento nas redes sociais está criando um egocentrismo doentio?
Quanto ao bem-estar físico, todas as horas gastas em um dispositivo é uma hora passada de maneira sedentária. As telas estão roubando o tempo que crianças e adolescentes deveriam passar em atividades físicas e esportivas, lendo, ou criando e se envolvendo diretamente com outras crianças – tudo isso é importantíssimo para o desenvolvimento físico e social saudável.
“As crianças que passam tempo demais na internet correm o risco de fazer um uso problemático dela e quem joga videogames compulsivamente pode desenvolver um distúrbio relacionado aos jogos on-line” (tradução: vício), escreveu a Academia Americana de Pediatria em sua mais recente política sobre a utilização de dispositivos on-line.
Controle a dependência
Nancy Colier, assistente social clínica, disse: “A única diferença entre vício digital e outros vícios é que se trata de um comportamento socialmente permitido”. Seu livro contém um programa de desintoxicação digital de 30 dias, mas em nossa entrevista que ela mencionou três etapas para ajudar a controlar a dependência.
  1. Comece por reconhecer até que ponto o uso de dispositivos digitais é realmente necessário, digamos, para o trabalho ou navegação, ou para assegurar aos membros da família que se está bem, e o que é simplesmente o hábito de responder, postar e se distrair.
  • Faça pequenas mudanças. Parar de usar seu dispositivo durante refeições ou passar tempo com amigos, e adicionar uma coisa por dia que é feita sem o telefone.
  • Conscientizar-se do que é importante para você, o que realmente lhe estimula, e dedicar mais tempo e atenção a isso.
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