Moda e beleza

Marina Mori

Os policiais militares que aprenderam a costurar por um motivo incomum e não pararam mais

Marina Mori
12/08/2018 12:00
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Foto: Letícia Akemi / Gazeta do Povo | Gazeta do Povo

É difícil olhar para os irmãos curitibanos Edmilton da Silva Júnior, 35, e Ilvo Rodrigo Lima da Silva, 34, e imaginar que seu hobby favorito é passar horas em frente a uma máquina de costura. É que os universos aos quais eles pertencem no dia a dia parecem um pouco incompatíveis com agulhas, tecidos e toda a delicadeza que a prática do costurar exige. Mas o fato é que nas horas livres, os dois policiais militares e campeões de jiu-jitsu se divertem fazendo roupas.
Tudo começou há mais ou menos um ano a partir do airsoft, outro passatempo dos PMs. O jogo, que funciona como uma espécie de paintball (só que mais real; as armas são de verdade e, as munições, de pressão), requer uma vestimenta específica – quase um uniforme militar. O problema é que a brincadeira não é nada barata. “Tem jogo de farda que custa quase R$ 600”, conta Ilvo.
Ele decidiu, então, procurar um curso de corte e costura para aprender a fazer o próprio uniforme. Edmilton, o irmão mais velho, nem esperou por um convite quando Ilvo esboçou a ideia. “Na hora, eu disse que também queria aprender”.
Uma breve pesquisa levou os dois à tradicional Ansa, comandada pela carismática e mais antiga professora de costura de Curitiba, Adelia Parron Alvarez. “A gente chegou lá e tinha um monte de senhorinha olhando dois caras barbados, vestidos com uniforme de polícia”, contam, rindo com a lembrança.
Ilvo, o irmão mais novo, é atento aos detalhes. "Sou bem perfeccionista". Foto: Letícia Akemi / Gazeta do Povo
Ilvo, o irmão mais novo, é atento aos detalhes. "Sou bem perfeccionista". Foto: Letícia Akemi / Gazeta do Povo
Logo no primeiro dia de aula, os militares perceberam que o hobby seria tudo, menos fácil. O território da costura acabou se revelando tão desafiador quanto algumas missões de airsoft, afinal. “Saí de lá mais triste do que não sei o quê. Até aprender a fazer uma costura reta demorou quase uma semana”, confessa Ilvo.

Pouco a pouco, porém, os policiais se apaixonaram pelo processo. “Mal comecei o curso e minha esposa pediu para fazer uma fantasia da Dra. Brinquedo para a minha filha. Ficou muito show!”, exclama Edmilton.

Depois de costurar o jalequinho branco com conjunto de camiseta listrada e calça de bolinhas da personagem da série infantil para Ana Júlia, de três anos, ele se sentiu pronto para novos desafios. Reformou o próprio terno (uma tarefa árdua e cheia de detalhes, geralmente feita apenas por quem realmente entende do assunto) e até mesmo os colegas de tatame se tornaram clientes.
“Quando contei, todo mundo começou a rir e a tirar sarro. No dia seguinte, cada um trouxe uma peça que precisava de ajuste”, conta ele, que se tornou o bordador oficial dos quimonos de jiu-jitsu. Segundo Ilvo, Edmilton passou a ser chamado pelos colegas de Jacques Leclair, o personagem estilista da novela Ti Ti Ti.
"Eu brinco que não sabia nem olhar pra máquina de costura antes de começar", conta Edmilton. Foto: Letícia Akemi / Gazeta do Povo
"Eu brinco que não sabia nem olhar pra máquina de costura antes de começar", conta Edmilton. Foto: Letícia Akemi / Gazeta do Povo

Clube da costura dos PMs

Meses depois do início das aulas, missão cumprida. As primeiras camisetas de airsoft ficaram prontas e não demorou muito para que as encomendas dos colegas começassem a chegar. Hoje, vendem quatro fardas completas por mês.  “Virou um hobby com lucros”, conta Edmilton. Os dois se basearam nos modelos dos militares norte-americanos e reproduziram cada detalhe em ripstop camuflado, uma espécie de brim ultra-resistente.
Entre máquinas retas, chuleadeiras e uma bordadeira, além da mesa de corte e do ferro semi-industrial, os dois investiram quase R$ 12 mil no passatempo. Resultado: o sótão do sobrado de Edmilton acabou se tornando uma minifacção e até mesmo Daniele, sua esposa, entrou para o clube da costura.
Ela aprendeu o básico com o marido e em seguida fez um curso rápido, também com dona Adélia. Hoje, produz bolsas e nécessaires nas horas livres. É uma festa. “Quando a gente vê já são três, quatro horas da manhã. O tempo passa voando quando a gente costura”, diz o irmão mais velho.
Os policiais militares se reúnem nas horas livres para se dedicarem à costura. Foto: Letícia Akemi / Gazeta do Povo
Os policiais militares se reúnem nas horas livres para se dedicarem à costura. Foto: Letícia Akemi / Gazeta do Povo

Caçadores de tendências

Enquanto seus colegas de profissão assistem à maioria dos filmes de guerra por diversão, os dois irmãos ficam atentos à TV com outro objetivo: procurar tendências. Com olhar focado nos figurinos dos personagens, eles miram o que pode ser reproduzido em suas criações. “A gente busca essas referências e, a partir das novidades, inova na camuflagem, nos modelos”, revela Ilvo.
Ele cita o premiado Sniper Americano, de 2014. “As blusas que a gente está usando são quase iguais às do filme, pode conferir”, diz. Mas, a cada nova peça, seja ela feita para uma encomenda ou para uso próprio, dão um jeito de acrescentar um toque seu. E, mesmo sem saber (ou admitir), os dois policiais militares acabaram tornando-se designers de moda.
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