Saúde e Bem-Estar

Alexandre Lucchese, Agência RBS

Quando a criança deve deixar de ver o pediatra?

Alexandre Lucchese, Agência RBS
03/06/2019 12:00
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Quando o adolescente tiver o crescimento consolidado e a autonomia para cuidar da saúde, pode realizar a transição do pediatra para um clínico geral. Foto: Bigstock.

Adolescência é tempo de mudança. Descobertas, crescimento e novos interesses movimentam a mente e o corpo a partir da puberdade. Em meio às transformações dessa fase de vida, uma relação pode ser mantida e fortalecida: a do adolescente com seu médico de referência.

Associado a crianças pelo senso comum, o pediatra é um profissional capacitado a acompanhar seus pacientes além da infância. De acordo com o Conselho Americano de Prática Pediátrica, as visitas a esse profissional devem prosseguir até que o paciente complete 21 anos de idade.

“Como todo limite convencionado, há certa arbitrariedade na escolha dos 21 anos. No entanto, é uma referência que se baseia em fatos e estudos. A pediatria é área da medicina ocupada com o ser humano em crescimento, e, aos 21, o indivíduo é normalmente considerado como adulto. Na prática do consultório, esse rompimento com o pediatra se dá geralmente antes. Por volta dos 18,o próprio adolescente passa a sentir inibido e procura um médico para adultos”, explica o pediatra Sylvio Renan.

Lilian Day Hagel, do Comitê de Adolescência da Sociedade de Pediatria do Rio Grande do Sul (SPRS), afirma que existem dois momentos chave para a mudança de profissional.
Além do início da idade adulta, quando o paciente já completou seu crescimento e tem autonomia para cuidar da própria saúde, também é preciso ter atenção para o início da puberdade, entre os 9 e os 13 anos.
Nessa fase, o paciente pode trocar o pediatra por…outro pediatra. Isso porque muitos desses profissionais, por iniciativa pessoal, optam por restringir o atendimento a crianças antes da adolescência.
Ao longo da adolescência, o jovem acaba visitando diferentes especialistas, como ginecologista, urologista, nutricionista, entre outros. É desejável que as consultas se deem de maneira integrada, por meio do pediatra. Foto: Bigstock.
Ao longo da adolescência, o jovem acaba visitando diferentes especialistas, como ginecologista, urologista, nutricionista, entre outros. É desejável que as consultas se deem de maneira integrada, por meio do pediatra. Foto: Bigstock.
Já outros se especializam, por meio de cursos acadêmicos, como hebiatras, ou seja, pediatras com conhecimento aprofundado no desenvolvimento de adolescentes.

“Por volta dos 10 anos, há transformações no corpo da criança. O hebiatra está capacitado a avaliar a curva de crescimento e orientar pais e paciente, para evitar doenças e promover sua saúde, o que pode impactar na altura final. No entanto, mesmo que não tenha passado por uma especialização, todo pediatra também estudou o crescimento dos adolescentes, e pode atender esse público. Se a família tem um pediatra de confiança que tenha disponibilidade de seguir atendendo o adolescente, pode continuar com ele”, avalia Lilian.

A médica observa que, independentemente da idade, é importante que o paciente tenha um médico de referência. Ao longo da adolescência, o jovem acaba visitando diferentes especialistas, como ginecologista, urologista, nutricionista, entre outros.
Mas é desejável que as consultas se deem de maneira integrada, por meio do pediatra. Lilian explica: “O médico de referência, conhecendo o histórico do paciente, pode realizar diagnósticos mais apurados e integrais”.

Pediatras que atendem crianças e adolescentes precisam ter sensibilidade para não cruzar os diferentes públicos. Os mais velhos podem se sentir inibidos ao verem na sala de espera um bebê ou uma criança muito pequena.

Os profissionais relatam que, por volta dos 18 anos, a maior parte dos pacientes acaba sendo orientada a buscar um clínico geral. É por volta dessa idade que o crescimento físico usualmente já está consolidado, e também que os pacientes já contam com responsabilidade e autonomia para o cuidado pessoal.
O clínico geral será, então, o novo médico de referência do paciente, podendo orientá-lo na busca de especialistas para dúvidas específicas ou tratamento de determinadas doenças. “Infelizmente, a cultura de ter um clínico de referência está se perdendo, mas os adultos também se beneficiam muito com esse profissional”, diz a pediatra Lilian.

Quando é hora de trocar

– Entre os nove e os 13 anos, o corpo da criança começa dar os sinais de que a puberdade se aproxima. Se o pediatra não costuma atender adolescentes, busque um novo médico.
– Em sua formação, todos os pediatras estudam as particularidades do tratamento de adolescentes, estando capacitados a receber esse público. Alguns até mesmo se especializam nessa faixa etária de pacientes. São os chamados hebiatras.
– O adolescente pode consultar com especialistas de diferentes áreas, mas é positivo que mantenha um hebiatra ou pediatra como médico de referência. Esse profissional é capaz de oferecer diagnósticos mais precisos e integrais, com base no histórico do jovem.
– Não há uma idade estipulada para que as meninas consultem pela primeira vez com um ginecologista, e os rapazes, com um urologista. O ideal é que o pediatra oriente em que momento deve ocorrer essa visita.
– A partir da adolescência, seu filho pode ter momentos de consulta privada com o médico, ou até mesmo ir sozinho ao consultório. Respeite o sigilo entre médico e paciente.
– Quando o adolescente tiver o crescimento consolidado e a autonomia para cuidar da saúde, pode realizar a transição do pediatra para um clínico geral. Não há uma idade padrão para essa mudança, mas costuma ser por volta dos 18 anos.

Sigilo e respeito ao paciente

Descobertas geram dúvidas, e muitos adolescentes chegam ao consultório médico com perguntas sobre transformações de seu corpo – várias delas relacionadas à saúde sexual.
No entanto, os jovens podem se sentir inibidos de falar sobre sexo com o seu médico na frente dos pais. É por isso que os adultos precisam estar preparados para que os filhos tenham conversas reservadas com o pediatra.

“Muitos adolescentes vêm sozinhos ao meu consultório, e os pais me ligam depois para saber como foi a consulta. Eu os tranquilizo, explico que o paciente está bem, mas mantenho o sigilo sobre o que foi tratado”, diz Sylvio Renan.

Lilian reafirma que o sigilo é fundamental para uma relação entre médico e paciente, e só pode ser quebrado em situação de risco de morte. Manter a discrição também é importante para que o pediatra não se torne um mediador nas conversas entre pais e filhos, estimulando o diálogo direto entre os familiares.
“Podemos esclarecer as dúvidas dos pais, mas sem infringir o sigilo. É importante que a família entenda que a consulta é do adolescente, mesmo quando os pais estão presentes. Pais e filhos podem se esclarecer depois”, observa Lilian.
Conforme o adolescente amadurece, o pediatra pode orientá-lo para realizar consultas com ginecologista ou urologista. No entanto, Lilian Day Hagel observa que os próprios pediatras também são fontes de informação sobre DSTs, uso de preservativos e outros temas relacionados à sexualidade: “o contato com o corpo também inclui prazer, e é normal a criança querer se conhecer. O pediatra está atento a isso, pois é algo que também faz parte crescimento.”
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