Saúde e Bem-Estar

Mariana Ceccon, especial para a Gazeta do Povo

Uso indevido das cintas de correção postural aumenta dores e causa danos irreversíveis

Mariana Ceccon, especial para a Gazeta do Povo
29/04/2019 12:00
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Não importa o tamanho do bolso. Dentro da ampla faixa dos R$ 30 até R$ 400 é possível conseguir uma cinta de correção postural.
No formato de coletes, camisetes, em neoprene, elastano e até preenchidos com imãs, as peças prometem verdadeiros milagres como alinhar a postura e aliviar as dores nas costas e lombares — mal que atinge mais de 80% da população, de acordo com dados divulgados pela OMS (Organização Mundial de Saúde).
Para conseguir se libertar das pontadas, os fabricantes recomendam o uso da peça todos os dias, durante o trabalho e a execução de exercícios físicos, com folga somente a noite.
O que frequentemente não vem avisado nos anúncios, comuns nas redes sociais, é que o uso prolongado da peça pode causar justamente o efeito oposto ao desejado: o enfraquecimento da musculatura e a piora dos sintomas, como a dor e a má postura. É o que explica o ortopedista e cirurgião, especialista em coluna, Luiz Gustavo Dal Oglio da Rocha:

 “Quando a pessoa apresenta má postura, além dos vícios como sentar de forma errada, geralmente ela tem também retrações associadas ao sedentarismo. Então quando usa uma estrutura externa como esses coletes, que forçam a postura e colocam os músculos em repouso, acabam atrofiando essa musculatura”, diz o ortopedista.

O médico aponta, no entanto, que apesar de existirem versões de coletes rígidos, específicos para casos de fraturas ou escoliose, os de material maleável não apresentam riscos à estrutura óssea.
“Não acredito que a coluna em si possa ser prejudicada com esse tipo de produto, mas não sou favorável ao uso indiscriminado. O correto é as pessoas terem um colete natural, que é uma musculatura forte”, pontua.
No formato de coletes, camisetes, em neoprene, elastano e até preenchidos com imãs, as peças prometem verdadeiros milagres como alinhar a postura e aliviar as dores nas costas e lombares. Foto: Reprodução.
No formato de coletes, camisetes, em neoprene, elastano e até preenchidos com imãs, as peças prometem verdadeiros milagres como alinhar a postura e aliviar as dores nas costas e lombares. Foto: Reprodução.
Mais crítico a esses produtos, o coordenador do curso de fisioterapia da PUCPR e doutor em saúde coletiva, Pedro Cezar Beraldo diz que os efeitos do uso indiscriminado desses dispositivos podem ser difíceis de reverter, principalmente para pessoas com mais de 40 anos e que tenham o usado por mais de três semanas.

“O pior que pode acontecer é agravar muito alguma lesão e prejudicar as articulações. O uso desses cintos em geral enfraquece os músculos da barriga, sobrecarregando a lombar ou forçando um alinhamento prejudicial do seu corpo”.

O fisioterapeuta explica que este tipo de equipamento ergonômico é classificados como órtese, mesma nomenclatura de outros aparatos de imobilização, como talas e gessos para fraturas.
“Sempre que há uma imobilização justificada para tratar de uma fratura, temos que lidar depois com algum grau de atrofia que a órtese causou. Com os coletes é a mesma coisa. É preciso ficar claro que nosso corpo é o que é porque recebe estímulos diários para reagir e se fortificar”, cita.
Não há segredo. Para o professor, as dores nas costas são aliviadas com exercícios físicos, alongamentos de cinco minutos a cada hora trabalhada e atenção ao estilo de vida. “A tendência é as pessoas sempre procurarem o caminho mais curto para resolver esses problemas e nem sempre ele é o melhor. É muito menos incômodo você usar um cinto do que ir a um profissional, consultar e fazer exercícios”, critica.
Adolescentes demonstram interesse estético
Não é difícil encontrar um jovem ou adolescente fazendo perguntas sobre estes produtos em anúncios na internet e em sites especializados de material ortopédico. A maioria pede mais informações com relação a melhorias estéticas, como afinamento da cintura e envergamento da postura.

O ortopedista Luiz Augusto da Rocha diz que o uso de coletes rígidos em adolescentes é aceitável em casos de escoliose. “Quando há uma deformidade e pretendemos que a coluna cresça bem alinhada, é justificado o uso de coletes rígidos”, comenta. “O problema é quando há um desequilíbrio e a pessoa, por segurança, coloca o cinto (maleável) para sentir a região mais firme e acaba ficando dependente disso”, explica.

O fisioterapeuta Pedro Beraldo diz que, via de regra, não vale a pena usar esse tipo de órtese em nenhuma condição. “Essa é uma faixa de idade perigosa, porque dos 14 aos 16 temos o estirão de crescimento e uma musculatura fragilizada tende a não acompanhar direito o crescimento”, pontua.
“Não vemos muitas iniciativas de controle de venda desses produtos, porque entende-se que não podem fazer tanto mal quanto um remédio e serão usados com indicação profissional. Mas na minha opinião esse tipo de produto só deveria ser comercializado após passar pelo aval de instituições de pesquisa médica sérias”, arremata.
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