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A circunferência da cintura aumentou, em média, nas meninas que pulam o café da manhã, em torno de dois centímetros. Foto: Bigstock.
A circunferência da cintura aumentou, em média, nas meninas que pulam o café da manhã, em torno de dois centímetros. Foto: Bigstock.| Foto:

Cerca de 20% dos adolescentes brasileiros pode estar trocando meia hora de sono no começo do dia por alguns centímetros a mais na circunferência abdominal.

Essa é a parcela de pessoas dessa faixa etária que “pula” o café da manhã – hábito que tem relação direta com o ganho de peso e o desenvolvimento precoce da obesidade, segundo um estudo recém-divulgado por pesquisadores da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP).

O artigo publicado na revista científica Nature pela epidemiologista Elsie Forkert, pesquisadora do grupo de pesquisa YCare, do departamento de Medicina Preventiva da FMUSP, avalia a relação de determinados comportamentos com os chamados marcadores de obesidade, medidos através do IMC (Índice de Massa Corporal) e da obesidade abdominal – a circunferência da cintura, na relação cintura/altura.

“O que percebemos foi que, independentemente do tempo de sono e mesmo dormindo bem, tanto meninos quanto meninas, quando o adolescente “pulava” o café da manhã, se associavam todos os marcadores de obesidade”.

A partir da análise de dois bancos de dados – um europeu e um brasileiro –, ela percebeu alguns aspectos em comum entre os adolescentes, como a opção por trocar a primeira refeição do dia por um lanche no meio da manhã.

“O menino europeu, pulando o café da manhã, chegou a ter um aumento de 1,3 Kg/m². E o menino brasileiro, 1,7 kg/m² a mais, em média, mesmo dormindo adequadamente. A circunferência da cintura aumentou três centímetros em média no europeu e, nas meninas, cerca de dois centímetros”.

O que preocupa a pesquisadora são as consequências da obesidade infantil, diretamente, mas também a herança destes hábitos para o futuro do indivíduo.

Este ganho precoce de peso se torna um fator de risco para o desenvolvimento de doenças cardiovasculares e cardiometabólicas, com desdobramentos para a hipertensão e o diabete, por exemplo.

Um mau negócio

O ganho de peso é consequência da substituição de uma refeição que costuma ser mais equilibrada por um lanche com alimentos mais calóricos, normalmente consumidos fora de casa.

“O café da manhã deve prover cerca de 25% do total de ingesta energética que a gente deve ter, diariamente. É uma refeição muito importante, a gente vem de um período longo de jejum, devido à noite, e levantar e já sair direto faz com que se fique sem fazer o uso de alimentos nutricionalmente adequados, que seria comer uma fruta, um produto lácteo como um iogurte ou uma coalhada, ou um cereal integral”, explica.

O resultado é que, no meio da manhã, quando a fome começa a aparecer, os adolescentes optam por produtos de valor nutricional baixo, como biscoitos recheados, gorduras e salgadinhos. “Ou até mesmo comer um salgado frito na cantina da escola, tomar uma bebida açucarada, como os sucos de caixinha que têm alto teor de açúcar”.

Para garantir uma refeição saudável, é preciso não apenas fazer esta refeição antes de sair de casa, mas também buscar a alimentação equilibrada, algo que se alcança combinando três grupos de alimentos, conforme explica a química e nutricionista clínica funcional Maria das Graças Teixeira.

“Um bom café da manhã precisa ter os três macronutrientes: proteína, carboidrato e gordura boa. É importante levar em consideração o dispêndio de energia que os adolescentes têm, já que ainda precisam crescer e complementar formação em diversas partes do corpo”.

Dessa forma um café da manhã adequado pode incluir, por exemplo, uma fatia de pão com manteiga de amendoim, e ser complementado com uma omelete com salsinha e tomate, equilibrando, assim, a dieta.

Os sucos, por sua vez, devem ser evitados. “Suco de fruta não é um bom alimento, pois traz excesso de frutose e de carboidrato. Se for optar por essa bebida, a recomendação é preferir o suco de abacaxi ou o de laranja, mas diluídos”, detalha Maria das Graças.

Outras opções incluem o que a nutricionista chama de frutas doces. “No café da manhã, a banana e o mamão são excelentes, são doces e combinam com comida. Melancia e melão são frutas hídricas, que atrapalham a digestão, são frutas para serem comidas sozinhas, nem como sobremesa, nem como opção no café da manhã”.

Assim, uma alternativa saudável seria ingerir uma banana com granola sem açúcar e complementar com iogurte natural sem corantes e também não adoçado.

Além do que está na mesa, a nutricionista reforça a importância de “quem” está por perto na hora do café da manhã, que deve, segundo ela, ser um hábito familiar.

“Ouço o relato tanto de crianças, quanto de adolescentes, que não têm fome na hora em que levantam, e quando acordam atrasados elas saem sem comer nada, ou tomam um leite com achocolatado. O mais adequado seria levantar mais cedo e fazer um bom café da manhã. Mas se isso acontece com raridade, é preciso não ter vergonha de levar um bom lanche. Mesmo assim, o papel dos pais é essencial”.

A pesquisadora da FMUSP concorda:

“Os dados mostram que o comportamento dos pais influencia diretamente neste resultado. Crianças que têm um estilo de vida mais saudável, que conseguem fazer atividade física e têm menos tempo de sedentarismo, absorvem padrões melhores de consumo”.

Segundo ela, há estudos que relacionam a alimentação dos filhos aos níveis educacionais e econômicos dos pais. “A alimentação dos filhos é melhor quando os pais têm nível educacional melhor. Porém, em relação à renda familiar, muitos trabalhos apontam que famílias mais simples têm hábitos mais saudáveis do que outros com renda mais alta”.

Um café da manhã adequado pode incluir uma fatia de pão com manteiga de amendoim, e ser complementado com uma omelete com salsinha e tomate. Foto: Bigstock.
Um café da manhã adequado pode incluir uma fatia de pão com manteiga de amendoim, e ser complementado com uma omelete com salsinha e tomate. Foto: Bigstock.

Bases científicas

Parte da pesquisa de pós-doutorado de Elsie Forkert, o artigo publicado por ela usou como base um banco de dados com dez cidades de nove países diferentes da Europa, que analisou mais de 3,5 mil adolescentes, masculino e feminino, de escolas públicas e privadas, sob vários aspectos, focando a saúde, o estilo de vida e a nutrição.

“Em contraponto, tivemos a análise do banco sobre os adolescentes do Brasil pertinentes a um estudo chamado Braca, feito em Maringá, que analisa adolescentes sob a ótica da saúde cardiovascular. Como estes dois estudos tinham total semelhança entre os tipos de análise e população, foi possível fazer todas essas análises”, esclarece.

As semelhanças incluem o fato de que ambos os estudos que foram usados como base levaram em consideração hábitos relacionados ao balanço energético, que se associam a padrões de adiposidade, de obesidade e gordura.

“São fatores influenciados geralmente pelo ambiente e por fatores biológicos. Os comportamentos avaliados foram os de sono, atividade física, sedentarismo e de pular o café da manhã. Não é apenas a genética que determina a obesidade, há um contraponto no ambiente e de tudo o que isso envolve, principalmente em termos de comportamento. Então se ele assume um estilo de vida saudável, o adolescente pode postergar uma doença crônica como o diabete tipo 2, se ele consegue uma perda de peso e uma qualidade vida e alimentação saudável com atividade física”.

No Brasil, a obesidade acomete 13% dos meninos e 10% das meninas entre 5 e 19 anos, segundo o Ministério da Saúde. A Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica estima que, até 2025, 700 milhões de pessoas serão obesas no mundo, das quais 75 milhões serão crianças. A estimativa é de que 2,3 bilhões de adultos estarão com sobrepeso neste mesmo período.

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