Saúde e Bem-Estar

É estranho, mas é normal

Érika Busani
14/05/2006 23:10
erikab@gazetadopovo.com.br
A maioria das crianças passa por uma fase em que adora falar sobre suas, digamos, “eliminações”. É um tal de cocô pra cá, xixi pra lá… E quando a mãe horrorizada fala o primeiro “o que é isso, menino?”, aí é que a coisa fica mais gostosa e eles falam ainda com mais satisfação – quem nunca ouviu uma criança chamando o colega de “cabeça de cocô” ou “cocozão” e o quanto ela se diverte com isso?
A pequena Gabriela, de 5 anos, não tem censura em relação a esses assuntos. Salete Kuhnert Santos, 32 anos, mãe da menina, costuma orientar a filha, mas de maneira tranqüila: “Sei que é uma fase que vai passar. Converso, falo que não é legal, mas não quero deixá-la constrangida. Com o tempo, ela vai perceber e acabar se corrigindo”, conta.
A psicóloga e psicopedagoga Úrsula Mariane Simons diz que, no começo – em torno dos 2 anos – os pequenos falam porque, para ele é prazeroso. “A criança não tem preconceitos, nem noção de cheiro bom ou ruim e descobre que é capaz de produzir algo. Isso traz uma satisfação muito grande. Se ninguém passar preconceito, ela tem prazer de mexer na ‘obra’ – o mesmo prazer que mais tarde terá com a massinha de modelar, a argila. Para ela, é duplamente positivo: é obra dela e é gostoso de mexer.”
Mas aí entra o adulto e diz: “É caca. Ui! Que cheiro ruim!” A criança então começa a perceber que para os pais aquilo é importante, mas pelo outro lado. Como já descobriu que é um ser e se opõe a tudo para se auto-afirmar, manipula o adulto por meio de suas necessidades. “Ela só faz se quiser, onde quiser, não pede para ir ao banheiro. Quanto mais percebe que isso é importante para os pais, mais manipula. Todo mundo só fala nisso e, assim, ela consegue atenção”, descreve Úrsula.
Quando a criança fala cocô e xixi, segue o mesmo caminho, afirma a psicóloga. O adulto tem muito preconceito e diz: “Não fale isso em público. É feio!” Como a criança quer mesmo chamar a atenção, descobre um meio perfeito. “O que há de mais precioso para a criança é a atenção. Só que para ela, tanto faz se é pelo positivo ou negativo. Quanto mais os adultos se irritam, mais ela vai fazer. Se ninguém der bola, essa fase quase não aparece.” Fica fácil entender porque muitas crianças estendem a fase até os 5 ou 6 anos.
Nessa idade a escatologia também pode ter outros motivos, conforme Tatiana de Souza Centurion, psicóloga sistêmica familiar. Eles podem estar simplesmente “identificando o que não presta”, quando dizem “isso está um cocô”. Quando falam com muita freqüência, no entanto, a psicóloga recomenda que os pais identifiquem os sentimentos que estão por trás disso. “A criança pode estar com problemas de auto-estima. Ela se sente mal e põe para fora de outra forma”, diz. Quando nada é bom, tudo é uma porcaria, é como uma luz vermelha indicando que algo está errado.
Serviço: Tatiana de Souza Centurion (psicóloga), fone (41) 3019-9553 / Úrsula Mariane Simons (psicóloga e psicopedagoga), fone (41) 3338-8223.