Saúde e Bem-Estar

Mariana Ceccon, especial para o Viver Bem

Indiferença e falta de prazer são sintomas mais comuns de depressão

Mariana Ceccon, especial para o Viver Bem
08/12/2019 08:00
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Busca por tratamentos alternativos é esperança para quem sofre de depressão refratária, forma repetitiva da síndrome e resistente à medicação convencional. Foto: Bigstock.

“Eu não consigo chorar”, conta o cozinheiro A.G, de 20 anos. “Não consigo sentir mais nada. Nem comendo meu prato favorito, vendo um filme, estando entre amigos ou até mesmo com uma namorada. Simplesmente não é o suficiente para me cativar. As pessoas não tem brilho”.
É dessa forma que o rapaz resume os três anos em que luta contra a depressão.

“Isso sempre foi lidado como bobeira e frescura por todos ao meu redor, mas foi apenas acumulando. Às vezes eu quero colocar pra fora, chorar, mas meus olhos simplesmente ficam secos e depois de alguns segundos volto a ficar indiferente”, detalha.

Sentir-se assim está longe de ser uma exceção entre aqueles que sofrem com a depressão, um transtorno que a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) estima afetar mais de 300 milhões de pessoas no mundo.
A anedonia, palavra usada para descrever justamente essa perda de capacidade de sentir prazer nas atividades diárias, também está igualmente longe de ser apenas “mais um sintoma” da doença.

Anedonia Perda de capacidade de sentir prazer nas atividades diárias, que antes eram prazerosas

Esse desequilíbrio é tão comum e importante para diagnosticar alguém depressivo quanto a sensação de tristeza profunda ou desesperança com a vida.
Para a psiquiatra Maria Fernanda Caliani, o estigma de a depressão ser comumente associada a quadros de choro, agonia e tristeza dificulta a compreensão dos familiares, amigos e até mesmo do próprio paciente sobre os outros aspectos do transtorno, atrasando a procura por ajuda profissional.

“Estamos falando de uma síndrome. Então a pessoa não sente apenas a falta de prazer, mas isso vem associado com outros fatores. Pode ser uma queimação no estômago, insônia, aquele cansaço no qual você dorme e nunca se sente renovado, falta de concentração e dificuldade no raciocínio. E por apresentar esses sintomas em conjunto, as pessoas acabam procurando várias outras especialidades médicas, antes de chegar até o psiquiatra”, explica.

É a mesma opinião do médico do Instituto de Psiquiatria do Paraná, Emerson Rodrigues Barbosa. O psiquiatra conta que a falta de prazer e os relatos de indiferença acabam sendo mais comuns em seu consultório do que os de tristeza generalizada.
“É mais difícil para as pessoas entenderem a indiferença afetiva. Muitos deles são tratados como vagabundos e preguiçosos pela família, porque não tem energia. Quando você diz que um depressivo precisa ter força de vontade é a mesma coisa que dizer para alguém com pneumonia para se esforçar e respirar”, pontua.
Este é o caso da dona de casa Cassia Bernardo, de 30 anos. Há quatros anos dividida entre crises de ansiedade e depressão, ela conta ter dificuldade para conseguir manter um emprego, estudos ou até mesmo lidar com as atividades relacionadas aos cuidados familiares.

“Não vivo chorando, apenas ´vegeto´”, lamenta. “As pessoas em volta de mim dizem que fico mal quando é conveniente ou que não cuidar da própria casa é uma doença chamada preguiça, mas a verdade é que vivo presa em um ciclo”, relata.

O ciclo de Cassia funciona mais ou menos dessa forma: sem vontade de realizar nenhuma atividade ela se sente incapaz e desmotivada para conquistar seus objetivos.
Com a estagnação, vem a tristeza e a sensação de inutilidade. Desse ponto ela passa a se cobrar e também receber cobranças de quem está próximo. A pressão a leva ao marco inicial: a falta de vontade e apatia.

“Eu amava dançar. Hoje não sinto prazer algum com isso. Não vejo graça nas piadas que me contam, não consigo dar o carinho que meus filhos precisam. O julgamento e as críticas só pioram e reforçam a culpa que sentimos por estarmos assim. É como se fossemos um peso para aqueles que nos cercam”, lamenta.

Quando é depressão?

Segundo a OPAS, a depressão é um transtorno mental que atinge homens e mulheres de todas as idades. É caracterizado basicamente por dois aspectos: tristeza persistente e perda de interesse em atividades que normalmente são prazerosas.
Essa combinação ou manifestação exacerbada de uma delas, quando acompanhadas da incapacidade de realizar atividades diárias, durante pelo menos duas semanas, podem caracterizar a depressão.
“Esta é uma doença inflamatória cerebral e degenerativa. Hoje sabemos que é um transtorno também ligado à conexão entre neurotransmissores”, explica o psiquiatra Emerson Barbosa.

Outros sintomas, considerados secundários, mas que também chamam atenção para um possível desequilíbrio são: perda de energia; mudanças no apetite; aumento ou redução do sono; ansiedade; perda de concentração; indecisão; inquietude; irritabilidade; sensação de que não valem nada, culpa ou desesperança.

“É importante entender que esses sintomas não devem estar associados a um quadro de luto ou mudança de grande impacto. Nesses casos, a pessoa normalmente sente uma melhora em até três meses. Se não há melhora depois disso, podemos considerar que ocorreu o desenvolvimento de um quadro depressivo”, completa o profissional.
Outro importante e decisivo sintoma, que indica um agravamento da doença são os pensamentos de suicídio ou de causar danos a si mesmo. Mais de 800 mil pessoas por ano são vitimadas por este sintoma, sendo a segunda principal causa de morte, entre pessoas com idade entre 15 e 29 anos.
“Esse é o maior agravante da doença, mas está muito mais ligado ao aspecto da tristeza e da perda de esperança, do que da falta de prazer. Está mais próximo das pessoas que vem o mundo de uma maneira mais negativa e não tem expectativa de sair daquele episódio”, pontua Barbosa.
Nestes casos, a anedonia, apesar de ser o principal elemento incapacitador, funciona quase como um mecanismo de defesa contra o aspecto mais perigoso da doença.
“A perda de vontade acaba sendo de certa forma um protetor. Pessoas que não têm energia para escovar os dentes ou manter suas atividades básicas, dificilmente terão energia para planejar ou executar um suicídio”, explica Barbosa.
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