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Os itens dessas lojas são abertamente indicados pelos administradores dos portais como alternativas a medicamentos e vacinas criticados nos textos com informações falsas. Foto: Bigstock.
Os itens dessas lojas são abertamente indicados pelos administradores dos portais como alternativas a medicamentos e vacinas criticados nos textos com informações falsas. Foto: Bigstock.| Foto:

Dois dos maiores sites brasileiros divulgadores de notícias falsas sobre saúde, responsáveis pela publicação de centenas de artigos antivacina, têm por trás um comércio de produtos naturais com lojas física e online.

Os itens dessas lojas são abertamente indicados pelos administradores dos portais como alternativas a medicamentos e vacinas criticados nos textos com informações falsas.

Assim como nesse caso, outras páginas na internet, perfis no Facebook e canais no YouTube têm disseminado informações falsas ou imprecisas sobre doenças ao mesmo tempo em que vendem supostas curas milagrosas e consultas.

A ligação comercial entre sites de fake news e venda de produtos naturais foi descoberta por investigação da organização não governamental Avaaz em parceria com a Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm) e confirmada pela reportagem, que encontrou outros indícios desse elo.

Estudo realizado pelas duas instituições mapeou as principais páginas divulgadoras de fake news no País e o conteúdo divulgado por elas. Foram analisados oito sites, que, juntos, divulgaram 1.613 notícias falsas ou imprecisas sobre saúde entre 2014 e 2019.

A estimativa do estudo é de que essas notícias tenham sido compartilhadas 489 mil vezes no Facebook.

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Entre as fake news disseminadas estão as que relacionam a vacina tríplice viral à ocorrência de autismo, textos que questionam a segurança da imunização contra HPV, além de teorias da conspiração que indicam que a indústria farmacêutica atua para não achar a cura do câncer.

Essas informações não têm base científica.

Do total de sites analisados, dois foram os campeões de publicações: Notícias Naturais e Anti Nova Ordem Mundial. Juntos foram responsáveis pela publicação de 979 artigos.

Em todas as publicações, observa-se como anunciante único do site a loja Tudo Saudável, com sede em Florianópolis, que vende produtos naturais em loja física e pela internet. Procuradas, as empresas não se manifestaram.

A ligação entre os sites e a empresa não é apenas publicitária. Utilizando ferramentas de análise de páginas web, a reportagem descobriu que os três sites compartilham o mesmo código do Google Analytics (serviço que mede audiência nos sites).

Ou seja, as três páginas estão vinculadas a uma mesma conta e, portanto, são administradas por uma mesma pessoa ou empresa.

Além disso, em fórum criado dentro do site Notícias Naturais, a reportagem encontrou o administrador da página de notícias recomendando a leitores a compra de produtos no site Tudo Saudável.

Possíveis interesses comerciais na divulgação de informações pseudocientíficas ficam ainda mais evidentes em canais no YouTube como o do autointitulado terapeuta naturista Jaime Bruning.

Para 596 mil seguidores, ele divulga vídeos criticando vacinas e apresentando curas naturais para diversas doenças. Na mesma plataforma, aproveita para divulgar seus produtos.

Os principais são um livro sobre medicina natural por R$ 67 e consultas em que oferece “avaliação bioenergética a distância” por R$ 110.

Outro canal, o Saúde Alternativa, tem vídeos com “tratamentos naturais” para várias doenças e divulga terapias vendidas no site de mesmo nome. Nele, há promessas de tratamento até para a aids por meio de uma terapia com base em “mudança radical na alimentação e no psicológico do indivíduo”.

Mercado

Segundo Nana Queiroz, coordenadora de campanhas da Avaaz, o modus operandi dos canais brasileiros que divulgam fake news – muitas vezes com intuito de lucrar com isso – é inspirado em experiências dos Estados Unidos.

“É um mercado de fake news que alimenta o medo da ciência tradicional para lucrar com a venda de livros e curas milagrosas. Alguns artigos nos sites brasileiros são cópia exata de textos publicados em sites americanos. Lá, algumas dessas plataformas já foram banidas. Aqui, os textos continuam circulando livremente e com grande alcance.”

A investigação da Avaaz descobriu que pelo menos 32% das 1.613 notícias incorretas divulgadas nos oito sites eram traduções de conteúdo de fora.

“Em saúde, muitas vezes as pessoas estão em busca de milagres e isso (oferecer curas sem comprovação científica) é uma maneira fácil de conquistá-las. Essas pessoas falam com uma certeza dos dados que, se você não domina o assunto, parece ter lógica, mas é uma lógica falsa”, destaca a vice-presidente da SBIm, Isabella Ballalai.

Resposta

A reportagem tentou por quatro dias falar com a dona da empresa Tudo Saudável, Mayara Cristina Modesti, mas não obteve resposta.

A reportagem também procurou Bruning, que não quis se pronunciar. Em seu canal no YouTube, diz ser vítima de perseguição.

Já o responsável pelo canal e site Saúde Alternativa, o fisioterapeuta Paulo Makiyama, afirmou que a terapia que indica é pautada na crença de que todos os problemas que o ser humano desenvolve têm causa emocional.

Makiyama afirmou que “não existe nenhuma imposição para a pessoa deixar de fazer o tratamento tradicional”.

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