Saúde e Bem-Estar

Carolina Kirchner Furquim, especial para a Gazeta do Povo

Há cura para o autismo? Confira mitos e verdades sobre o transtorno

Carolina Kirchner Furquim, especial para a Gazeta do Povo
02/04/2019 07:00
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Autismo não tem cura, mas há como melhorar a qualidade de vida. Foto: Bigstock.

Uma inaptidão que costuma demonstrar seus sinais logo no início da vida, o Transtorno do Espectro Autista, ou autismo, é fruto de uma desordem neurológica que se manifesta no desenvolvimento de habilidades como a interação social e a comunicação.
Ainda que seja mais prevalente em meninos do que em meninas, pode afetar qualquer indivíduo, em diferentes graus de comprometimento.
Conversamos com duas referências nacionais quando o assunto é autismo – a psicóloga Maria Helena Jansen de Mello Keinert, diretora do Self Center Espaço Terapêutico, especializado no atendimento a autistas, e o médico neuropediatra Sérgio Antônio Antoniuk, responsável pelo ambulatório de autismo do Centro de Neuropediatria do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná (UFPR), que esclareceram alguns pontos importantes sobre a doença, que tem diagnóstico complexo e se apresenta de várias formas.
Não existem exames médicos para diagnosticar o autismo.
Verdade, em partes. O espectro autista é multicausal e seu diagnóstico é feito através de observação comportamental. Há escalas que ajudam a rastrear a doença, como ADOS, ADIR, CARS, ATA, MCHAT e DSM-V. O importante é a consulta clínica com a família. Exames complementares como eletroencefalograma e ressonância magnética de crânio ajudam a identificar a causa do autismo.
Autistas vivem em um mundo próprio.
Verdade, em partes. O autista vive em nosso mundo, mas ao seu modo. Tem sua própria maneira de ver e se relacionar com o mundo. Eles têm o seu próprio pensamento, fantasias e objetivos. Muitas vezes tentam se relacionar e interagir com os outros, mas de uma maneira não funcional. Assim, entre os principais objetivos dos tratamentos, há técnicas que visam retirá-los desse isolamento e trazê-los até nós.
Autistas gostam de ficar sozinhos.
Mito. Em função da dificuldade em manter relações interpessoais, alguns autistas se isolam, mas não são todos. O espectro autista envolve uma gama enorme de variações, portanto, não há dois autistas com as mesmas características. Pacientes autistas vivem assim não porque querem ou gostam, mas pelas disfunções biológicas que apresentam. Esse é um comportamento obsessivo que, quando fora dele, gera sofrimentos. Por isso, lentamente há a tentativa de tirar essas rotinas mostrando outras atividades alternativas. Muitos adolescentes com autismo de alta funcionalidade tentam agir de forma normal, querem se aproximar dos colegas. Sofrem muito, inclusive situações de bullying, uma vez que o pensamento é diferente. São corretos, honestos, ingênuos e inocentes, ao contrário de um adolescente típico, por exemplo.
Autistas têm inteligência superior aos demais.
Mito. O potencial intelectual é bastante variado, como na população em geral. Os autistas de alta funcionalidade (também conhecido por Síndrome de Asperger) podem ter uma inteligência acima da média, principalmente em algumas áreas como música, artes, matemática e tecnologias (computação). Mas, de modo geral, até 70% dos casos apresentam atraso de áreas cognitivas que interferem em vários graus na aprendizagem.
Sintomas típicos do autismo surgem já na primeira infância.
Verdade. Os sintomas surgem desde o nascimento e/ou até os 36 meses. A maior parte das crianças apresenta sintomas antes dos dois anos. Para ajuda na identificação, há uma campanha para o diagnóstico precoce que orienta a perceber crianças de 12 a 14 meses que não olham para as pessoas, não desenvolve atos de acenar, bater palmas, olhar ao ser chamado, apontar o que deseja, olhar o que é apontado, entender ordens simples como “olha a mamãe” e “dá a bola para a mamãe”. Movimentos repetidos das mãos sem função indicam também dificuldades. Algumas vezes, reagem exageradamente frente a sons como os de secadores de cabelos, motocicletas, cortadores de grama e choro de crianças.
O autismo tem fortes componentes hereditários.
Verdade. Existe uma carga genética importante no espectro autista. Uma parte apresenta hereditariedade associada a alterações dos genes. Por isso, o autismo é considerado doença. Nas famílias são encontrados antecedentes de doenças psiquiátricas (depressão, transtorno bipolar e esquizofrenia, por exemplo). Na consulta da criança, muitas vezes o pai ou a mãe se identificam com o quadro de autismo ou Síndrome de Asperger. Outros fatores causais são de ordem adquirida, como prematuridade, baixo peso ao nascimento, uso de substâncias e medicamentos na gestação, doenças na gravidez e idade paterna e ou materna avançada.
Não há cura para o autismo.
Verdade. Não há cura para o autismo, mas as atuais formas de tratamento evidenciam a possibilidade de bom prognóstico. Por isso os esforços na divulgação dos sintomas precoces, para que os familiares, os professores das creches e escolas e os pediatras saibam identifica-los o mais precocemente possível. Nos consultórios, há casos suspeitos de autismo em crianças menores de um ano.
Autistas não toleram ambientes muito estimulantes.
Verdade. Os ambientes com muita estimulação sensorial não são agradáveis para os autistas, podendo até ser intoleráveis para alguns deles. Há muita reação ao mudar de ambiente ou frequentar espaços com muitas pessoas como shoppings, festas e locais onde se encontram multidões.
É melhor crescer em uma instituição especial do que no seio familiar.
Mito. O meio familiar é, via de regra, o melhor ambiente para a criança crescer e ser estimulada, desde que associada a métodos terapêuticos adequados. As crianças autistas precisam do ambiente familiar e da participação do pai e da mãe (ambos, com igual importância). As condutas devem ser uniformes, na escola e na família. Porém, os pais devem lembrar que têm outros filhos e a mãe deve lembrar que tem o marido, e vice-versa. Algumas vezes as famílias se isolam e só pensam no filho autista, por isso, o cuidado para que a família não fique “autista” também.
Há tratamentos que amenizam os sintomas.
Verdade. Os tratamentos adequados minimizam significativamente os sintomas, principalmente aqueles com base na Terapia Cognitivo Comportamental (ABA, PAD e Denver). O principal é aceitar o diagnóstico e lutar para que a criança evolua para um indivíduo o mais normal e independente possível. O mais importante é o tratamento com estimulação, bloqueio das dificuldades com muito limite e organização, sem esquecer o amor e carinho. Há clínicas especializadas com vários terapeutas e especialidades como fonoaudiologia, psicologia, terapia ocupacional, musicoterapia e fisioterapia. São profissionais que, como o médico, têm que gostar de atender crianças autistas. Há medicamentos que podem ajudar e algumas crianças melhoram com dietas e tratamentos naturais. Contudo, o mais importante é arregaçar as mangas e trabalhar, especialmente com tratamentos alternativos.

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