Saúde e Bem-Estar

New York Times, por Jane E. Brody

Perda auditiva não tratada aumenta risco de demência e depressão

New York Times, por Jane E. Brody
23/02/2019 12:00
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Perda auditiva não tratada aumenta risco de demência e depressão. Foto: Bigstock

Atualmente, 38,2 milhões de americanos a partir dos 12 anos apresentam perda auditiva, um problema que se torna cada vez mais comum e grave com o avançar da idade. Mais da metade das pessoas com 70 anos e mais de 80 por cento dos octogenários apresentam perda de audição de leve a moderada ou grave, conforme mostraram os testes realizados entre 2001 e 2010 pelo National Health and Nutrition Examination Survey (Programa Nacional de Pesquisa em Saúde e Nutrição).
Dois novos e abrangentes estudos demonstraram uma clara relação entre perda auditiva não tratada e maior risco de demência, depressão, quedas e até mesmo doenças cardiovasculares. As pesquisas ainda indicaram que, em um número significativo de pessoas, a perda auditiva não tratada corretamente pode ser a causa do problema de saúde associado.
Em um deles, que estudou 154.414 adultos acima de 50 anos com reclamações apresentadas na seguradora de saúde, os pesquisadores descobriram que o não tratamento da perda de audição elevou em 50% o risco do desenvolvimento de demência e em 40%  o de depressão em apenas cinco anos, em comparação com aqueles que têm audição normal. Uma análise dos dados minuciosos oferecidos por Nicholas S. Reed e seus colegas estabeleceu uma relação entre o não tratamento da perda auditiva, hospitalizações mais frequentes e mais longas, internações reincidentes e mais idas à emergência do hospital.

Em dez anos, os casos não tratados de perda auditiva foram responsáveis por 3,2 % de todos os casos de demência, 3,57 % das pessoas que se machucaram gravemente em uma queda e por 6,88 % de pacientes em tratamento da depressão. Os números podem parecer baixos, mas, considerando a regularidade dessas condições, elas afetam um grande número de pessoas, levando a grandes danos pessoais, financeiros e sociais.

O médico Frank R. Lin, diretor do Centro Cochlear de Saúde Pública e Audição da Faculdade Bloomberg de Saúde Pública da Universidade Johns Hopkins afirmou que aproximadamente 85 por cento das pessoas com problema auditivo não são tratadas e, conforme reportado pelos autores do estudo, em novembro, na revista “JAMA Otolaryngology Head and Neck Surgery”, considerando apenas os idosos, isso elevou os gastos com saúde em 46 por cento em um período de dez anos, em comparação aos custos provenientes daqueles com audição saudável. Uma das autoras, Jennifer A. Deal, epidemiologista e geriatra da Faculdade Bloomberg de Saúde Pública da Universidade Johns Hopkins, disse que apesar de “a perda auditiva não ser cara em si, a consequência em todo o resto é”.
Infelizmente, as pessoas tendem a esperar tempo demais para fazer os exames e receber o tratamento necessário, e,quanto mais esperam, mais difícil fica tratar a perda auditiva, explicou Lin, que completou dizendo que a perda auditiva relacionada à idade se desenvolve lentamente, fazendo com que as pessoas demorem a levá-la a sério. Ele deu duas excelentes dicas de quando é a hora de testar a audição: se familiares ou amigos próximos disserem que você deve, ou se você perceber que com frequência entende errado ou não compreende o que os outros estão dizendo.

Aparelho auditivo resolve?

Mas, mesmo após as pessoas realizarem exames e gastarem milhares de dólares para adquirir os aparelhos auditivos necessários, estes, normalmente, não saem da gaveta. Há quem reclame que a qualidade do som é ruim, com muita estática ou simplesmente irritante, e que os aparelhos aumentam todos os sons, tornando ainda mais difícil a audição em um ambiente barulhento. Os aparelhos não são produzidos da mesma forma, explica Lin, e mesmo os mais caros e apropriados podem demandar múltiplos ajustes.
Algumas pessoas desistem rápido demais, antes de conseguirem atingir os melhores resultados. “Expectativas irreais são uma grande parte desse problema. Não é a mesma coisa que colocar óculos e imediatamente enxergar de forma clara. A perda auditiva não é determinada tão facilmente quanto os distúrbios da visão. O cérebro precisa de tempo – pelo menos um ou dois meses – para se adaptar aos aparelhos auditivos, e, quanto mais cedo a condição for tratada, mais facilmente o cérebro vai se adaptar a eles”, expôs Lin.
Os novos estudos dão razão suficiente para que a perda auditiva seja levada a sério. Vamos considerar, por exemplo, sua ligação com a demência. Pessoas com dificuldade de escutar normalmente tornam-se socialmente isoladas e privadas dos estímulos que mantêm a função cognitiva do cérebro atuante. À medida que os incentivos diminuem, cai também a função cerebral.
O cérebro também é sobrecarregado quando é forçado a usar muito da sua capacidade para processar o som, pois ele não foi planejado para múltiplas tarefas.

“A perda auditiva não é uma questão de volume, mas sim de qualidade do som. Algumas partes das palavras desaparecem e a fala fica como um balbucio, uma mensagem confusa que o cérebro recebe e precisa trabalhar muito mais para decodificar”, esclareceu Deal.

Além disso, quando a informação não é compreendida corretamente, limita a memória. “Um sinal auditivo bom e claro é mais fácil de ser lembrado. O segredo da memória está em prestar atenção, e o cérebro não consegue focar se precisa trabalhar além da conta para decodificar o sinal”, continuou Deal.
Em relação às quedas, ela disse que os problemas auditivos normalmente andam lado a lado com as questões de equilíbrio. “Mesmo quando não percebemos, usamos nossos ouvidos para nos posicionarmos espacialmente”, explicou. Ademais, quando as pessoas não conseguem escutar bem, ficam menos atentas aos sons ao redor, podendo cair se forem surpreendidas por alguém ou alguma coisa que parece chegar silenciosamente, sem que percebam.
Deal esclareceu que ela e seus coautores ficaram surpresos ao descobrir uma conexão entre audição ruim e doenças cardiovasculares. “A doença vascular poderia ser comum aos dois grupos”, revelou, mas enfatizou que o isolamento social e o estresse resultantes da perda auditiva muito provavelmente contribuem para o quadro.
Boas notícias aguardam os residentes da cidade de Nova York, onde a poluição sonora lidera a lista de reclamações municipais. Até 2011, todos os mais de dez mil carros de polícia tiveram as sirenes trocadas por outras de frequência baixa, que são 10 decibéis mais silenciosas, e os carros dos bombeiros, agora, começaram a adotá-las também.
O próximo passo é conseguir que os 2,5 milhões de chamados anuais de ambulâncias sejam atendidos por carros com sirenes menos agudas. O Sistema de Saúde Mount Sinai está testando sirenes de dois tons que emitem o som “ee-aw” comumente escutado na Europa, e a Associação de Hospitais da Região Metropolitana de Nova York começou os testes para ambulâncias com sirenes de baixa frequência.
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