Saúde e Bem-Estar

Amanda Milléo

Tempo não é desculpa: saiba como deixar de ser sedentário em poucos passos

Amanda Milléo
15/10/2018 07:00
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As desculpas para adiar as mudanças de hábitos são muitas, mas também os incentivos a uma vida mais ativa (Foto: Bigstock)

A cada dois brasileiros, pelo menos um não se exercita o suficiente. Segundo estudo global da Organização Mundial da Saúde (OMS), embora a dificuldade em incorporar uma rotina de exercícios físicos não se restrinja ao Brasil, a média da insuficiência no mundo está longe dos péssimos índices brasileiros (47%), atingindo pouco mais de 1/4 da população (27,5%).
Por aqui, mais da metade das mulheres (53,3%) são mais sedentários do que fisicamente ativas, enquanto os homens que não se exercitam representam 40% da população nacional.
O estudo, divulgado no início de setembro, avalia que, se os dados continuarem assim, a meta de reduzir 10% do sedentarismo do mundo até 2025 não será cumprida.

Por que é tão difícil começar a fazer exercícios físicos?

Apesar de inaugurarem todos os meses novas academias na cidade, com aulas diferentes e agitadas, bem como programas visando uma mudança de hábitos e emagrecimento, deixar uma vida desregrada para trás não é tarefa simples — e nem sempre está relacionada apenas a falta de tempo ou preguiça.
Existem razões fisiológicas que, de fato, podem comprometer os ânimos e a persistência do indivíduo. Conforme elenca Salma Ali El Chab Parolin, médica endocrinologista, o hipotireoidismo, a síndrome de Cushing e até mesmo uma deficiência do hormônio do crescimento podem dificultar o início e a manutenção de uma vida fisicamente ativa.
“O hipotireoidismo deixa as pessoas metabolicamente mais lentas, com menos ânimo para iniciar uma atividade física. Mas, a partir do momento que a condição é tratada, a pessoa melhora e o desânimo não está mais relacionado à doença”, ressalta Parolin, que também é diretora da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia do Paraná (SBEM-PR) e professora de endocrinologia da PUCPR.
Falta de tempo é uma das desculpas mais comuns para evitar a prática dos exercícios físicos (Foto: Daniel Castellano / Gazeta do Povo / arquivo)
Falta de tempo é uma das desculpas mais comuns para evitar a prática dos exercícios físicos (Foto: Daniel Castellano / Gazeta do Povo / arquivo)
Confira cada uma das condições, sintomas e tratamentos:
Hipotireoidismo. Mais prevalente em mulheres na pós-menopausa, o hipotireoidismo se caracteriza pela redução na produção dos hormônios pela glândula tireoide. Dos sintomas mais comuns, fraqueza, cansaço, anemia e até mesmo depressão.
“No hipotireoidismo não é impossível começar um exercício e, quem consegue, pode reduzir alguns sintomas, como a depressão e a atividade inflamatória”, explica Parolin. A causa mais conhecida da condição é autoimune, mas quem faz a retirada da glândula cirurgicamente também pode desenvolver.
O tratamento envolve a reposição hormonal da tireoide, que deverá ser feito ao longo da vida. “A reposição só deve ser feita em pessoas que tenham a deficiência na produção do hormônio. Há muito uso errado desse hormônio, principalmente visando emagrecer. Hormônio não é para emagrecer e, se usado sem orientação médica, aumenta risco de insuficiência cardíaca, piora alterações de humor, é um perigo”, alerta a médica endocrinologista.
Síndrome de Cushing. O excesso de corticoides no organismo é uma das causas mais comuns do desenvolvimento da síndrome. Em muitos casos, está relacionado ao uso sem orientação médica do medicamento, voltado ao combate de inflamações e dores articulares.
A partir da síndrome, o indivíduo tende a desenvolver a sarcopenia, que é a fraqueza e perda crônica de massa muscular. Com isso, dificulta a adesão a uma atividade física.
 Deficiência do hormônio do crescimento. Da mesma forma como a síndrome de Cushing, pessoas com deficiência do hormônio do crescimento também tendem a desenvolver a sarcopenia, o que reduz a capacidade de atividade física.
A deficiência, embora mais comum em crianças por causas genéticas, pode ocorrer entre os adultos, geralmente em situações pós-cirúrgicas.
“Nos homens, a redução do hormônio testosterona, que eventualmente pode acontecer relacionado a um tumor hipofisário ou hipogonodismo, também levaria a uma sarcopenia. A condição, portanto, colabora na dificuldade em iniciar uma atividade física”, ressalta a endocrinologista Salma Parolin. 

Falta tempo: pare com essa desculpa

Todo mundo sabe que o tempo é restrito e escasso, mas acusar a falta dele para não incorporar uma atividade física não pode mais ser desculpa. Se o exercício físico ainda não está na agenda das atividades semanais, é porque ele não é uma prioridade na sua vida — ainda.
“Lidar com a gestão de prioridades é a chave para entender porque você está adiando aquela área da vida. E há vários fatores para isso: pode realmente não ser uma prioridade agora, e você precisa fazer escolhas. O importante é estar em paz com as suas escolhas, sem trazer a culpa”, ressalta Tayná Leite, coach e palestrante de mulheres.
O antídoto, segundo Tayná, é abraçar o protagonismo da própria vida. “Você se conhecer, entender quais são as suas prioridades, seus valores motivadores, o que você quer naquele momento e fazer escolhas conscientes é o caminho. E lembrar que toda escolha tem perdas e ganhos. É uma renúncia. Pensar no que vamos ganhar ou perder ajuda a minimizar a perda e a potencializar o ganho”, explica a coach.
Corrida é uma das modalidades mais acessíveis e que ganhou cada vez mais adeptos nos últimos anos (Foto: Albari Rosa / Gazeta do Povo / Arquivo)
Corrida é uma das modalidades mais acessíveis e que ganhou cada vez mais adeptos nos últimos anos (Foto: Albari Rosa / Gazeta do Povo / Arquivo)

A preguiça só pega no início, depois passa

Não caia no discurso de que um dia vai ficar tudo melhor. A escolha por adotar uma atividade física, como já disse o médico Drauzio Varela, é diária pois “o exercício físico vai contra a natureza humana“.
Em um artigo publicado em 2011,  e também no em seu livro “Correr: o exercício, a cidade, o desafio da maratona” (Companhia das Letras), o médico explica que o organismo humano (e de outros animais) moldou o nosso metabolismo a guardar toda energia acumulada em excesso, pensando em dias de vacas magras e necessidade de energia para fugas. Portanto:

“(…) se você é daquelas pessoas que espera a visita da disposição física para começar a fazer exercícios com regularidade, desista. Ela jamais virá. Disposição para sair da cama todos os dias, calçar o tênis e andar até o suor escorrer pelo rosto, nenhum mortal tem. Ou você encara a atividade física com disciplina militar, ou esqueça dela. Na base do quando der eu faço, nunca dará”, defende Varella. 

Tendo isso em mente, descubra quais são os seus gatilhos — tanto os que fazem com que você saia de casa para se exercitar, quanto aqueles que resistem às mudanças.
“Sair de casa, do conforto, e enfrentar o frio e chuva para ir à academia, só se a pessoa estiver muito determinada. Quanto mais souber dos gatilhos que a fazem ir e os que a fazem ficar, mais fácil será para manter a perseverança”, acredita Gabriel Dias, personal trainer eleito o personal do ano de 2017 pela WTTC (World Top Trainers Certification).
Quanto mais você fizer atividade física, mais claros ficarão os gatilhos. “Está chovendo ou está frio, mas naquele dia tem uma aula de spinning com um professor legal, em uma turma que está toda unida. A pessoa não vai pelo exercício, mas pelo ambiente, pelas pessoas e muito provavelmente os outros alunos também vão pensando nisso”, diz o personal.
Começar a prática de exercícios físicos uma vez na semana já é muito mais do que não fazer absolutamente nada<br>(Foto : Leticia Akermi / Gazeta do Povo / arquivo)
Começar a prática de exercícios físicos uma vez na semana já é muito mais do que não fazer absolutamente nada<br>(Foto : Leticia Akermi / Gazeta do Povo / arquivo)
Metas claras e reais, embora seja a dica clássica da mudança de hábitos, nem sempre é seguida de forma correta. Pensar em objetivos alcançáveis não está apenas em imaginar que até o fim do ano você irá perder uma quantidade tal de peso, mas saber que nas primeiras semanas o exercício físico se resumirá a uma caminhada de meia hora em um parque perto de casa, uma vez na semana.

“A pessoa faz nada e começa a se exercitar 4, 5 vezes na semana. A probabilidade de ela reduzir é muito alta. Começa com uma vez na semana, que será o dobro do que fazia antes. Uma vez que essa prática entrar na rotina, aumenta para duas e assim vai”, reforça Dias.

O personal alerta ainda que, para quem não está acostumado a uma mudança na rotina, qualquer adaptação exige esforço mental e perseverança, desde lembrar de pegar a roupa da academia e levá-la para o trabalho a até pensar em como uma ida ao parque poderia se encaixar na agenda da semana. Aí entra novamente a importância de escolher as prioridades.
“O cérebro precisa entender que ele é um cumpridor de tarefas. Quanto mais você fizer atividade física, por mais tempo, mais fácil ele entenderá que é sua função cumprir aquela atividade. Quanto mais você boicotar, mais ele vai entender que é um boicotador e vai te levar a isso”, frisa a coach Tayná Leite.
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