Saúde e Bem-Estar

Mariana Ceccon, especial para a Gazeta do Povo

Tomar caldo de ossos faz bem para a saúde?

Mariana Ceccon, especial para a Gazeta do Povo
16/05/2019 08:00
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Caldo de ossos é popular nas ruas de Nova York, nos Estados Unidos. Foto: Bigstock

Muita água, um pouco de vinagre e uma boa coleção de ossos, cartilagens, e tendões de qualquer animal. Essa é a receita básica para produzir em casa o caldo de osso, uma receita que se popularizou, principalmente nos Estados Unidos, para conseguir uma dose extra de minerais, aminoácidos e colágeno.
Originário das dietas paleolíticas, o caldo promete, entre inúmeros benefícios, reforçar as articulações e prevenir dores e inflamações pelo corpo, inclusive no sistema digestivo e imunológico. A dose extra de colágeno, além de benéfica para a saúde, também seria responsável por dar um reforço na ala estética, trabalhando em unhas, cabelo e pele.

Nas ruas de Nova York, meio litro de caldo de ossos, o bone broth, sai por aproximadamente R$ 40. Os produtores prometem uma concentração de até 20 gramas de proteína num desses copos, que podem ser produzidos com ossos de galinha, vaca, peru e um combinado de algas marinhas e cogumelos. Além das melhorias nas articulações, os norte-americanos bebem o caldo também esperando perder peso, melhorar a saúde do fígado, a disposição e a recuperação pós-cirúrgica.

De olho nos artigos científicos norte-americanos sobre o assunto, o empresário Guilherme Torres, de 28 anos é um entusiasta do caldo. Ele é um dos fundadores do blog Senhor Tanquinho, especializado em dar dicas sobre alimentação saudável. Lá ele relata as mudanças sentidas a partir do consumo do líquido.
“Tomo o caldo há cerca de quatro anos, faço em casa com as carnes que compro para a semana, como asinhas de frango e costelinha de porco. Congelo os ossos até obter uma boa quantidade e fervo com temperos e vinagre”, contou.
Para o empresário, a maior diferença sentida aconteceu no mês passado, quando deslocou um ombro. “Já tinha tido outros dois deslocamentos, e dessa vez, como eu estava consumindo bastante o caldo, eu senti que tive uma recuperação mais rápida. Em menos de duas semanas já estava fazendo todas as atividades físicas, sem problemas”, contou.
Guilherme também diz que utiliza o caldo em períodos de jejum, como forma de repor os eletrólitos. “Não temos nenhum estudo que compare diretamente a saúde de quem consome ou não, mas temos o embasamento científico dos nutrientes e sais minerais disponíveis nele, além do contexto evolutivo”, fala.
O nutrólogo Wilson Rondó diz que os “brodos” de ossos, como costuma chamar, fazem parte de um protocolo de emagrecimento e rejuvenescimento, que ele aplica não só a seus pacientes como também para si mesmo. “O brodo é fundamental e um grande recurso usado por nossos antepassados pela concentração altíssima de colágeno. Ele melhora o corpo como um todo e até a mente”, declarou.

Para o médico, fazer o brodo caseiro é uma garantia de obter colágeno de qualidade. “Existe muito marketing e as cápsulas suplementares, de colágeno hidrolisado, você pode ter uma absorção de 9% ou 99%. Depende muito da qualidade da manipulação”, comenta. “Lógico que dá mais trabalho fazer um caldo caseiro, mas você tem o controle do processo”.

Rondó ainda afirma que associado a técnicas de jejum, o caldo pode desintoxicar o organismo e prevenir doenças autoimunes. “O Brasil, que tem um vasto rebanho de pastagens, deveria estar exportando o caldo de ossos. Para mim é uma tendência, que está no exterior, mas que logo chegará aqui”, pontuou.
Bone Broth Bouillon in Metal Pan. Organic Food.
Bone Broth Bouillon in Metal Pan. Organic Food.
O conselho é que o caldo seja preparado com ossos de animais que não sejam alimentados com rações, na proporção de dois litros de água para até dois quilos de osso. “O desafio é encontrar, nos grandes centros, um açougueiro de confiança, pois é ele é o profissional que vai te assegurar a procedência. Acredito que por isso o caldo ainda não desencantou totalmente no Brasil”.
O nutrólogo também indica que dependendo dos objetivos do paciente, como perda de peso, estética ou nutrição, a frequência do uso do brodo pode variar de duas a três vezes no mês, até quatro porções diárias.

Para associação, caldo é efeito placebo

Do outro lado da arena, o vice-presidente da Associação Brasileira de Nutrologia (Abran), José Alves Lara Neto diz que as melhorias do “caldo milagroso” não passam de efeito placebo. O nutrólogo defende que é impossível chegar a concentrações tão altas de proteína apenas com os ossos.

“Os primeiros estudos feitos com o caldo caseiro, que datam de 1934, já mostravam que a concentração de proteína em um litro é de aproximadamente seis gramas. Isso é menos do que um ovo”, pontuou o especialista.

Sobre a possível concentração benéfica de colágeno no caldo, o nutrólogo é categórico. “De fato existe a concentração, mas nosso corpo não faz reservatório dessa substância, então nada adianta injetar uma quantidade maior do que conseguimos sintetizar”, pontuou.
Para Lara Neto, também é necessário que o corpo esteja com as quantidades equilibradas de vitaminas A e C, selênio, silício, enxofre e zinco, para podermos absorver o colágeno necessário, da forma correta.

O vice-presidente da Abran acredita que investir em uma alimentação equilibrada, usando outras fontes para minerais como sementes de abóbora, brócolis, leite e a própria carne, garantem quantidades maiores dos mesmos nutrientes.

“Eu sou a favor do caldo, sociologicamente falando. Quando é um ato de reunir a família, servir alguém e fazer uma experiência gastronômica, pensando no sabor que é agradável. Agora, nutricionalmente falando, existe uma exaltação exagerada. O caldo é muito pobre e o gasto operacional e energético que temos para produzi-lo é muito alto”, comentou.

O médico faz alusão ao processo de derretimento das cartilagens que, sem uma panela de pressão, pode demorar até 48 horas. “Não faz mal consumir o caldo, exceto o gasto de gás”, brinca. “Mas a única vantagem que vejo é no fato de ele ser um alimento de baixa caloria e que pode ser um complemento para um lanche ou um prato, tentando apaziguar a fome por ansiedade. Até aí, apoio alguém que queria incluir na dieta, mas mais como forma de mudar um comportamento de consumo por impulso”, pontuou.
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