Saúde e Bem-Estar

Amanda Milléo

Estagnar miopia é possível combinando colírio e lentes, diz estudo

Amanda Milléo
26/10/2019 08:00
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O uso de colírio com atropina é uma das estratégias para segurar o avanço da miopia. Foto: Bigstock.

O avanço da miopia pode ser parado na infância? Segundo uma pesquisa recente divulgada na 123ª Reunião Anual da Academia Americana de Oftalmologia, uma combinação de dois métodos pode ajudar a retardar a progressão da condição.
Um novo estudo de dois anos, conduzido por Nozomi Kinoshita e colegas da Universidade Médica de Jichi, no Japão, mostra que o tratamento de crianças com lentes de contato especiais e colírio com atropina foi de 28% (crianças de maior miopia) a 38% mais eficaz na redução da miopia.

O uso de lentes especiais (ortoqueratologia) envolve o uso noturno de lentes permeáveis a gases rígidos, para remodelar a córnea, a parte frontal clara do olho. Apesar de ainda não se saber como essas lentes retardam a progressão, acredita-se que elas remodelam a córnea, alterando o foco periférico do olho.

Com relação ao uso do colírio, a estagnação da progressão da miopia pode ter início com o tratamento quando ela aparece por volta dos 5 ou 6 anos de idade. O uso da atropina, aplicada em forma de colírio, colabora com o retardo no avanço da condição.

“A atropina tem a função de dilatar a pupila e, nesse momento, atua nas células da periferia da retina, que é o tecido posterior e interno do olho. Ao atuar nessas células, a atropina aumenta o enrijecimento da esclera [parte branca do olho]. Com isso, o olho, que nos míopes têm um diâmetro maior, não cresce tanto, retardando a progressão da miopia”, explica Cristiano Toesca Espinhosa, médico oftalmologista.

Indicação precisa

Embora pareça simples, o tratamento com o colírio não é indicado a qualquer criança. Segundo Wallace Chamon, médico oftalmologista membro do Conselho Brasileiro de Oftalmologia, a atropina é voltada às crianças cujo avanço da miopia é significativo, o que tende a ocorrer entre aquelas que se tornam míopes muito cedo.
A miopia é um problema ocular que torna o olho maior do que deveria, deixando a visão distorcida. Pessoas míopes têm dificuldade em enxergar objetos distantes, embora a visão de perto permaneça normal. Dos tratamentos mais comuns, óculos e lentes de contato dividem espaço com as cirurgias refrativas — que não são indicadas a todo mundo.

“Não é um tratamento milagroso e nem deve ser aplicado a todo mundo. Cabe a criança que teve uma progressão grande de grau, como entre 3 a 8 na miopia. Mas não em uma criança cuja miopia não avançou muito”, explica Chamon, que também é professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e da Universidade de Illinois de Chicago, nos Estados Unidos.

A estimativa do resultado do uso da atropina é que a miopia tenha a progressão reduzida em quase 50%. Ou seja, uma criança diagnosticada com 1 grau de miopia, caso seguisse na tendência de ganhar um grau a mais a cada ano, chegaria a sete graus quando atingisse a adolescência. Com o uso da atropina, porém, o grau ficaria em torno de 3,5.
“É uma diferença muito grande para a criança, mas a atropina não impede a miopia, apenas atrasa a evolução dela”, reforça Espinhosa.

Reações

O uso da atropina, quando indicado, é feito de forma contínua, diariamente, durante anos. Dos efeitos colaterais mais comuns, o paciente pode sentir efeitos de fotofobia — visto que a substância dilata a pupila — e desconforto.

Cada vez mais míopes

Um levantamento australiano de 2016, publicado na revista científica Ophthalmology, analisou 145 estudos sobre miopia no mundo, que englobavam um total de 2,1 milhões de participantes. Com base nos dados, os pesquisadores estimaram que, atualmente, 22,9% da população mundial seja miopia. Até 2050, porém, a tendência é que os míopes representem 49,5% do mundo – algo em torno de 4,7 bilhões de pessoas.
Além de ser uma condição genética — pais e avós míopes indicam que a condição corre pela família e pode atingir os filhos e netos —, especialistas acreditam que o uso contínuo de smartphones, tablets e outros dispositivos eletrônicos têm contribuído para o avanço da miopia no mundo.
“A falta de exposição a ambientes abertos aumenta a chance da miopia progredir. Como nas cidades essa exposição é menor que no campo, vemos mais míopes aqui. Alguns estudos associam a radiação solar como fator protetivo da visão, e a falta dela também afetaria a miopia, mas ainda é preciso ser comprovado”, explica Wallace Chamon, médico oftalmologista.
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