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Problemas da reforma tributária: aumento de impostos, e concentração de poder
| Foto: lkzmiranda/Pixabay

“Reforma” é uma daquelas palavras que tem uma conotação positiva. A palavra é perigosa porque não necessariamente aquilo que será reformado irá melhorar; não raro, até pode piorar. Um exemplo dessa possibilidade é a reforma tributária.

É verdade que o sistema tributário brasileiro é péssimo, ineficiente e cheio de imperfeições. É o pior dos mundos: complexo e com alta carga tributária. As empresas perdem tempo e dinheiro com administração tributária, em vez de canalizarem esses recursos para o core business do negócio.

A ineficiência do nosso sistema tributário é um dos fatores que nos condena ao atraso

Sem dúvida, o sistema precisa ser reformado. No entanto, não para uma reforma que piore ainda mais a situação fiscal brasileira, como o projeto proposto pelo Congresso e apoiado pelo Governo Federal.

A reforma tributária está atualmente no Senado em fase de regulamentação. Por enquanto, o projeto uniu o ICMS e o ISS em um IVA estadual; e o IPI, Pis e Cofins em um IVA federal. Essa junção, aparentemente benéfica, traz alguns problemas.

O primeiro é o provável aumento da carga tributária, principalmente para o setor de serviços (saúde, educação, transporte, etc.) O exemplo abaixo mostra a tributação de como é agora, para como vai ficar com a alíquota do IVA de 26,5%, após a implementação da reforma tributária.

Antes da Reforma Tributária - como é hoje a tributação
Antes da Reforma Tributária - como é hoje a tributação | Elaborado pelo autor
Depois da Reforma Tributária - empresa de serviços que praticamente não compra mercadorias (não consegue gerar crédito tributário)
Depois da Reforma Tributária - empresa de serviços que praticamente não compra mercadorias (não consegue gerar crédito tributário) | Elaborado pelo autor

Com a alíquota de 26,5%, têm setores de serviço que terão uma carga tributária de 37,5%. O IVA de 26,5% já nos coloca como o campeão do mundo neste tipo de tributo. Mas o pesadelo pode ficar ainda pior, pois uma série de setores conseguiram suas benesses tributárias. Na prática, terão alíquotas diferenciadas ou isenção de impostos, como a carne.

O problema é que esta isenção não é de graça, e terá que ser compensada com mais impostos em outros setores. A população pagará menos na picanha, mas gastará mais com médico. 

No mundo real, como o orçamento do governo é limitado, cada isenção é paga com mais cobrança de impostos em outros setores. É provável que o IVA de 26,5% fique ainda maior, pois a conta não fecha. No final, é o consumidor que pagará essa conta: economizou na carne, mas vai desembolsar mais com saúde.

Além disso, com benesses tributárias para uns setores e elevação da alíquota para outros, como o “imposto do pecado”, o governo interfere na livre escolha dos indivíduos, ao criar distorções de preços relativos entre os bens e serviços. Os preços artificialmente baixos acabam interferindo nas escolhas normais e racionais dos consumidores se não houvesse o benefício. Acabam priorizando aquilo que é mais barato, e não aquilo que é necessário ou, de fato, desejado. Nesse sentido, a reforma é altamente elitista e intervencionista.

Outro problema é que o “imposto do pecado” trará aumento de custo de produção, e, portanto, de preço final para uma série de produtos. Nem vou entrar aqui na obviedade da contradição de carros elétricos serem taxados, enquanto caminhões, não. Vamos falar de algo pouco explorado – o “imposto do pecado” para produção de minério de ferro e combustíveis fósseis. Muita gente associa a queima de combustíveis fósseis apenas aos veículos automotores. Entretanto, no mundo real, a questão é muito mais complexa e vai além dos motores à combustão. 

A produção dos quatro materiais pilares da civilização moderna - cimento, aço, plástico e amônia - são altamente dependentes de combustíveis fósseis. Para fazer cimento, é necessário queima de combustíveis fósseis em fornos de alta temperatura. O aço, idem, com a fundição do minério de ferro em altas temperaturas. Plástico é petróleo. E a amônia, base para fertilizantes, é produzida pelo gás natural. 

Todos esses processos não são passíveis de eletrificação, e são exclusivamente dependentes de combustíveis fósseis, sem possibilidade de substituição. Sem entrar no mérito da questão ambiental, maior tributação nesses itens significa elevação do preço da mercadoria de todos esses bens, e perda de bem-estar econômico para toda a sociedade. 

Será que a população defenderá a sustentabilidade ambiental quanto ocorrer aumento do custo de vida? No papel, no mundo idealizado, é tudo muito bonito; na prática, a realidade é cheia de trade-offs, dilemas, consequências e escolhas conflitantes.   

Por fim, o último grave problema da reforma tributária é que ela cria um Comitê Central arrecadador de todos os impostos, concedendo mais poder econômico para o Governo Federal. 

Sabemos que o Brasil não é uma federação de verdade, de fato. A autonomia dos estados e municípios é bem limitada comparada à dos EUA. Além disso, há uma série de distorções. Há estados que são mais doadores de recursos do que tomadores para União. Hoje, alguns municípios produzem muito mais para sustentarem a ineficiência de outros. Com a reforma tributária, tal situação tende a se agravar com as distorções na partilha dos recursos. 

Em suma, a reforma tributária elevará a carga tributária, o preço das mercadorias, irá concentrar mais poder econômico no Governo Federal, beneficiando apenas os setores daqueles amigos do rei, como a carne. 

Será que essa reforma realmente vale a pena? 

Conteúdo editado por:Aline Menezes
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