Os gols que não existiram – um “causo” do futebol de antigamente
Esta história me foi contada por um ex-dirigente do Bloco Morgenau em minha época de estudante, quando fazia o trabalho de conclusão. Ela até virou uma encenação e mostra como mudou o futebol local nos últimos 50 ou 60 anos.
Em primeiro lugar, o Bloco Morgenau foi uma equipe, surgida de uma dissidência da Sociedade Operária Beneficente Vila Morgenau. O nome é francês, mas os então dois clubes tiveram entre seus fundadores uma maioria de descendentes de italianos. Muitos poderão se lembrar do famoso Cine Morgenau e faz sentido, pois o estabelecimento, muitos anos antes de virar um cinema de “filmes adultos”, nasceu ali na região do Cristo Rei, a mesma do time Tricolor, que tinha um padrão de cores muito parecido com o São Paulo.
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O Bloco começou no futebol amador e marcou época. Resolvendo topar o profissionalismo, não deu muito certo, até porque não havia um profissionalismo de fato no clube, com jogadores alternando com outros empregos em vários casos. Virou uma espécie de primo pobre da capital junto com equipes como o Primavera, que está envolvido na história contada.
O campo do Bloco Morgenau, o estádio Moysés Lupion, ficava na Avenida Senador Souza Naves, 1225. O campo era acanhado e por isso não foi liberado para os jogos do Campeonato Paranaense na época. O time mandava preferencialmente seus jogos na Vila Capanema, no bairro vizinho. Um dirigente do clube era da Companhia de Força e Luz, atual Copel, e conseguiu um sistema de iluminação que permitia ao menos o clube treinar no começo da noite, o que era útil principalmente no inverno curitibano e seus dias curtos.
Num desses dias, numa data incerta no final dos anos 50 (quando Renatinho e Tiquinho, dois dois maiores expoentes do Bloco Morgenau jogavam juntos), um jogo-treino contra os coirmãos do Primavera foi marcado no começo da noite. O Tricolor do Taboão saiu na frente do Tricolor do Cristo Rei e então uma neblina caiu forte sobre as altas terras do bairro. O jogo seguiu.
Eis que alguém chamou Tiquinho e Renatinho e deu a dica. “Ninguém vê nada aqui. Chutem e comemorem. O juiz vai cair nessa”. O motivo era simples: o campo, acanhado, tinha uma cerca de madeira na linha de fundo. Sempre que a bola ia para as redes dava para ouvir o barulho dela nas tábuas.
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Dito e feito. Os rápidos Renatinho e Tiquinho tabelavam, chutavam e comemoravam. O resultado foi revertido. Nem os jogadores do Primavera sabiam se a bola entrou ou não. E assim o Bloco Morgenau venceu o encontro amistoso. Depois do final da partida. Os autores da proeza revelaram a artimanha. O pessoal do Primavera até ficaram bravos, mas no fim, o churrasco de confraternização depois do jogo prevaleceu e a história, improvável nos dias de hoje, ficou para ser contada.
Com o fim do futebol profissional no clube, o Bloco Morgenau foi reincorporado ao seu antigo berço, dando origem à Sociedade Morgenau atual. O Moysés Lupion virou a Sede Esportiva do clube, que teve treinando em sua escolinha jogadores como Diego Tardelli, Juninho (zagueiro, ex-Coritiba) e Pedro Oldoni. O Primavera é hoje um clube social e a sede do Taboão foi vendida para a compra de uma sede em Almirante Tamandaré.
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