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foucault pandemia
Retrato pintado de Michel Foucault.| Foto: Thierry Ehrmann/ Reprodução

Uma das incontáveis confusões ideológicas que a pandemia trouxe foi a dos foucaultianos pró-passaporte vacinal e indústria farmacêutica. Foucault não era o filósofo paranoico que via os hospitais como instituições análogas aos presídios, feitos para vigiar e punir? Aliás, Foucault não era o patrono dos relativistas epistêmicos, que viviam chamando de “discurso” tudo o que os cientistas dizem, como se não existisse uma realidade objetiva? Pois bem: hoje esse povo todo está clamando por passaporte vacinal e jurando de pés juntos que acredita na Ciência, personificada pelo Dr. Fauci, alinhada com o filantropo Bill Gates.

Enquanto isso, eu, que sempre torci o nariz para esse pessoal, comecei a nutrir um profundo ceticismo quanto ao que diz um sem-número de “especialistas”, ora tirados da cartola da imprensa (como Luana The Lioness), ora ocultos sob as profundezas da burocracia (como os técnicos da Anvisa que fazem questão do anonimato). Burocrata inventa é coisa; quando cientista e burocrata se fundem numa pessoa só, convém desconfiar, pois é poder demais. Quando essa figura praticamente ganha poder de polícia (vide São Paulo prendendo pedestre) e até determina quem pode tirar documentos ou não (já que o Nordeste implementou passaporte vacinal para esses serviços), convém rebelar-se. Convém, portanto, dar uma olhadela no que diz o filósofo paranoico que tanto subsidiou relativistas malucos. Será que ele não tem uma dose de razão?

Foucault, gay?

Foucault tem fases e foi ficando maluco com o tempo, até praticamente se suicidar por meio de orgias sodomitas em plena epidemia de Aids. Pegou a doença e morreu aos 57 anos.

Antes que reclamem comigo por falar na prática da sodomia, em vez da identidade gay, faço isso tendo em mente justo Foucault, que fazia da identidade homossexual uma invenção moderna. É muito estranho os gays identitários gostarem tanto de Foucault, já que para ele a identidade gay não é nada de definido, quanto menos de inato. Luiz Mott é coerente com seu identitarismo, e por justamente isso escreve contra Foucault, empenhando-se em mostrar que sempre houve ao longo da História uma subcultura gay e portanto uma identidade gay. Homens que sentem atração sexual por homens, mesmo com mulheres à disposição, estariam presentes em qualquer cultura humana, de modo que a identidade gay é um fato da natureza subjacente à cultura. Para Mott, se você, pacato leitor heterossexual, nascesse na Grécia Antiga ou na Arábia Saudita, seria hetero de qualquer jeito.

Foucaultianos da velha guarda, por outro lado, prefeririam enfatizar o amor dos espartanos como prova de que a sodomia é um dado cultural desatrelado de uma identidade fixa. Se o pacato leitor hetero nascesse em Esparta, não teria conversa de biologia, de tendências inatas nem nada: iria integrar a cultura espartana e, portanto, à sodomia. E essa adesão à sodomia não teria nada a ver com desmunhecar nem abrir salão de beleza; o pacato leitor seria um guerreiro com sangue nos olhos, pronto para comer o fígado dos inimigos.

E aí, qual vai ser? Como diz Douglas Murray, as origens da homossexualidade são um mistério. Se fosse 100% inata, como pretendem os identitários, todos os gêmeos univitelinos teriam a mesma orientação sexual – o que não é o caso. Por outro lado (ao menos da última vez em que Eli Vieira escreveu sobre o assunto), os gêmeos univitelinos tendem a ter a mesma orientação sexual e parece haver genes influenciando na orientação sexual, ainda que não haja uma determinação.

É provável que, como quase tudo na humanidade, a sexualidade tenha algo de imponderável, em meio a influências naturais e culturais. Isso explicaria por que um culturalista (como Foucault) consegue reunir evidências de que a homossexualidade é um dado cultural e por que um inatista (como Mott) conseguiria reunir evidências através de culturas diferentes de que a homossexualidade é um dado da natureza.

Por isso gosto da ideia de que os autores podem ter uma dose de razão, e portanto vale ouvi-los, por mais que detestemos os seus seguidores. É uma imensa bobagem esperar que a razão esteja toda concentrada num único grupo político.

Pureza política

Também não adianta torcer o nariz para todos esses pederastas e dizer que seu pensamento não tem nada a ver com o deles. Se você acha que homossexualidade é uma escolha de conteúdo político e que essa crença é essencial a um conservador, sinto informar que esta crença faz parte do pacote do militante pós-moderno médio. Para o lacrador, a sexualidade é política; portanto, é arbitrária. O lesbianismo político, que foi moda lá pelos anos 70, mandava que as mulheres, independentemente de suas inclinações, só se relacionassem com mulheres para combater o patriarcado. Nos dias de hoje, o militante gay médio racionaliza o sexo entre homens dizendo que é um jeito de eles terem prazer sem produzir mão de obra para o capital. De minha parte, acho ridículo. É muito mais razoável dizer que eles fazem porque acham gostoso e inventam uma desculpa política depois. Ora, tem gay de tudo quanto é posição política. Por outro lado, casar com uma mulher e ter filhos não faz de Freixo, de Boulos ou de Haddad conservadores. São caras normais em sua esfera privada, devem achar gostoso sexo com mulheres e nunca devem ter dito “vou perpetuar as instituições familiares e a espécie humana casando-me com uma só fêmea da espécie e reproduzindo-me com ela”. É claro que podemos apontar incoerência entre discurso e conduta para acusar a hipocrisia, seja no caso de santarrões devassos ou no dos caretas críticos do patriarcado cisnormativo. Mas explicar a conduta são outros quinhentos. Não creio que um mau padre precise de motivos políticos para fazer sexo com beatas, nem que um psolista precise de motivos políticos para ter uma esposa em casa passando os bifinhos.

É estranho e irrazoável misturar orientação política com sexualidade. É presumir que as pessoas têm muito mais deliberação em suas vidas do que a realidade. Não há espaço para a espontaneidade, para o acaso.

Qual livro de Foucault ler?

O livro dele que escolhi para ler foi A História da Loucura. É um dos primeiros livros, feito antes de Foucault endoidar. E de fato é pertinente para entender a maluquice das pessoas no trato com a pandemia.

Como diz o título, o objeto do livro é a loucura. Olhando para a criatura que taca pedra nos outros, nós não temos problemas em dizer que a loucura é um dado objetivo da natureza. Temos problemas é com o foucaultiano antimanicomial que abraça o doido e diz que ele tem de estar na rua, feliz, tacando pedra nos outros.

Mas, porém, contudo, todavia, qualquer um de nós, pensando bem, há de achar estranho o fato de todo mundo hoje poder ter um problema psiquiátrico para chamar de seu. Basta entrar num consultório que se consegue um diagnóstico e uma receita para remedinho. Apenas isso já basta para desconfiar que há muito de cultural naquilo que presumimos ser de ordem natural, ou seja, a loucura. E o estudo de Foucault foca justamente no que há de cultural na percepção da loucura.

Depois de ter quase pedido desculpas por falar de Foucault, termino este texto por aqui. Na próxima fica A História da Loucura.

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