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Flordelis
| Foto: Reprodução/Instagram-Flordelis

“Meu amor, meu Nem, quanto mais o tempo passa, mais sinto a sua falta. Ainda é difícil acreditar que você não vai mais voltar. Não é justo ficar sem você, viver sem você. Fazíamos tudo juntos e agora me sinto sem rumo, tendo que aprender a me acostumar a fazer as coisas sem você.” Flordelis, no Facebook e Instagram, 16/07/2020.

Esse é um trecho da mensagem que a deputada federal e cantora gospel Fordelis (PSD) deixou em suas redes sociais no dia 16 de julho passado, um ano e um mês após o assassinado brutal de seu marido, pastor Anderson do Carmo, na garagem da casa da própria família.

A tragédia envolvendo Flordelis e Anderson tem todos os ingredientes de uma série de horror, paixão, amor e ódio para ser exibida por meio dos serviços de streaming, como Netflix, Amazon Prime, Globoplay, Youtube e outros).

A morte de Anderson, segundo apontam investigações que vieram a público nos últimos dias, foi o desfecho de uma trama em que os principais personagens são familiares do pastor. Traições, tentativa de envenenamento, paixões religiosas,brigas por dinheiro, dissimulações e, finalmente, o assassinato fazem parte desse enredo que tem como uma de suas principais personagens Flordelis, apontada pelos investigadores como responsável por arquitetar a morte do marido e fazer com que outros integrantes da família cumprissem a empreitada.

A defesa da deputada-cantora diz que não há elementos para sustentar a denúncia. “Temos aqui o desfecho da segunda fase da investigação, em que a autoridade policial apontou que a deputada Flordelis seria a mandante deste crime. Ao ver da defesa, não há elementos, mínimos que fossem, para ela receber esse tratamento de ser indiciada, denunciada, como mandante desse terrível crime”, declarou à imprensa o Anderson Rollemberg logo após a divulgação de dados da investigação

A produção da série, que estaria em estudo por algumas empresas, segundo informações extraoficiais, deverá ser bem diferente do filme Flordelis – Basta uma palavra para mudar, produzido em 2009. O longa-metragem que retrata a vida da deputada conta com um elenco de grandes estrelas da dramaturgia brasileira, como Bruna Marquezine, Cauã Reymond, Reynaldo Gianechinni, Alinne Moraes, Letícia Spiller, Deborah Secco, Fernanda Lima, Marcello Antony, Rodrigo Hilbert e Letícia Sabatella.

Longe da realidade revelada pelas investigações sobre o assassinato de Anderson, o filme de 2009 mostra Flordelis como uma mãe dedicada ao trabalho humanitário para socorrer e afastar crianças e adolescentes das drogas e do crime. Retrata ainda uma mãe amorosa, bondosa e pronta para dar tudo de si aos que necessitam de ajuda.

Onze anos depois da produção, o editor de moda Marco Antônio Ferraz, autor do filme sobre Flordelis, se diz arrependido. “Me arrependo. Se fosse hoje, jamais teria feito esse filme. Não sou cineasta. Sou um contador de histórias e o que contei foi uma mentira diante dos fatos que conhecemos agora (...). Estou dilacerado, me sinto enganado. É como se não pudesse confiar em ninguém”, declarou Ferraz em entrevista ao portal UOL nesta quinta-feira (25).

Caso as investigações venham a ser confirmadas judicialmente, a série – como arte – poderá mesclar ficção em suas cenas, mas necessariamente deverá mostrar não a história de pessoas generosas, bondosas e dedicadas ao bem – como foi feito no filme de 2009 –, mas sim personalidades sem escrúpulo, decididas a praticar atos de horror e violência, muitas delas escondidas sob o manto da falsa religiosidade e de práticas humanitárias.

Uma das cenas que certamente causaria grande impacto seria baseada nos relatos de uma testemunha sobre as tentativas de envenenamento de Anderson. Aos investigadores, essa testemunha relatou que o veneno era colocado nos alimentos oferecidos à vítima. O pastor chegou a ser internado pelo menos seis vezes. Em um dos internamentos, após a eleição de Flordelis para a Câmara dos Deputados, em 2018, ele apresentava quadro clínico de vômitos e diarreia.

Outra cena com potencial de chocar até pessoas de menor sensibilidade seria a das tentativas de assassinar a vítima forjando um assalto. Antes do assassinato, teriam ocorrido duas tentativas. Em uma delas, Anderson foi comprar um carro em uma loja no Rio. O plano seria matá-lo no caminho de volta para casa, em Niterói. Depois, na segunda vez, um pistoleiro teria sido contratado pela família, segundo as investigações, mas não chegaria ao fim da empreitada criminosa.

Flordelis na Câmara dos Deputados
Flordelis discursa na Câmara dos Deputados.| Michel Jesus/Câmara dos Deputados

As cenas de traição também certamente não faltarão. A mãe de Anderson, Maria Edna do Carmo, contou, em depoimento à Polícia Civil, que havia boatos de que seu filho estava tendo um caso com Simone dos Santos, uma das filhas biológicas de Flordelis, fruto de um relacionamento anterior da deputada.

Flordelis, agora apontada pela Polícia Civil como mandante da morte do marido e denunciada à Justiça por cinco crimes, era até então considerada por muitas pessoas exemplo de cidadã. Eleita deputada federal, tinha como uma de suas principais bandeiras a desburocratização da adoção no Brasil e o auxílio a crianças desamparadas.

A deputada-cantora e líder religiosa, que apresentava em seu currículo ações de solidariedade, bondade e caridade, ficou conhecida por afirmar ser mãe de 55 filhos, muitos deles afetivos, sem que tenham sido formalmente adotados.

A história começou há 30 anos, quando ela vivia na Favela do Jacarezinho, onde nasceu, na Zona Norte do Rio. Nessa época ela começou a acolher crianças e adolescentes em situação de risco.

Foi na favela que o romance com Anderson começou. Ela estava então com 30 anos e ele, que também morava na comunidade, apenas 14. Flordelis já havia sido casada, tinha filhos biológicos e, naquele momento, estava recém-separada do primeiro marido.

A história é comprida, com um roteiro de pregações evangélicas, gravações de música gospel, fugas das fiscalizações da Vara da Infância e Juventude, fundação de igrejas, rixas por dinheiro, disputa política e, por fim, uma tragédia familiar com um crime bárbaro.

O questionamento que o autor da série a ser produzida deveria deixar no ar é o que leva seres humanos que construíram histórias aparentemente virtuosas a cair em desgraça. E aí, talvez, caberia a versão religiosa da ‘força do diabo’. Em ficção cabe, sem nenhum prejuízo à obra, o lado diabólico dos humanos. Mesmo sabendo que o ‘diabo’ não serve e não pode servir para inocentar humanos de crimes.

"Se o pecado vem nos condenar,

Jesus morreu na cruz para nos libertar"

Esse verso compõe um dos dos vídeos gospel de sucesso da deputada-cantora Flordelis. O pecado e o perdão, certamente, não podem significar licença de impunidade para atos que venham a ser comprovadamente criminosos.

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