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O legado nefasto do “politicamente incorreto”
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O discurso "politicamente incorreto" busca desvalidar instituições democráticas e educacionais, além de apostar no negacionismo do conhecimento científico e dos fatos.

O termo ganhou popularidade no início deste século em contraposição ao ‘politicamente correto’, conceito esse geralmente usado para descrever expressões, políticas ou ações que evitam ofender ou discriminar pessoas, especialmente por raça, gênero, orientação sexual ou condição sócio-econômica.

Os defensores do politicamente incorreto justificam suas ações como forma de combater o que classificam de ‘marxismo cultural’, ‘pensamento único’ e ‘patrulhamento ideológico’, comumente atribuídos aos adeptos do politicamente correto.

“O feminismo de vítima, o movimento de direitos homossexuais, as estatísticas inventadas, a história reescrita, as mentiras, as demandas, todo o resto – de onde vem? Pela primeira vez em nossa história, americanos tem que ter medo do que dizem, do que escrevem, e do que pensam. Eles têm que ter medo de usar a palavra errada, uma palavra denunciada como ofensiva ou insensível, ou racista, sexista, ou homofóbica”, escreve Bill Lind, um dos impulsionadores do politicamente incorreto no mundo e divulgador do termo marxismo cultural – classificado por seus autores como um movimento global pela construção de uma sociedade multicultural e igualitária.

Na esteira da onda do politicamente incorreto surgiram no Brasil ativistas, movimentos políticos, filmes e até série de televisão. O livro “Guia Politicamente Incorreto da História do Brasil”, do jornalista Leandro Narloch, virou best-seller. Em seguida veio uma avalanche do mercado editorial com guias e manuais politicamente incorretos sobre todas as coisas. Surgiu até um “guia dos guias” do politicamente incorreto. Alguns são interessantes e têm algo a acrescentar, enquanto outros não passam de caça-níqueis.

Também fez sucesso a série de televisão Politicamente Incorreto, criada por Fabrício Bittar e pelo humorista Danilo Gentili. A série mostra a rotina de trabalho de um deputado federal no Congresso Nacional e satiriza todo o sistema político de corrupção.

Guias e manuais do politicamente incorreto
Alguns dos manuais e guias que surgiram na onda do politicamente incorreto.| Divulgação

O avanço do politicamente incorreto nas duas primeiras décadas do século 21 pode ter proporcionado importante reflexão sobre o modo como as pessoas agem no dia-a-dia e provocado questionamentos legítimos sobre o uso de determinados costumes, atitudes e procedimentos para manipulação política-ideológica.

A forma irônica, provocadora e bem-humorada, além de atitudes contrariando regras e modelos de comportamento consagrados, muitas vezes serviu para derrubar mitos e trazer novos questionamentos. Mas os resultados das práticas de muitos daqueles que aderiram às formas politicamente incorretas de agir são desastrosos.

Durante milênios a humanidade acumulou conhecimentos, valores e costumes que nos garantiram dignidade. Esse acúmulo se deu por vários meios: a família, o Estado, a religião, a cultura e as artes, a educação, a ciência, a justiça e tantos outros. Uma parte relevante desse aprendizado foi jogada no lixo pela turma do politicamente incorreto, nos levando de volta à barbárie.

O discurso de grande parte do pessoal politicamente incorreto evoluiu para o radicalismo e passou a reforçar preconceitos de toda ordem, com a banalização de atitudes que ferem a dignidade dos seres humanos.

Ofensas às pessoas por sua sexualidade, por seus gostos pessoais (seja cultural, artístico, político, ideológico, esportivo), por seus sentimentos, por suas relações afetivas ou por posições em relação à religiosidade tornaram-se comuns, sem nenhum constrangimento por parte de quem as praticam.

Em nome do politicamente incorreto passou-se a atacar o caráter íntegro, a honra, a honestidade, a retidão. O 'desvio torto' virou regra.

Uma das atitudes mais comuns dos adeptos do politicamente incorreto é agredir com palavrões e xingamentos as pessoas com as quais não concordam. A incivilidade contaminou os ambientes privados, os debates públicos, as instituições educacionais e adentrou os gabinetes governamentais, legislativos e judiciários. O respeito foi trocado por insultos, assédio e ameaças.

Conceitos fundamentais para a vida em sociedade, como polidez, atitude gentil, cortesia e civilidade, parecem não ter nenhum significado aos simpatizantes da forma incorreta politicamente de viver. No lugar do debate, do argumento, do bom senso, da busca do entendimento, entra a agressão, a grosseria, a desqualificação banal.

A palavra 'lixo' se transformou em sinônimo de tudo o que muitos dos praticantes do politicamente incorreto não concordam.

Se, de um lado, é nocivo o uso indevido de ‘conceitos corretos politicamente’ com a finalidade de coibir a liberdade de expressão, patrulhar e perseguir, de outro, o politicamente incorreto não pode se valer do embate ideológico no seio da sociedade para disseminar o discurso de ódio, a discriminação, o autoritarismo e os atentados contra a democracia.

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