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Femtechs crescem, mas faltam investimentos

Beatriz Bevilaqua

Beatriz Bevilaqua

Jornalista e Comunicadora de Startups. Formada pela UEL (Universidade Estadual de Londrina), foi condecorada em 2013 pelo Prêmio Sangue Novo no Jornalismo Paranaense, em Curitiba, pelo Sindijor PR e, em 2019 E 2021, como Melhor Profissional de Imprensa do Brasil pelo Startup Awards, maior premiação do ecossistema de startups da América Latina. Instagram @beatrizbevilaqua.

Público feminino

Femtechs crescem no país, mas falta investimento no segmento

28/07/2021 16:00
As femtechs, startups que criam soluções inovadoras voltadas para o público feminino, têm ganhado destaque nos últimos meses no Brasil. Mesmo assim, muitas dessas empresas estão em fase inicial e faltam incentivos financeiros. Conversei com algumas empreendedoras e especialistas para entender melhor o panorama sobre os principais desafios no setor.
O termo “Femtech” foi criado pela dinamarquesa Ida Tin, que em 2013 fundou um aplicativo chamado Clue, para auxiliar as usuárias a identificarem o período fértil durante o ciclo menstrual. O aplicativo tem mais de 8 milhões de usuários de 180 países diferentes. A rápida expansão deste segmento no mundo se deve a alguns motivos: quase metade da população mundial é de mulheres, um público-alvo mal atendido e que busca cada vez mais tecnologias e soluções ágeis para as suas questões.
As últimas pesquisas apontam que esse nicho pode movimentar no mundo US$ 50 bilhões até 2025. Algumas categorias em alta são wearables, sensores de saúde, marketplaces, prontuários eletrônicos, prescrições digitais, inteligência artificial, big data, fitness, cannabis e próteses. Segundo a última edição do Inside Healthtech Report, hoje já são 23 startups no Brasil focadas na saúde e bem-estar da mulher.
Neste artigo, trago alguns depoimentos de quem está à frente de startups que trazem soluções disruptivas e inéditas ao mercado brasileiro.

Femtechs na prática 

Uma das entrevistadas é Val Sátiro que sofreu por anos de endometriose profunda, descoberta tardiamente com o órgão gravemente acometido. Foi dessa experiência no passado que ela tirou forças para desenvolver uma plataforma de impacto social que leva conhecimento científico na saúde integral da mulher. A “Interação Saúde da Mulher” dissemina conhecimentos, facilita interatividade entre os profissionais da saúde e as mulheres.
A pandemia a ajudou a validar o modelo de negócio no meio digital. Nesse período, Val organizou várias iniciativas online sobre os temas preventivos na saúde da mulher em diversas fases, e sobre a própria história, como forma informativa e de engajamento. Hoje a empresa está sendo apoiada pelo Distrito e uma rede de mulheres parceiras.
Val Sátiro e Alessandra Seixas.
Val Sátiro e Alessandra Seixas.
Já Alessandra Seixas, desenvolveu uma plataforma wellness de benefícios para a saúde feminina: a SacadasFit. Ela explica que optou por empreender nesse nicho para apoiar o crescimento da força de trabalho feminina e democratização do acesso para uma melhor qualidade de vida da mulher.
“Pela plataforma, é possível se conectar com profissionais de meditação, yoga, aromaterapia e consultorias especializadas”, explica Alessandra. A empreendedora se sente realizada com o negócio, mas ressalta os desafios neste segmento. “A maior dificuldade é a falta de recursos e incentivos para startups fundadas por mulheres”, lamenta.

Investimento no segmento

De acordo com o Female Founders Report 2021, pesquisa promovida pelo Distrito, B2Mamy e Endeavor, dos US$ 3,5 bilhões de investimentos feitos em startups brasileiras em 2020, apenas 0,04% do total foram para startups fundadas exclusivamente por mulheres. Os investimentos trazem a musculatura tão necessária, não só para a fase de validação, mas também para tração do negócio.
Algumas empresas existem justamente para fomentar o empreendedorismo feminino e incentivar as femtechs, como é o caso da B2Mamy, que são especialistas em olhar femtechs em fases iniciais e organizar o caminho até o acesso ao capital, possibilitando que mais mulheres e mães enxerguem a possibilidade de ter o próprio negócio.
Segundo Dani Junco, CEO da B2Mamy, faltam incentivos financeiros e apoio no início da ideia. “Sem isso, é impossível desenvolver as soluções. Existe muito engajamento pelo propósito, mas pouco engajamento financeiro. Em comparação ao resto do mundo, estamos avançando muito pouco e muito devagar”, enfatizou.
Dani Junco, CEO da B2Mamy.
Dani Junco, CEO da B2Mamy.
No entanto, começam a nascer grupos de mulheres investidoras que estão apostando em outras mulheres, como é o exemplo da ​​Wishe Capital, grupo de investimento focado em startups inovadoras lideradas por mulheres, que tem como objetivo eliminar o gap de gênero no ecossistema de startups, levando capital para empresas fundadas por mulheres com alto potencial de crescimento, oferecendo educação e conexão para quem investe e gerando valor econômico e impacto social.
Para Rafaela Bassetti, CEO da Wishe, o mercado das femtechs ainda é pouco explorado, tendo sido atendido até então pela grande indústria. “Agora, as startups e as fundadoras estão começando a tatear esses desafios e trazendo soluções com a mentalidade de marca nativa digital, de uma marca que constrói com o consumidor e que senta com outras mulheres para cocriar uma solução”, explicou.
Rafaela Bassetti, CEO da Wishe.
Rafaela Bassetti, CEO da Wishe.
A Wishe fez um investimento recente na Feel, uma das primeiras femtechs brasileiras a desenvolver soluções para o segmento de sexual wellness. A jornada da empresa teve início com a iniciativa da empresária Marina Ratton, que desenvolveu os produtos a partir da cocriação, com a comunidade da marca, na qual pôde entender as reais necessidades das mulheres e as lacunas não atendidas pelo segmento de cuidados íntimos. A startup passou recentemente por sua primeira rodada de investimentos, por meio da plataforma de equity crowdfunding Wishe, na qual obteve um índice histórico de 84% do financiamento liderado por investidoras mulheres, e alcançou a captação de R$ 550 mil.
“Agora elas têm oportunidade de investir em soluções que elas querem ver no mundo, que elas querem encontrar nas farmácias e querem consumir. Eu acredito que para 2022 o crescimento será ainda maior, pois há muitas mulheres começando a investir nisso, mas também porque o mercado de fundos tradicionais está percebendo que essa é uma oportunidade”, prevê Rafaela Bassetti.

Homens também desenvolvem Femtechs

Durante a pandemia, 1 milhão de mulheres brasileiras deixaram de fazer exame de mamografia. Segundo o INCA (Instituto Nacional do Câncer) o câncer de mama é o mais incidente em mulheres no mundo. A PHP Biotech, startup com foco no desenvolvimento de um medicamento para o tratamento do câncer de mama, está em fase de captação e possui rodada aberta na plataforma de Crowdfunding Equity da Wishe. O investimento busca viabilizar R$1 milhão para a startup.
Moacyr Bighetti, CEO da PHP Biotech, tem 20 anos de experiência atuando na indústria farmacêutica, mais especificamente na área de P&D, está com oito pedidos de patentes depositados em seu nome e alguns deles concedidos em mais de 40 países. Em 2017, ele vendeu uma de suas empresas, onde teve a oportunidade de licenciar seus produtos para grandes empresas como a Bayer Health Care nos EUA e Canadá, empresas no Chile, Argentina entre outros.
Moacyr Bighetti, CEO da PHP Biotech.
Moacyr Bighetti, CEO da PHP Biotech.
“Buscamos novas tecnologias que já sejam conhecimento estabelecido e a partir daí as transformamos em produtos médicos. Muitas vezes o pesquisador, ao desenvolver algo novo, acredita que aquilo já seja um produto, porém, na área médica, até uma nova molécula, nova tecnologia ou uma nova substância se transformar em um produto, são necessárias muitas etapas e muito investimento”, explicou.
Moacyr entrou no mercado de saúde da mulher com o objetivo de poder ajudar efetivamente esse público. “Percebemos que ao escolhermos este alvo estaríamos ajudando milhares de mulheres que hoje não dispõem de muitas alternativas e com grande chance de morrer. Vimos ali um propósito e uma iniciativa que não teria mais só o aspecto financeiro, mas grande impacto social”, disse.
A empresa está fazendo a captação de recursos por meio da plataforma de crowdfunding, e com isso deseja que muitas mulheres possam participar deste investimento e não somente fundos de Venture Capital com cheques grandes. “Queremos criar a sensação de pertencimento para estas mulheres investidoras, para quando este medicamento estiver no mercado, elas possam olhar, se orgulhar e dizer: eu participei disso!'', explica.
Fica claro que a colaboração entre as próprias mulheres e homens que se identificam com esse nicho específico já é um grande começo para esse segmento que ainda é embrionário aqui no Brasil. São grandes os desafios, mas aos poucos as femtechs vão conquistando novos espaços.
Que todos os players do ecossistema de inovação – aceleradoras, incubadoras, investidores e os grandes fundos de investimentos – vejam relevância nessas startups que são o nosso futuro para um mundo que pode proporcionar mais saúde, bem-estar e qualidade de vida para milhões de mulheres em todo o planeta.
E como sempre digo, para que algo mude, precisamos nos expressar e fazer barulho – para isso vale a imprensa, um blog ou simplesmente um post em qualquer rede social de alto alcance. Peçam ajuda, se apoiem umas nas outras, gritem se for preciso e confiem numa rede de apoio de empreendedoras que sentem as mesmas dores que você. Só não vale estar sozinha.

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