Cotidiano de Antigamente

Paulo José da Costa

José Peón, um portenho que conquistou os curitibanos

Paulo José da Costa
27/01/2022 10:00
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Quando se faz uma rápida pesquisa na internet sobre José Peón, nos breves registros existentes encontramos quase sempre as mesmas menções sobre a sua arte de criar lindas medalhas, mais de quatrocentas, relacionadas nos catálogos especializados e vez ou outra ofertadas em leilões de numismática.
O Museu Paranaense tem quase todas elas, oriundas do Museu David Carneiro, cujo acervo foi-lhe incorporado. De sua vida anterior, o pouco que se sabe é que após se formar na Escola de Belas Artes de Buenos Aires, por motivos que se desconhece, veio para o Brasil em 1914 e enrabichou-se pela Serra do Mar e por Curitiba, daqui não mais saindo.
Não seria o primeiro a se apaixonar por nossos aromas, sons de pássaros e cores das florestas, mas Peón soube nos retribuir, pois com seu talento raro logo tornou-se conhecido nos círculos culturais e intelectuais da cidade. Além das medalhas, esculpiu no bronze placas muito belas para ornar bancos, empresas, prédios públicos, monumentos em praças e ruas, tornando-se referência.
Toda essa rica herança de uma Curitiba em transformação nos anos 1920 a 1940, infelizmente, está praticamente perdida para o descaso, os ladrões de metais nobres, as demolições. Tenho no acervo umas quarenta fotografias dessas placas gravadas com maestria no metal. Quem quiser conhecê-las deve entrar no meu blog “paulodafigaroblogspot.com” que lá estão, fotografadas pelo próprio artista.
Cenas da Estrada da Graciosa, em 1928.
Cenas da Estrada da Graciosa, em 1928.
Em 1948, o professor Fernando Correia de Azevedo veio a Curitiba participar dos trabalhos de fundação da EMBAP - Escola de Música e Belas Artes do Paraná, que já vinham sendo alinhavados há um bom tempo através da Sociedade de Amigos de Alfredo Andersen. José Peón fez parte do seleto grupo de professores e artistas convidados para compor o corpo docente, ao lado de Estanislau Traple, Guido Viaro, Curt Freyesleben, Lange de Morretes, Artur Nísio, Theodoro de Bona, João Turin, isto é, a fina flor da arte paranaense.
José Peón está a merecer um livro só para ele, ilustrado com as placas, medalhas, fichas de empresas (como a Leão Jr, Cerâmica Weiss, J.Bettega etc.), que andam por todo o Brasil, disputadas por ávidos colecionadores. Mas não só por isso: ele foi um grande incentivador do movimento marumbinista, criou a BPT, Bandeira Paranaense de Turismo, e escalou muitos trechos com outros exploradores. Como corolário dessas façanhas, em 4 de setembro de 1938 atingiu o pico Abrolhos, um paredão de 1.200 metros, com seus companheiros Alfonso Hatschbach, Armin e Anna Henkel.
Tudo isso já foi dito em algumas matérias por aí: na Tribuna do Paraná de 13 de agosto de 2006, em artigo de Luís Afonso Salturi sobre Armin Henkel, que foi companheiro de Peón nas explorações do Marumbi; num escrito precioso sobre as suas medalhas,  por Rogério Bertapeli, no Boletim nr 61 da Sociedade Numismática Paranaense;  pelo Cid Destefani, na Gazeta do Povo; e no livro imprescindível “As Montanhas do Marumbi”, um catatau de quase 500 páginas em papel couchê escrito por Nelson Luiz Penteado Alves em 2008. Carlos Brantes estava dedicando sua vida a pesquisar sobre Peón mas infelizmente aquele acidente trágico na Praça Tiradentes há alguns anos o tirou de nosso convívio.
Pois bem, o que queremos mostrar nesta matéria é um lado desconhecido de José Peón. Além do artista gravador, professor da EMBAP e incentivador do movimento marumbinista, ele foi um bom fotógrafo e conseguimos reunir cerca de 150 registros dele, originais em papel. Não sabemos se ele tinha estúdio em sua casa ou na casa de algum amigo, ou ainda se utilizava os serviços profissionais de terceiros para a revelação e copiagem. Talvez o seu companheiro de escaladas, o mestre das objetivas Armin Henkel, o tenha assessorado. Não sabemos. O espaço disponível aqui na revista não me permite todas as imagens, de sorte que tive de me conter muito e até sofrer ao cortar algumas em benefício de outras.
A partir da esquerda, José Peón, Albert de Mascheville e Dario Vellozo, em torno de 1929.
A partir da esquerda, José Peón, Albert de Mascheville e Dario Vellozo, em torno de 1929.
Vejamos o que escolhi:  a primeira fotografia nos mostra José Peón e Dario Vellozo ladeando o grande Albert Costet de Mascheville, da Ordem Martinista, que havia se fixado em Curitiba com a família. Foto rara e importante para os meios esotéricos. E lá estava o nosso José Peón.  A segunda imagem nos mostra a estrada da Graciosa, que tantas vezes Peón deve ter percorrido em suas andanças. Ali ele está com seu automóvel que foi figurante de muitas de suas clicadas na Serra do Mar.
Em seguida, uma montagem com 2 imagens de Peón no seu cotidiano.
Cotidiano de Peón.
Cotidiano de Peón.
Depois, a imagem número 4 nos mostra um grupo de amigos em meio a árvores e bromélias. A fotografia de número 5 nos mostra Antonina em ângulo diferente. A sexta e última imagem que selecionei traz uma cena de pinheirais, tema muito caro a Peón, que adorava fotografar em meio às araucárias e a árvores com as bromélias barbas de velho. Boa parte de suas imagens traz pinheiros, principalmente aqueles solitários. Eu, cá entre nós, acredito que não deva existir imagem paranaense mais bela, depois das Quedas do Iguaçu, do que as de pinheiros solitários em meio ao campo.
Peón e amigos em meio a árvores e bromélias. (Imagem 4)
Peón e amigos em meio a árvores e bromélias. (Imagem 4)
Antonina, em 1928. (Imagem 5)
Antonina, em 1928. (Imagem 5)
José Peón faleceu em 1972, com 83 anos. Muitos dos que o conheceram guardam ótimas lembranças de sua alma doce e gentil. Nós, os poucos que admiramos e cuidamos da cultura agradecemos pelo que trouxe de bom para os paranaenses. Obrigado Sr. Peón!