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Reabertura de escolas é uma discussão que, infelizmente, ainda vai longe no Brasil. Não bastasse o país ser tão atrasado na qualidade da Educação, agora estamos também na lanterna em relação ao resto do mundo nesse quesito da volta às aulas. E isso não aconteceu agora por causa da segunda onda de Covid.

Quando saímos do pico da primeira onda no Brasil, que foi de maio a julho do ano passado, só 11 dos 27 estados permitiram a volta das aulas presenciais. Trago esse assunto agora para ficarmos atentos às decisões de governadores e prefeitos quando passar também a segunda onda.

Vamos esperar calados pela terceira ou quarta onda para reabrir as escolas? Continuar atrasados em relação ao resto do mundo? Já tem pesquisa comprovando que abrir escolas, seguindo protocolos, não aumenta o número de casos de Covid.

Nesses tempos em que falam tanto de Ciência, de comprovação científica, deveriam focar em pesquisas para ver que não há lógica em manter as crianças longe das salas de aula.

Depois de um ano de pandemia está mais que provado que escolas fechadas resultam em aumento do abandono escolar, retrocesso no aprendizado e inclusive no desenvolvimento de crianças pequenas. Isso sem falar nos problemas psicológicos e até nutritivos que o distanciamento da rotina escolar acarreta, especialmente para estudantes de comunidades carentes.

Antes de comentar a pesquisa feita no Brasil, comprovando que a volta às aulas não provocou aumento no número de casos de Covid nas cidades analisadas, vale relembrar o que foi o primeiro ano de pandemia para quase dois bilhões de estudantes pelo mundo, incluindo os cerca de 50 milhões de brasileiros matriculados em escolas, segundo o último Censo Escolar.

Fechamento e reabertura de escolas

Fechar escolas e universidades foi uma das primeiras medidas adotadas em praticamente todos os países, assim que começaram a registrar casos de Covid-19. Como o Brasil é um país enorme, de extensão continental, o mais lógico aqui teria sido fazer fechamentos conforme a doença avançasse e o risco de contágio fosse real.

O Brasil, porém, fechou escolas (fechou tudo, aliás) de forma generalizada, desconsiderando todas as diferenças regionais, até de clima, que é um fator preponderante no comportamento das pessoas e na proliferação de vírus.

Estados e prefeituras interromperam as aulas muito antes de haver confirmação de doentes na região, ou seja, o vírus sequer circulava na cidade, ou mesmo em cidades vizinhas e os alunos já estavam sem aulas. No início essa precipitação era até compreensível, porque não se sabia muito sobre a doença e as poucas informações que chegavam da China, onde tudo começou, eram muito assustadoras.

Havia o agravante do sumiço de jornalistas e médicos que tentaram divulgar informações sem o aval do governo chinês. Então muito antes do vírus, o que se espalhou pelo mundo foi o pânico. Esta foi a origem do fechamento generalizado de escolas, sem maiores justificativas.

Acontece que mundo afora pesquisas foram sendo feitas e divulgadas, o conhecimento sobre como evitar o contágio aumentou e a maior parte dos países reabriu escolas em poucos meses, quando os protocolos sanitários de uso de máscara, álcool em gel, distanciamento entre os alunos, entre outros, já estavam bem definidos. Poucas precisar fechar novamente.

Com todas as precauções estudantes da Nova Zelândia ao Canadá, da África do Sul à Finlândia retomaram a rotina de estudos presenciais ainda no primeiro semestre de 2020, no máximo no começo do semestre passado. A vida escolar segue sem maiores percalços, dentro da nova realidade de salas mais vazias e seguindo as várias regras sanitárias.

O Brasil levou muito mais tempo para testar uma reabertura e, ao contrário do fechamento, não fez isso de forma generalizada. Conforme mencionei antes, só em outubro, sete meses depois de iniciado o lockdown por aqui, os primeiros estados anunciaram que autorizariam a volta às aulas. E foram apenas 11 dos 27 estados.

A maioria dos outros segue até hoje com crianças e adolescentes em casa, tendo apenas aulas pela internet. Isso para quem tem acesso à internet. É o caso do Paraná, onde as escolas da rede pública estão fechadas há mais de um ano.

Não dá para atribuir a proibição à segunda onda ou à nova variante do vírus, sequer aos hospitais lotados. O Sul foi a última região do país a ser atingida na primeira onda e, mesmo aqui, de setembro a dezembro o número de casos confirmados só caiu. Ainda assim nem a rede particular de ensino foi autorizada a reabrir as escolas.

Não quero entrar no mérito da pressão que sindicatos de professores exerceram sobre prefeitos e governadores, nem discutir se eles cederam a essa pressão porque 2020 era um ano eleitoral. E muito menos comparar o distanciamento que se consegue ter em sala de aula com aquele registrado em bares, por exemplo, que durante meses estiveram liberados para funcionar.

Acho importante não ignorar, porém, o caso específico de reabertura de escolas em São Paulo que atraiu a atenção de pesquisadores brasileiros, ligados à Universidade de Zurich, na Suíça, e ao Banco Interamericano de Desenvolvimento.

Pesquisa baseada em estatísticas

Quatro pesquisadores da área de Economia decidiram estudar o que aconteceu no estado de São Paulo, onde131 prefeitos optaram pela reabertura de escolas ainda no segundo semestre de 2020. No estado mais populoso do Brasil isso é uma amostragem significativa.

131 cidades pode parecer pouco perto do número total de municípios do estado, 645, mas para os pesquisadores foi mais do que suficiente para uma análise comparativa confiável.

O que o grupo de economista fez foi olhar para os números de escolas abertas, de alunos circulando, população em geral, casos de Covid e mortes nessas cidades que autorizaram a retomada das aulas, antes de depois da volta. E também as oscilações no número de casos e mortes nas cidades que mantiveram a proibição, ao longo do mesmo período, segundo dados oficiais do Ministério da Saúde.

O título do estudo já diz tudo: “A reabertura das escolas na pandemia não aumentou a incidência nem a mortalidade de Covid-19 no Brasil”. A Gazeta do Povo publicou reportagem bastante completa sobre essa pesquisa, que pode ser conferida aqui, mas segue um resumo.

Os pesquisadores separaram os municípios de São Paulo em dois grupos. O primeiro era o das cidades em que o prefeito permitiu a reabertura das escolas; o outro, aquele onde a proibição foi mantida.

A conclusão de que não houve aumento de casos nas cidades que autorizaram a volta às salas de aula só veio depois de analisadas também a infraestrutura das escolas, os indicadores socioeconômicos dos municípios e até o percentual de idosos e as taxas de isolamento social em cada cidade.

Antes que os “do contra” comecem a desqualificar o trabalho e atacar os pesquisadores, vale uma brevíssima apresentação de apenas um deles. Guilherme Lichand tem PHD em política econômica pela Universidade de Harvard (EUA) e atualmente é professor assistente e diretor de pesquisas de um centro de estudos sobre o desenvolvimento infantil na Universidade de Zurich (Suíça). Ao ser entrevistado pela Gazeta do Povo o pesquisador foi taxativo.

“Podemos afirmar, com margem de confiança de 95%, que a reabertura das escolas não levou municípios a subir no ranking estadual de casos e mortes”.

Guilherme Lichand, pesquisador da Universidade de Zurich

O estudo está publicado em inglês, o que significa que está disponível para a comunidade internacional. Talvez fora do Brasil ninguém mais esteja muito interessado nesse tipo de pesquisa, já que a vida escolar segue em ritmo quase normal na maioria dos países. Resta saber se aqui vai ser lido pelas autoridades e, principalmente, se vai ser considerado.

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