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No meu último artigo (e vídeo) falei sobre o costumeiro sentimento de decepção que sentimos meses depois das eleições, tão logo começamos a descobrir que parte dos eleitos não está interessada em defender exatamente os valores que acreditávamos que estivesse. Falei também que dá trabalho ser eleitor, porque para ter um risco menor de erro é preciso pesquisar muito sobre os candidatos antes de votar, coisa que poucos eleitores realmente fazem.

E ainda que pesquisemos as biografias dos que se oferecem para cargos eletivos a chance de decepção existe, até porque o sistema eleitoral é cheio de brechas como o quociente eleitoral, que acaba levando para os parlamentos gente que sequer teve a maior parte dos votos. Mas refletir sobre nosso papel como eleitores trouxe à mente a questão da importância da representatividade política.

Por mais que a gente se irrite com os conchavos, as artimanhas, as mudanças de discurso e até com a traição mesmo de muitos políticos, que parecem estar sempre de costas para o povo, demonizar a política não nos ajuda, porque ela é necessária. Alguém precisa, afinal, assumir a gestão pública e outros tantos precisam nos representar no papel de fiscalizadores do governante e também de legisladores, criando as regras para que a sociedade funcione da melhor forma possível e para que o gestor consiga governar.

Em 2018 protagonizei uma experiência interessante relativa a esse da importância da política. Na época eu apresentava um programa de análise política em vídeo aqui na Gazeta do Povo e fui convidada por uma professora da primeira fase do ensino fundamental para falar aos alunos dela sobre política. A professora estava trabalhando o tema das eleições com as turmas e tinha percebido que as crianças, de 9 ou 10 anos, simplesmente não sabiam o que era política.

Qual seria a melhor forma de explicar para alunos, pequenos ainda, algo tão importante e de certa forma, complexo? Acabei escolhendo uma única palavra para começar a conversa com a garotada: representatividade.

A experiência de fazer uma criança entender o que é política

É óbvio que precisei dar exemplos dentro da realidade dos alunos do ensino fundamental para aproximá-los do conceito, mas foi bem mais simples do que tinha imaginado. Em questão de minutos todos concordaram que para pedir algo novo para a escola, melhor do que saírem gritando em busca da atenção de professores e coordenadores seria escolherem um representante para levar o pedido à direção em nome da turma e, assim, abrir um canal de diálogo.

Eles entenderam também que para terem um representante precisariam primeiro indicar alguns colegas e ver quem se dispunha a assumir esse papel. E teriam, afinal, que escolher, entre os voluntários, aquele que jugavam ser o mais habilitado para representar a turma.

A experiência gerou um processo de discussão e envolvimento que avançou pelo intervalo. De repente, discutir política era mais importante do que correr para o pátio para brincar com os colegas!

Aquilo, aliás, virou uma grande brincadeira: as crianças já sabiam quem seriam os possíveis políticos da turma e por que. Escolheram, claro, aqueles mais estudiosos, mais comunicativos, mais engajados, que em tese teriam mais facilidade para conversar com a professora. É claro que, na hora, surgiu uma lista de demandas e o inevitável debate sobre o que era prioridade, sabendo que se levassem todos os pedidos de uma só vez a chance de serem atendidos era menor.

A professora deve ter tido trabalho depois que lancei sobre aquela turma a noção da importância da representatividade. Saí da escola feliz, na esperança de que o batismo político de todos ali tenha reflexos nas urnas no futuro. Mais do que apenas se familiarizarem com política, tenho certeza de que entenderam a importância de cada um no processo político.

Representatividade política

Voltando para a nossa realidade e ampliando a reflexão... Quem são as pessoas que cada deputado ou senador representa? Qual a liberdade de ação que eles têm? O aval de quem?

O raciocínio lá da escola, de que o representante age em nome dos 30 ou 40 alunos da turma mesmo que não tenha sido escolhido por 100% dos colegas, vale para os representantes eleitos para as prefeituras e câmaras municipais, governos estaduais e assembleias legislativas e também para a presidência da República e o congresso nacional. Os políticos eleitos representam a totalidade dos cidadãos; no âmbito municipal, a cidade inteira. Em outras esferas, representam todos os moradores do estado e do país.

É um erro comum o eleitor pensar que quando não consegue eleger seu candidato, ele só precisa voltar a se preocupar com a política na próxima eleição. Muita coisa acontece antes da próxima eleição e interfere na vida de todos nós. Para que a democracia seja plena, não basta exercermos nossa cidadania escolhendo alguém que nos represente. É preciso escolher e acompanhar o que fazem.

Os parlamentares não são representantes únicos e exclusivos dos eleitores que votaram neles, nem devem satisfação só à sua base eleitoral. Eles precisam pensar na população como um todo, ouvir suas bases sim, mas olhar também para o universo ao redor, afinal todas as pessoas são atingidas pelas decisões que eles tomam. Por isso merecem o nosso repúdio aqueles eleitos que se recusam ao diálogo com quem pensa diferente, buscam o que consideram as melhores soluções só para eles, não o consenso.

Eu sei, eu sei. Tem muita gente nos parlamentos municipais, estaduais e no federal que preferíamos nem ter que ouvir ou olhar, que dirá fazer contato. Mas está também sob responsabilidade delas a decisão sobre temas que afetam nossas vidas, então, infelizmente elas precisam do nosso olhar e da nossa cobrança (ou apoio quando acharmos que merecem).

Calar não ajuda a melhorar as coisas. A nós, como sociedade, cabem o voto, a vigilância e a pressão, sempre que necessário. Para fazermos valer a representatividade política precisamos mostrar o que realmente queremos, até para que se investigue e expulse, pelas vias legais, aqueles representantes que não estiverem trabalhando direito, estiverem descumprindo as leis ou desrespeitando a democracia.

Aos que estão exercendo mandato cabe nos representar, com respeito à Constituição e à vontade da maioria. E nos ouvir. Falemos!

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