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Pedido de prisão, censura e multa: parlamentares LGBT fazem representação contra Maurício Souza
Diante da repercussão do caso, Maurício Souza ganhou mais de um milhão de seguidores em seu Instagram.| Foto: Reprodução Facebook

É, gente. Será que, definitivamente, “foi-se o boi com as cordas” aqui no Brasil? Este episódio lamentável do jogador Maurício Souza, linchado em sua imagem com uma surra em bits e bytes dada por seus detratores – com apoio incondicional de duas grandes empresas, a Fiat e a Gerdau, que forçaram seu clube, o Minas Tênis Clube, a rescindir seu contrato –, está dando o que falar.

A sociedade digital está discutindo o tema sob vários ângulos. Estamos vivendo os primeiros desdobramentos nas liberdades civis fundamentais da crise que a chamada Quarta Revolução Industrial está impondo. Hoje não apenas temos no Estado o olhar preocupado de cidadãos querendo manter liberdades civis fundamentais garantidas com o sangue de milhões de pessoas em toda a história: também temos de olhar para como a revolução sexual leva seus tentáculos ao Poder Econômico, através de iniciativas como o conceito de ESG (Environment, Social, Governance), uma espécie de patrulhamento do politicamente correto no ambiente corporativo.

“Aonde vamos parar” foi a frase que reputaram criminosa ao atleta. Conhecido por ser um conservador na política e movido por convicções religiosas, Maurício já está acostumado ao ambiente hostil por boa parte dos torcedores do esporte, dos jornalistas, de estações de televisão. Tinha pouco menos de 200 mil seguidores no Instagram até o início da semana. Agora, demitido do clube, banido da seleção brasileira (conforme declaração do técnico Renan dal Zotto) e execrado pela esmagadora maioria da mídia – com a honrosa exceção da Gazeta do Povo –, viu seu perfil explodir na plataforma da rede social, ultrapassando 1 milhão de seguidores em dois dias.

Temos de olhar para como a revolução sexual leva seus tentáculos ao Poder Econômico, através de iniciativas como o conceito de ESG, uma espécie de patrulhamento do politicamente correto no ambiente corporativo

Quando do vídeo de explicação feito pelo jogador, ele usou duas palavras importantes para defender seus posts. O primeiro foi “crença”. Ele falou movido pelo que crê. O segundo foi “opinião”, que, no fim das contas, é um sinônimo quando o primeiro pilar usado é a crença. E aí vamos ter pano pra discussão.

Os ânimos no país andam muito exacerbados e todos sabemos disso. Qualquer coisa meio “fora do prumo” é motivo para soltarmos nossos instintos mais primitivos, fazendo uma espécie de catarse ao vermos alguém caindo em desgraça por uma frase que desagrada uma minoria, por exemplo. O patrulhamento digital não perdoa mais quem tente usar a crença como excludente para expressar seu imperativo de consciência. Se está fora da cartilha, deve estar fora do mundo, deve ser linchado, apedrejado, como se os linchadores fossem perfeitos, sem pecados.

Porém devemos lembrar que o Ocidente ainda não ruiu por completo. Pelo que nos consta, não estamos vivendo uma distopia com um governo único, moeda única, uma certa marca na testa ou na mão direita sem a qual ninguém pode comprar ou vender (entendedores entenderão). Vivemos, sim, dentro de um ordenamento da sociedade que se uniu para promulgar uma Carta política que orienta os valores principais desta sociedade em busca do bom, do belo e do verdadeiro. E, nesta Carta, alguns elementos foram considerados tão especiais que resolveram gravá-los na pedra – tornando-os cláusulas pétreas.

O artigo 5.º, VI da Constituição esclarece que a consciência e crença são bens invioláveis. E que a expressão da crença está garantida. Não há crença no vácuo: cremos a partir de uma espécie de chassi, de eixo, que é um código moral ou dogma, revestido da sacralidade quando ligado a um texto sagrado ou um conjunto de parecenças de família para o estabelecimento da base religiosa dos postulados defendidos.

Ao se colocar contra a mistura de mulheres trans e mulheres biológicas em competições esportivas, Maurício se une a um movimento global de atletas que veem o que é ilógico: a ideologia criando distorções e injustiças com as mulheres. Mas até aí é uma opinião motivada por argumentos puros da razão – e os méritos destes argumentos são também jungidos ao tempo e ao espaço.

Porém, quando se coloca contrário à adoção da ideologia no ambiente que afeta crianças, como o caso dos quadrinhos da DC Comics do Superman, expressa um conjunto de valores que transcende o argumento público. Fala a partir de um compromisso de consciência inalienável: a sua fé – e a visão por ela emanada, que ilumina sua razão e traz o argumento. Usou de certa ironia, OK. Mas a ironia é um recurso retórico válido em todos os campos (é só olhar as ironias do comentarista Andreoli, do Globo Esporte, que o atacou veementemente e tem um histórico de comentários jocosos em seu perfil no Twitter com insinuações a respeito de sexualidade).

A decisão do STF estipulou claramente que o discurso somente poderá ser considerado homofóbico se, apenas e tão somente se, for discriminatório e incitar a violência. Nada mais, nada menos

O que antes era um assunto velado agora deverá ser enfrentado em campo aberto. E já falamos aqui umas mil vezes, mas temos que repetir. A ADO 26, julgamento que formou consenso no STF para a equiparação da homofotransfobia ao crime de racismo, ainda não transitou em julgado, e excepcionou a liberdade religiosa como possibilidade de opinião/crença em contrário à prática homossexual, por pressupostos de fé. A decisão do STF estipulou claramente (pelo menos por enquanto, até o julgamento dos embargos de declaração da AGU) que o discurso somente poderá ser considerado homofóbico se, apenas e tão somente se, for discriminatório e incitar a violência. Nada mais, nada menos.

É importante lembrar que a ampla maioria da cristandade, excluindo os adeptos da teologia liberal (resultado do método hermenêutico histórico-crítico), acredita, a partir de seus dogmas e valores morais, resultantes da exegese extraída das escrituras sagradas, que o ato homossexual é um pecado. E tal exegese pode ser consultada em confissões de fé, catecismos, livros teológicos, artigos e milhares de outros textos, que desde o primeiro século formam o corpo doutrinário das mais diversas tradições cristãs sobre o tema.

Com pequenas variações, os principais valores morais da cristandade continuam intactos. Sobreviveram aos egípcios, babilônicos, persas, romanos, vikings, mulçumanos, ao comunismo e ao nazismo, e sobreviverá à atual patrulha do pensamento. A história é a grande mãe da verdade: quem viver verá.

Conteúdo editado por:Marcio Antonio Campos
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