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Vista de Luanda, capital de Angola: país vem deportando líderes da Igreja Universal do Reino de Deus.
Vista de Luanda, capital de Angola: país vem deportando líderes da Igreja Universal do Reino de Deus.| Foto: Bruno Madeira/Pixabay

A Comissão Europeia é o órgão que estabelece e busca satisfazer os interesses da União Europeia em toda a sua extensão. É responsável por propor políticas comunitárias e zelar por seu cumprimento – tanto de forma voluntária quanto pelo contencioso dos tribunais comunitários. Também tem função representativa fora do bloco em vários sentidos.

Desde 2019 um importante cargo estava vago neste ambiente político, e foi preenchido no último dia 5 de maio. Trata-se do chamado “enviado especial para a promoção da liberdade de religião ou crença fora da União Europeia”, cujo último mandato foi exercido por Ján Figel. Este cargo foi criado em 2016 por causa das enormes violações à liberdade de minorias religiosas pelo autodenominado Estado Islâmico, não permitindo que a comunidade internacional pudesse fechar seus olhos a tais atrocidades.

Foi nomeado para o cargo o político grego Christos Stylianides, já com larga experiência no contexto de atuações no bloco europeu. O preenchimento desta vaga foi celebrado por diversas entidades, a exemplo da Alliance Defending Freedom International, coalizão de advogados cristãos ao redor do mundo, do qual temos a honra de participar como allied attorney (advogado aliado) desde 2013. Conforme diz Adina Portaru, advogada sênior do escritório da ADF em Bruxelas (sede da União Europeia), esta nomeação chega justamente quando se observa um aumento de pressão sobre minorias religiosas em vários lugares do mundo. Na verdade, como sabemos, mais de 80% da humanidade convive com restrições graves ou severas à liberdade religiosa.

Desde 2019 templos da Igreja Universal do Reino de Deus em várias cidades angolanas têm sido sistematicamente invadidos, inclusive com violência

O papel deste “enviado especial” da Comissão é justamente a promoção da liberdade religiosa como direito humano fundamental, e uma liberdade que vai além unicamente de professar a sua fé, mas também de organizá-la conforme sua fé (o chamado princípio do lex orandi, lex credendi). Isto significa que uma organização religiosa – isto por princípio de direito religioso e direito natural – deve estar ligada em torno de sua teologia, sua cadeia de confiança e sistema de governança, seja episcopal, presbiteral, congregacional ou mista, inclusive quando se fala de missões transnacionais.

Pois justamente nesta semana uma situação bem peculiar chama a atenção pela atitude extrema tomada por autoridades públicas em Angola. Desde o ano de 2019 templos da Igreja Universal do Reino de Deus em várias cidades no país têm sido sistematicamente invadidos, inclusive com violência.

Diversas tentativas junto à Justiça foram feitas pela Igreja, apelando para que o rule of law, um dos pilares da democracia, sistema de organização política que a Constituição angolana prevê, seja respeitado. Porém há diversas dificuldades para acesso a inquéritos, conforme dizem os advogados da instituição, gerando bastante insegurança jurídica – sob o ponto de vista de direito interno e internacional quanto aos princípios e direitos humanos fundamentais.

No último dia 10 de maio, nove missionários brasileiros, bispos da Igreja Universal do Reino de Deus, foram deportados do país africano, em uma escalada de hostilidades sem precedentes (que tenhamos conhecimento) no relacionamento diplomático Brasil-Angola.

Conforme declaração da igreja, os religiosos e suas esposas foram literalmente “emboscados” para comparecerem à Procuradoria-Geral da República, no edifício Sede do Serviço de Migração, e alguns simplesmente foram deportados, enquanto outros foram detidos e aguardam também sua deportação. As informações dão conta de que os religiosos brasileiros atuam, em sua maioria, há muitos anos naquele país, inclusive sendo alguns deles casados com cidadãs angolanas. Há relatos de famílias que foram separadas pelas autoridades, com retenção de passaportes e extrema dificuldade de acesso a advogados, meios de comunicação e, principalmente, dignidade.

O bispo Eduardo Bravo, presidente da União Nacional das Igrejas e Pastores Evangélicos (Unigrejas), informa dos inúmeros tratados internacionais sobre direitos humanos de que Angola é signatária, e que mostrou não cumprir ao tomar medidas extremas contra cidadãos brasileiros que possuem visto de residência – deveriam, portanto, ser deportados apenas após devido processo legal, com duplo grau de jurisdição, todos princípios previstos na ordem constitucional angolana. Relembra, inclusive, que esta iniciativa se deu pelo governo atual, com viés esquerdista, ante décadas de presença da IURD em Angola e com um histórico de bom relacionamento institucional com a igreja. “Hoje a mesma polícia nacional que bate nos cidadãos angolanos que estão orando em frente aos templos da Universal é a que vinha com sua banda de música tocar em nossas celebrações pouco tempo atrás”, comenta o bispo. Diz ainda que “a Unigrejas repudia veementemente o fato lamentável em Angola e que as autoridades brasileiras se posicionem a respeito, ante as violações atrozes aos direitos humanos e à perseguição religiosa observada pelo governo angolano aos missionários brasileiros”.

Há relatos de famílias que foram separadas pelas autoridades, com retenção de passaportes e extrema dificuldade de acesso a advogados, meios de comunicação e, principalmente, dignidade

O episódio gerou reação entre parlamentares brasileiros. Para o senador Nelsinho Trad, presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado, esta deportação é uma medida absurda, sendo “totalmente solidário a esses brasileiros”, avaliação corroborada pelo deputado Aécio Neves (PSDB-MG), presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara dos Deputados, que já solicitou ao Itamaraty um posicionamento sobre a questão.

O direito fundamental à liberdade religiosa é realmente algo a ser mais apreciado pela comunidade internacional. O vice-diretor da ADF International, Robert Clark, é enfático ao dizer que “a União Europeia não deve apenas continuar, mas intensificar seus esforços para proteger a liberdade religiosa ao redor do mundo”, e certamente deverá tomar conhecimento também desta violação extrema contra religiosos brasileiros em território angolano.

Que seja a voz de muitos levantada pelo direito à fé, e a livre organização dos templos de qualquer culto. Somente assim os direitos de solidariedade, hoje tão na moda nas discussões jurídicas ocidentais, poderão realmente ser observados. E que o Brasil, que possui o melhor sistema constitucional de laicidade colaborativa do mundo, possa também ser vanguarda na proclamação deste direito fundamental sempre que violações extremas como a que está ocorrendo em Angola acontecerem!

Conteúdo editado por:Marcio Antonio Campos
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