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Ilustração: Felipe Lima
Ilustração: Felipe Lima| Foto:

São poucos os feriados nacionais no Brasil: Natal, ano novo, carnaval, Tiradentes, dia do trabalho, Corpus Christi, 7 de setembro, dia de Nossa Senhora Aparecida, Finados, proclamação da República, a generosa semana da Páscoa (mais lembrada pelo enforcamento do que pela crucificação) e o Dia do Trabalho, quando no meio da semana. Esqueci mais algum?

Mesmo anexando à lista os feriados locais, são poucos, são muito poucos os feriados no Brasil. O triplo estaria de bom tamanho. Quem afirma é uma horda de vadios que, com essa premissa, lidera um movimento para a criação do “Dia do Vadio”.

O manifesto onde se proclama o “Dia do Vadio” começa com dois parágrafos da lavra do saudoso Horácio Braun, jornalista, escritor e humorista, honra e glória de Blumenau:

“O Dia do Vadio nada mais é que uma invenção de quem fica inventando coisas pra vadiar ainda mais. Para nós, vadio não é o aposentado, o que não faz nada, ou o que não precisa fazer nada. Vadio é o cara que trabalha obrigado, mas que é vadio. Afinal, o gostoso não é ter nada pra fazer e depois ainda descansar. O gostoso mesmo é ter que trabalhar, ter uma obrigação pra cumprir, e decidir não fazer por uma razão: vadiar!”.

“Vadio é aquela pessoa que realmente não gosta de trabalhar, apesar de até poder estar no batente. Vadio também não é vagabundo e nem trambiqueiro. É simplesmente aquela pessoa que, embora tenha muitas tarefas pra fazer, não faz ou só faz por obrigação derradeira. E é aí que está o prazer que vai ser comemorado e festejado devidamente. Afinal, não ter nada pra fazer e depois ainda descansar não tem graça.”

A data escolhida para mais este feriado nacional não foi adotada ao acaso. Será comemorada e respeitada sempre na primeira segunda-feira seguinte ao dia do trabalho, 1.º de maio. O que propicia uma vadiagem maior. Este ano o dia 1.º de maio caiu numa quarta-feira, o que seria praticamente uma semana no “dolce far niente”.

Tendo como patrono Dorival Caymi e mascote o Bicho Preguiça, também foi estabelecido que o santo padroeiro do vadio é o São Nunca. Nunca devidamente reverenciado, se este tão citado santo não ganhou nunca a sua própria e exclusiva data, doravante no Dia do Vadio celebra-se o Dia do São Nunca.

E por que São Nunca é o padroeiro do vadio? Porque vadio é aquele camarada que nunca trabalhou, nunca pegou no batente, nunca ergueu uma palha na vida e nunca ninguém viu uma gota de suor em seu rosto – a não ser nas férias de verão, no prazer supremo de erguer um copo de cerveja estupidamente gelada, ou na faina de fazer uma caipirinha com os dedos de um profissional.

Todavia, porém, contudo, os idealizadores do “Dia do Vadio” avisam à praça que não têm vínculo algum com a “Marcha das Vadias”. Em termos de movimento, a vadiagem institucionalizada assina com Millôr Fernandes: “O melhor movimento feminino ainda é o dos quadris”.

Caravanas de várias cidades já confirmaram presença para os festejos que se pretende fazer no Principado do Ócio, território livre encravado em Porto de Cima, nas fraldas da Serra do Mar e à beira do rio Nhudiaquara. As delegações mais numerosas virão de Salvador, Rio de Janeiro, Florianópolis e demais balneários onde vadios de modo geral costumam ter seu habitat natural. Para abrilhantar a solenidade de abertura do “Dia do Vadio”, os organizadores devem convidar uma grande comitiva de vadios do Distrito Federal, entre ministros, senadores, e deputados, com participação especial das autoridades togadas.

Na oportunidade, o documento instituindo o “Dia do Vadio” será entregue ao ilustre ministro Gilmar Mendes, para que este encaminhe à sanção do senhor presidente da República Jair Bolsonaro – que por terceirizar a presidência ao ministro Paulo Guedes, deve receber o diploma de “Vadio Honorário”.

Neste primeiro e pioneiro evento no Principado do Ócio de Porto de Cima, será descerrada uma placa em bronze onde vai constar o poema de Ascenso Ferreira:

Hora de comer — comer!
Hora de dormir — dormir!
Hora de vadiar — vadiar!
Hora de trabalhar?

— Pernas pro ar que ninguém é de ferro!

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Assim entendido que este cronista também não é de ferro, nos próximos 30 dias vou vadiar alguns dias em Estrasburgo, na rota dos vinhos da Alsácia, e em seguida devo passar em revista os melhores “biergärten” de Berlim. Mandarei notícias do “muro das mil maravilhas”.

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