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Terra dos aviões
| Foto: Imagem: Daniel Nardes/ Gazeta do Povo

Conhece alguém nascido em São José dos Pinhais? O município é o segundo mais rico do Paraná, tem mais de 325.000 habitantes, mas certos curitibanos têm a coragem de dizer que não conhecem ninguém nascido na Terra dos Aviões. Sequelas da pandemia. Depois de meses em confinamento, só acompanhando aeronaves pela janela de casa, moradores de Curitiba não confessam que já estão com saudades do Aeroporto Afonso Penna.

Óbvio, a pergunta é uma provocação aos nascidos na Vila de São José dos Pinhais, município fundado em 1852, quando o Paraná ainda era Província de São Paulo. Quem nasce na Terra dos Aviões é são-joseense, o cidadão que agora tem em mãos a responsabilidade de vigiar o crescimento da cidade em torno do Aeroporto Afonso Pena. Avança a economia, avança a cidade em cima de chácaras e áreas verdes em torno do campo de pouso dos aviões.

Quem chegou antes? O aeroporto ou a cidade? Essa é a metástase que aflige a infraestrutura aérea: os aeroportos transformados em cidades, à margem das cidades. A cidade indo ao aeroporto, e não o viajante. O prefeito Jaime Lerner tinha um projeto para não deixar o aeroporto maior que a cidade. A ideia do urbanista seria trazer a área de check-in e alfândega para a Rodoferroviária de Curitiba, com o trem a desembarcar o viajante na porta do avião.

Cidade dos Aviões, a designação veio do falecido radialista Irone Santos. Ele tinha um programa esportivo numa rádio de São José dos Pinhais que ia ao ar no final da tarde: “Na Terra dos Aviões, o relógio marca cinco e quarenta e cinco!” – e ia em frente, com as notícias frescas da liga suburbana e as requentadas do futebol profissional. Irone encerrava o programa com sua voz cavernosa: “C-O-N-F-I-D-E-N-C-I-A-L. O Coritiba treinou hoje no Alto da Glória!”.

Voltando à provocação do introito, quem não conhece ninguém nascido em São José dos Pinhais, vai conhecer um pouco de sua história: o pai de Anita Garibaldi nasceu em São José dos Pinhais. De nome Chico Bentão, o sogro de Giuseppe Garibaldi passou grande parte de sua vida em lombo de mula, entre Laguna e Lages. Bentão casou-se com Maria Antônia de Jesus Antunes, mãe de Anita, filha de pai sorocabano que conduzia tropas com charque e outros produtos que abasteciam o Brasil Meridional. Bentão e Maria Antônia, mais tarde, se estabeleceram em Laguna, onde ele acreditava encontrar maiores oportunidades de trabalho.

Depois de meses em confinamento, só acompanhando aeronaves pela janela de casa, moradores de Curitiba não confessam que já estão com saudades do Aeroporto Afonso Penna.

Era uma vez, quando o frio era frio mesmo, a jornalista telefonou para o professor Leopoldo Scherner, nosso falecido poeta nascido em São José dos Pinhais: “Mestre, a previsão do tempo diz que teremos geada. Como é que eu conjugo o verbo...”. A voz paciente do mestre não deixou a repórter concluir a pergunta: “Geia, minha filha. Geia!”. Paciência é especialidade dos poetas. Oráculo da imprensa, todo santo inverno o mestre respondia aos repórteres com antecipação: “Geia!”.

Nos dias de hoje, o aflito curitibano perguntaria ao são-joseense Leopoldo Scherner: “Professor, qual a origem da palavra saudade?”. O aluno do poeta Manuel Bandeira responderia gentilmente: “Veio do latim e se misturou com o árabe. Saudades de aeroporto? Bons tempos aqueles, quando Roma, Paris e Nova York faziam divisa com São José dos Pinhais”.

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