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Sergio Moro em novembro de 2018, antes de assumir o Ministério da Justiça e Segurança: ao reclamar da interferência na PF, ele procura resguardar sua marca anticorrupção
Sergio Moro em novembro de 2018, antes de assumir o Ministério da Justiça e Segurança: ao reclamar da interferência na PF, ele procura resguardar sua marca anticorrupção| Foto: CARL DE SOUZA/AFP or licensors

Todo mundo tem seu limite. Para alguns, ele é mais elástico do que para outros. Para Sergio Moro, que manteve-se firme no cargo de ministro da Justiça e da Segurança Pública enquanto, segundo o seu relato no dia da demissão, enfrentava pressões do presidente Jair Bolsonaro para interferir na autonomia investigativa da Polícia Federal (PF), o limite era uma demissão injustificada do diretor-geral da instituição. Os velhos inimigos de Moro encontraram nessa revelação uma dupla oportunidade.

A primeira, à qual se apegam com menos ânimo, é a de construir uma justificativa legal para levar Bolsonaro ao impeachment. A segunda é descobrir um passo em falso que Moro possa ter dado no esforço para se manter no cargo — por exemplo, por ter cedido em um momento ou outro às pressões para fornecer informações sobre investigações de interesse do presidente.

Esses velhos inimigos, se ainda é necessário dizer, são os integrantes da cúpula do Partido dos Trabalhadores (PT). E a narrativa que eles criam, claro, é repetida pela militância petista.

Por que há mais ânimo por parte dos petistas em descobrir desvios de conduta de Moro do que de Bolsonaro? Como bem resumiu um experiente observador da política brasileira amigo meu, o PT precisa de Bolsonaro na presidência e precisava de Moro com ele. Precisa de Bolsonaro no Palácio do Planalto porque aposta que ele chegará completamente desmoralizado e impopular ao pleito de 2022 — e aí o PT daria o bote eleitoral para voltar ao poder. E precisava de Moro junto com Bolsonaro para que o ex-juiz da Lava Jato se desmoralizasse junto com presidente e ficasse fora da disputa de 2022.

Mesmo que Lula não estivesse inelegível, teria dificuldade de derrotar Moro nas urnas. O ex-juiz federal tem, segundo as pesquisas de opinião, mais aprovação popular, um índice de confiança maior e uma menor rejeição do eleitorado, comparado com o ex-presidiário petista. Moro tem potencial para pegar um bom naco do voto antipetista e também de um belo pedaço do voto antibolsonarista.

Enfim, o PT tem mais motivos para temer Moro do que qualquer outra figura política. Isso sem falar na questão da vingança histórica. Afinal, foi em grande parte pelas mãos do Moro juiz que o grande esquema de corrupção montado nos governos do PT não teve o mesmo destino de outros esquemas de corrupção: a impunidade.

Os verdadeiros inimigos de Sergio Moro são esses velhos inimigos, porque os novos estão perdidos na própria narrativa. Os novos inimigos, evidentemente, são os bolsonaristas "raiz" — e outros que subiram a bordo quando o navio do governo já havia zarpado em direção ao iceberg, mas que não sabem como desembarcar de maneira segura sem se afogar nas próprias contradições.

Os novos inimigos de Moro estavam fechados com o ex-juiz e, do dia para a noite, precisaram inventar uma desculpa para dizer que sempre estiveram, apenas e exclusivamente, #FechadosComBolsonaro. Isso exigiu uma reformulação da narrativa do bolsonarismo. Em linhas gerais, a ala bolsonarista que reafirmou as juras de lealdade ao presidente dividiu-se em conformados e decepcionados.

Os conformados não negam o amor a Moro, afirmam que ele foi muito importante para a "causa" e, sem entrar no mérito das acusações que ele fez a Bolsonaro, dizem que a vida e o governo seguem. O mal maior a ser evitado é o socialismo e, bem, os fins justificam os meios.

Os decepcionados, por sua vez, dizem que, na melhor das hipóteses, Moro errou e, na pior, que traiu Bolsonaro. A metáfora que eles usam é de uma segunda facada — sendo que a primeira, de Adélio Bispo, quando Bolsonaro era candidato, foi uma facada de fato, mas foi pela frente. Moro, dizem os decepcionados, nunca foi um conservador. Alguns até afirmam que, no fundo, ele é um comunista disfarçado.

Dá para perceber quem nenhuma das duas narrativas, a dos conformados e a dos decepcionados, representa grande ameaça a Moro. A primeira redireciona o ataque aos moinhos de vento de sempre. A segunda é contraditória e de difícil sustentação. Precisa ser reformulada e adaptada cada vez que Moro saca do seu WhatsApp mais uma prova do que disse a respeito do ex-chefe. E, suprema das contradições, sempre que os decepcionados com Moro o atacam, parecem andar de mãos dadas com os petistas.

Os novos inimigos de Moro o pintam como um falso herói. E "falso herói" é exatamente a expressão que uma das velhas inimigas, Gleisi Hoffmann, presidente nacional do PT, usou no Twitter para definir o ex-ministro.

Os verdadeiros inimigos de Sergio Moro são os inimigos de sempre.

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