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Os 10 problemas a resolver para podermos começar uma revolução na educação brasileira
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Entre os vários problemas da educação brasileira, um se destaca. Segundo o ex-ministro de Educação, Henrique Paim, o maior gargalo da educação brasileira está na formação dos professores. Essa percepção é compartilhada por muitos estudiosos da área que, corroborando com o ex-ministro, consideram este como um dos principais desafios a serem perseguidos.

Tive a oportunidade de exercer por alguns anos a função de pró-reitor acadêmico de uma grande universidade. Esta experiência me aproximou dos programas de formação da grande maioria dos cursos de bacharelado, graduação tecnológica e licenciatura ofertados no Brasil. Ali, associado a outros estudos que realizei, constatei os principais gargalos e lacunas que surgem na formação dos docentes, especialmente quando se compara com outras formações profissionais.

A conclusão a qual cheguei é de que praticamente todas as formações, ou a grande maioria delas, não estão adequadas às necessidades reais do mercado, mas quando nos referimos à formação dos professores esta inadequação é muito maior. Ou seja, os atuais contratantes de docentes (sistemas de ensino, escolas e grupos educacionais) estão muito mais descontentes com a formação dos egressos do que os contratantes dos demais perfis profissionais.

Na educação, o tempo todo e por todos os cantos se proclama a necessidade de outra formação para os docentes. E por que não avançamos? Quais são os obstáculos que nos impedem de oferecer uma formação melhor e mais efetiva para nossos atuais e futuros professores. Ouso apresentar algumas considerações que explicam um pouco nossa letargia ou insucesso nessa área:

  1. Todas as profissões vivem grandes mudanças, exigindo transformações nas capacidades e competências dos profissionais. Na educação não é diferente. No entanto, a escola, por si só, ainda trabalha numa estrutura antiga, considerada retrógrada, dando uma falsa impressão de que “tudo muda, menos a escola”. Assim, muitos educadores costumam adiar essa transformação acreditando na máxima de que escola está, de certa forma, protegida da avalanche de mudanças que ocorrem no mundo;
  2. As universidades têm grandes dificuldades em mudar o modelo no processo de ensino e aprendizagem para todas as formações. Mas, no magistério esta questão se agrava, já que o professor é o único profissional que pode tomar como modelo a própria formação. O professor aprende com seus professores, muitas vezes com métodos antiquados, a reproduzir o modelo pelo qual ele aprendeu. Isso dá uma falsa impressão de que ele age no caminho certo e com o método certo, impedindo ou retardando qualquer avanço no processo de ensino e aprendizagem nas escolas;
  3. Há muitas dúvidas e incertezas no que ensinar e no como ensinar professores. Há na própria academia uma discussão sobre uma formação mais prática (considerada mais rasa por um grupo de pesquisadores) ou uma formação mais crítica, mais densa (e considerada utópica ou pouco efetiva por outro grupo de estudiosos);
  4. No geral, vence a formação mais crítica, densa e reflexiva. Apresenta-se e discute-se os grandes pensadores da educação, com o objetivo de formar uma consciência crítica no professor, o que é louvável. No entanto, em função do pouco tempo de formação (três a quatro anos, no máximo), as questões técnicas, práticas e metodológicas são deixadas em segundo plano.
  5. A situação da formação inicial é grave e é possível observar que, enquanto a EAD avança de forma comedida e cautelosa em outras profissões (até porque estamos aprendendo a lidar com essa nova modalidade), na formação dos professores ele avança a passos largos. Ao todo, 61% da formação dos profissionais de educação hoje é feita a distância, muito longe da porcentagem total das matrículas do ensino superior na modalidade, que é de 20%. A EAD pode e é uma grande solução para a formação de docentes, mas precisa ser repensada principalmente no que se refere ao estágio, residência docente e outras questões às quais a modalidade a distância não tem conseguido dar respostas adequadas;
  6. Associado à questão da falta de prática, está o fato de que muitos professores, além de não saberem como ensinar, não dominam o que ensinam. Têm dificuldade na língua portuguesa, na matemática básica e em conhecimentos gerais. Isso se deve, principalmente, ao fato de que cada vez mais os ingressantes em cursos de licenciatura são alunos que apresentaram baixo desempenho no ENEM. O INEP realizou estudos que demonstram esta triste realidade. Muitos alunos que cursam licenciatura, ou seja, os futuros professores, têm uma formação básica comprometida e isso também comprometerá a sua formação universitária;
  7. Outro problema se refere à falta de tutoria no início da carreira. Em países desenvolvidos, como a Alemanha, mais de 90% dos professores ingressam na vida profissional sob a tutoria e o acompanhamento de docentes experientes. No Brasil, ocorre justamente o contrário. Mais de 90% dos professores iniciam sua vida profissional sem nenhuma espécie de tutoria.
  8. Os programas de formação continuada desenvolvidos pelos sistemas educacionais também deixam muito a desejar. No Brasil, gastamos os tubos com a formação de professores e obtemos pouco resultado. Boa parte dos programas são organizados sem um real diagnóstico da situação e das dificuldades do dia a dia em sala de aula. Também não há uma diferenciação entre professores que precisam mais ou menos de formação, que têm mais ou menos anos de experiência. Praticamente todos são colocados, independentemente da sua caminhada, nos mesmos programas e os temas tratados, há anos e anos, são os mesmos. Há muito mais atividades de reflexão, como acontece na formação inicial, do que atividades “mão na massa”. Isso desestimula e não favorece a mudança da prática do professor.
  9. Os gestores têm grandes dificuldades no processo de avaliação da atividade do professor. Por questões culturais, boa parte dos docentes tende a resistir a qualquer tipo de avaliação ou intervenção dos gestores nas suas práticas. Assim, muitos professores se fecham em seus “casulos”, dificultando o trabalho e o diagnóstico dos gestores. Além de dificultar a elaboração de qualquer programa de formação;
  10. Por mais que se proclame que a escola precisa mudar, que o professor precisa inovar, mudar sua metodologia, há ainda muita resistência por parte de pais e alunos sobre o que e como mudar. O discurso desenfreado de inovação é maior do que a vontade e a pressão por mudança.

Enfim, temos um grande plantel de problemas a serem resolvidos. Associado a todas essas causas, temos ainda a questão da carreira e da valorização do magistério. Por mais que façamos homenagens, reflexões sobre a importância do papel do professor na transformação da sociedade, as condições de trabalho da maioria dos professores brasileiros são deploráveis. Há pouca valorização efetiva dos docentes. A remuneração é bem inferior a outros profissionais que têm nível superior. A carreira não é estimulante e os professores têm menos oportunidades de ampliarem sua visão de mundo em relação à maioria dos demais profissionais com nível superior. Em geral, eles viajam pouco, têm pouco dinheiro para investir em formação individual e pouco participam de eventos culturais. Isso tudo estreita sua visão de mundo e compromete a formação dos alunos e, por consequência, o futuro do nosso país.

Não há dúvidas que a educação precisa viver uma revolução. Temos muito a fazer, mas se já temos a convicção de que o maior gargalo é a formação dos professores, sugiro começarmos por aí. Chega de discursos bonitos e floreados, precisamos de ações claras. Precisamos que todos os agentes (governo, sociedade, sindicatos, escolas e professores) se unam em prol de uma pauta positiva e que, de fato, impacte o nosso tão precário sistema educacional.

O futuro do Brasil agradece.

* Renato Casagrande é presidente do Instituto Casagrande. É conferencista, palestrante, escritor, pesquisador e consultor em Educação, Gestão e Liderança no Ambiente Educacional. Também é autor de livros e artigos publicados no Brasil e no exterior. Doutorando em Educação, é mestre e bacharel em Administração e licenciado em Matemática. O profissional colabora voluntariamente com o Instituto GRPCOM no blog Educação e Mídia.

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