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Os próximos capítulos da jornada docente
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Antes de mais nada, quero fazer uma pergunta a todos os professores leitores desta reflexão: quais critérios pautarão a sua jornada docente nos próximos anos, a partir dos últimos acontecimentos do mundo? Em 2019, com uma outra abordagem, e diante de um contexto diferente do atual, essa pergunta chegou até mim por meio dos insights do incrível professor Clayton Christensen (Harvard) por meio do livro “O Dilema da Inovação”. A obra faz uma provocação contundente sobre o fato de que grandes empresas (e pessoas) fracassam exatamente porque fazem tudo certo.

E será que na educação não acontece o mesmo? Reconheço hoje vários ecossistemas educacionais que fracassaram por pensarem, ano a ano, que estavam fazendo tudo certo. A educação, mesmo mantendo o seu radar competitivo ligado e suas crenças acerca das próprias práticas como sendo as melhores possíveis, já queima na largada. Quando, a partir de março de 2020, os alunos precisaram mostrar que a escola estava preparando seres humanos para a autonomia e protagonismo, se deparou com alunos perdidos e totalmente dependentes dos seus professores e da instituição física (prédios e salas de aula). Quando a ruptura e a inovação foram exigidas, o dilema se instalou instantaneamente. E, nesse cenário, a desigualdade foi escancarada.

É importante ressaltar que a desigualdade é consequência da inovação. E esta destrói empregos com mais rapidez do que a educação pode agir para salvá-los. E como não há crescimento e desenvolvimento econômico sem inovação, a desigualdade é efeito desse movimento orgânico em todo o mundo. Se alguém inventa algo que transforma as minhas habilidades em algo irrelevante, só há dois caminhos a seguir: ficar obsoleto para sempre e viver reclamando, ou imitar, adaptar e melhorar.

No incrível filme “2001 – Uma Odisseia no Espaço” um símio utiliza um osso como ferramenta e percebe nisso uma vantagem em relação aos demais. Ao mesmo tempo que inova, o símio exclui. Toda inovação de impacto determina um vencedor: aquele que fez primeiro. E, diante disso, a imitação da inovação poderá servir de estratégia para reduzir a desigualdade. Ao imitar a inovação abre-se uma grandiosa janela de oportunidade para que os excluídos possam se recuperar.

Não vamos culpar a pandemia como responsável por um aparente fracasso educacional. A obsolescência generalizada, há tempos, está presente na pedagogia da normalização. Ao executar uma aula entregando ao mesmo tempo, com a mesma velocidade, a mesma informação, para indivíduos diferentes, evidenciamos e consolidamos o paradigma da instrução, presente nas inúmeras escolas que foram projetadas para alunos que se conformam. Urge reestruturar os diversos segmentos educacionais para que possam formar pessoas mentalmente flexíveis e criativas. Não podemos, por exemplo, perder tempo com penduricalhos inúteis, excesso de siglas e engessamentos num momento de pura atividade cerebral dos alunos, desde a Educação Infantil até o Ensino Médio, por exemplo.

O momento, que ainda chamamos de aula, em que alunos e professores se encontram (de forma física ou digital), é apenas o início de uma jornada transformadora, com o objetivo de mudar comportamentos. Afinal de contas, a aprendizagem só ocorre quando há mudanças visíveis de comportamento. E isso apoia-se no fato de que a educação tem como premissa básica a relação entre pessoas. Sendo assim, as habilidades humanas (Human Skills) jamais serão deixadas de lado quando falamos em subversão de modelos educacionais falidos e sem eficácia.

Por outro lado, estamos diante de um mundo exponencial, impactado pelas tecnologias e seus desdobramentos na indústria, no comércio e na prestação de serviços. As habilidades digitais (Digital Skills) nunca foram tão exigidas e tão necessárias para a transformação da sociedade. E isso significa que agora é tudo tecnologia, robótica, inteligência artificial, carros voadores, aplicativos e smartphones? É claro que não. Mas tudo isso não pode ser desprezado. Não prestar a atenção nisso seria o mesmo que preparar pessoas para o mundo futuro olhando apenas para o espelho retrovisor.

Diante disso, vamos começar a responder à questão do início desta reflexão? O primeiro critério é a definição de uma estratégia que contemple um propósito de vida, quando da escolha da profissão “professor”, somada a um espírito empreendedor educacional. Isso tem a ver com o segundo critério dessa lista: a equalização dos recursos. O equilíbrio entre o talento de cada professor, o tempo investido e a energia gasta para o preparo de cada atividade, cada avaliação, cada momento com os alunos. O terceiro critério nos convoca a jamais abrir a mão da ética e da humildade. E esta precisa ser uma espécie de catalisador diante dos docentes e gestores altamente titulados, em função de uma realidade onde necessitamos de líderes servidores, disponíveis e altamente ativos. O quarto critério nos solicita a criarmos uma cultura de inovação que seja capaz de extrair o melhor de três universos envolvidos na educação: pessoas, metodologias e tecnologias emergentes. E isso requer uma visão e entendimento de que um elemento não anula o outro. O último critério nos provoca a criarmos metas ousadas para a transformação da educação com o propósito de evolução. Afinal de contas, como já foi dito aqui, a sala de aula presencial ou virtual, é apenas o início de uma caminhada para a mudança de comportamento de toda a sociedade.

Como sou extremamente otimista e entusiasmado com as inovações e disrupções da educação, posso afirmar com muito brilho no olho: ainda é muito cedo para ser tarde demais.

José Motta Filho é engenheiro, gestor educacional, especialista em Principles of Technology e Mestre em Tecnologias Emergentes em Educação. Atualmente é Co-Fundador da Moonshot Educação, além de Diretor Educacional da SiliconValley.com.br, Startup que promove imersões educacionais ao Vale do Silício (USA), Finlândia, Israel e China. O profissional colabora voluntariamente com o blog Educação & Mídia.

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