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Fábio Póvoa

Fábio Póvoa é fundador da Movile/iFood, professor de Empreendedorismo na Unicamp e managing partner em Smart Money Ventures, em que lidera rodadas de capital semente em startups de educação (TechEds), finanças (Fintechs), RH (HRTechs) e de software como serviços para empresas (SaaS B2B).

Investimentos

Fuja da “perda” fixa

04/09/2020 21:32
14,25%. Se você reconheceu este número logo de cara, posso afirmar que já foi rentista — ops!, "investidor em renda fixa". E ainda hoje morre de saudades dos altos juros, baixo risco, mínimo esforço e enorme rentabilidade ao investir em ativos de renda fixa - Poupança, CDB, Tesouro Direto, fundos DI e afins.
Mais do que 1% ao mês! E, ainda que se considere que a inflação à época, para considerar juros reais e não apenas nominais, a rentabilidade ainda assim caiu drasticamente.
Dá uma olhada neste gráfico:
Parece uma montanha russa, mas é apenas a taxa básica de juros da economia, conhecida como taxa Selic. O tombo é visível e, se você tem o hábito de conferir os rendimentos mensais dos seus investimentos em renda fixa, deve ter sentido na pele (e no extrato) quão doída foi cada redução numa barrinha dessas.
O resultado disso? Bem, em uma linha: descontados impostos e inflação, investimentos em renda fixa já têm rendimento negativo. Seu rico e suado dinheirinho pode estar lá, parado, perdendo valor, quando deveria estar trabalhando para você, em prol da sua independência financeira. 
Sim, zero, nil, zilch, nada, coisa alguma, ou pouquíssimo. E dependendo da perspectiva, isso pode ser ainda muito: países desenvolvidos já convivem com taxas de juros negativas há alguns anos — no Japão, -0,1% e na Suíça, -0,75% aa. Na prática, japoneses e alemães pagam para investir em títulos públicos, já que os bancos cobram taxas sobre dinheiro parado e, principalmente, porque aceitam rendimentos negativos diante da expectativa de que as taxas possam cair ainda mais. Afinal, -0,5% ainda é melhor que -1% certo?
O resultado disso ? A renda fixa virou uma "perda fixa". 
Ou, mais precisamente, o que sempre deveria ter sido: via de regra, em maior ou menor grau de acordo com seu perfil como investidor (idade, propensão a risco, tamanho do patrimônio), uma classe de ativos na qual se deveria manter investidos apenas o montante de capital correspondente à sua reserva de emergência — até 12 meses do seu custo de vida mensal. Pra ter algum dinheiro "rendendo", mesmo que pouco. Ou nada, ou mesmo menos (negativo!) frente a outros rendimentos ainda menores. O objetivo é segurança na carteira: ficar protegido e sem correr risco.
E chegamos então ao risco… ah, o risco. O investidor brasileiro em geral nunca associou ele a algo positivo. Eu te proponho um teste: quando eu te falo em correr riscos nos seus investimentos, o que lhe vem à mente? Aposto que a pensamento reflexo mais imediato está ligado a uma destas palavras: perigo, perda, quebradeira, depreciação, prejuízos, concordata, fraude, falência, calote.
Nada mais natural, quando se podia ganhar 14,25% ao ano emprestando dinheiro pro Governo, sem em tese correr nenhum risco. (O risco de calote do país existe, e cresce, e a Argentina e Venezuela estão aí pra não me deixar mentir, mas este é assunto pra outra coluna).
Aposto que uma ínfima minoria lendo este texto pensou em retorno. Sim, risco e retorno, primos-irmãos. A dobradinha clássica, mandatória, no mundo de investimentos, em que ativos com maior perfil de risco, numa carteira diversificada, trazem consigo menos segurança, mais incertezas, maior volatilidade (sobe e desce de cotações), mais renda variável, mais risco, maior retorno potencial. O exemplo clássico é a rentabilidade de índice de ações (Ibovespa, Dow Jones) em longos prazos quando comparados à de outros ativos, em particular a renda fixa segura.
A consequência? Uma fuga para ativos com melhor equilíbrio de risco e retorno. Não por outro motivo, corretoras batem recorde de novos clientes, a captação líquida de fundos (imobiliários, multimercados, ações e moedas) cresce enormemente, o Ibovespa volta a superar 100k mesmo em meio a uma pandemia que só cresce.

Você deveria estar fazendo o mesmo

Primeiro a lição de casa: sua capacitação como investidor, seu orçamento pessoal, o contínuo corte de custos (como unhas), a compreensão do impacto da Covid no seu emprego, renda e negócio. A manutenção do seu fundo de emergência na renda/perda fixa sim, a revisão e balanceamento do seu portifólio de investimentos e … chegamos ao ponto deste artigo: o resgate e a fuga consciente da renda perda fixa.
Entenda que é seu papel (não o do gerente do banco ou assessor da corretora) buscar ativos com maior perfil de risco x retorno, que façam seu dinheiro, de novo trabalhar para você.
A despeito de uma crônica falta de educação sobre finanças pessoais e investimentos, hoje em dia já há uma miríade de conteúdo de qualidade — livros, podcasts, cursos — sobre finanças pessoais e investimentos tradicionais. Pra citar apenas alguns: Me Poupe!, Mauro Halfeld, Suno Research e a própria iniciativa governamental, a Estratégia Nacional de Educação Financeira, entre outros.
Além de conhecimento em si, já há inúmeros veículos estruturados e regulamentados — fundos! — para que indivíduos possam contar com a gestão profissional na análise, escolha de ativos, decisão de compra e venda, balanceamento de carteiras e todo o cotidiano de governança,  acompanhamento de resultados, reports periódicos e obrigações tributárias burocráticas.
Meu ponto principal: é de suma importância que se entenda, aceita e se busque ativos com maior potencial de retorno e, por corolário, incorrer de forma consciente e planejada em maiores riscos na alocação dos seus recursos como investidor. Em resumo, não apenas fuja simplesmente da "perda" fixa, mas busque maior rentabilidade em ativos com maior e melhor perfil de risco x retorno.
Mas nada disso é novidade, provavelmente você já sabia. A novidade é o quanto este movimento de liquidez tem resultado em um aumento perceptível em investidores buscando um ativo específico de alto retorno potencial (mas risco certo): startups.
Em grande parte, atraídos pelo fascínio de valuations bilionários (unicórnos - US$ 1 bi, ou decacórnios !), atingidos após sucessivas rodadas de investimento amplamente divulgadas na imprensa e mídia. E, no caso das startups bem sucedidas, ao disruptar indústrias estabelecidas, impactados pela perceptível mudança de hábitos cotidianos, como pegar um táxi (ops, chamar um Uber) ou pedir comida (ops, pedir um iFood).
Nos próximos artigos, espero ilustrar melhor os desafios do investidor pessoa física que trilha esta jornada de fuga da renda fixa e busca de ativos de risco, com particular enfoque em investimentos early stage em startups. Para que você possa conhecer mais a fundo, ter consciência dos riscos e oportunidades, investir melhor dentro de uma tese de investimento e com total alinhamento de interesses, e com isso aumentar as chances de retornos exponenciais compatíveis com o tamanho dos riscos.

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