O Banco Central começou a baixar os juros um ano atrás. Interrompeu esse movimento há dois meses. E agora cogita até elevar a taxa básica, talvez já na próxima reunião de seu Comitê de Política Monetária, em setembro.
Desde a semana passada, dois diretores do BC têm vindo a público deixar claro o que – para alguns analistas – havia ficado incerto no comunicado e na ata da última reunião do Copom.
O recado de Roberto Campos Neto, presidente da autarquia, e Gabriel Galípolo, diretor de política monetária, é essencialmente o mesmo: se achar necessário, o colegiado vai subir a Selic.
Trata-se de uma jogada ensaiada, parte da estratégia de comunicação da autoridade monetária. Quando notam que os anúncios formais do Copom causaram dúvida, membros do comitê buscam ser mais assertivos em palestras e entrevistas para, assim, coordenar as expectativas do mercado.
Estão conseguindo? Mais ou menos. Não é sem estranheza que se vê a tabelinha entre um egresso da gestão Bolsonaro e outro do governo Lula.
Parte dos analistas está revendo suas projeções para os juros. Alguns passaram a contar com três aumentos de 0,25 ponto porcentual até o fim do ano, e há quem espere três de 0,5 ponto.
Não é um movimento consensual, porém: o ponto médio das expectativas ainda indica Selic mantida em 10,5% ao ano até dezembro. Para o ano que vem, já se nota uma mudança. Em apenas duas semanas, a mediana das apostas para o fim de 2025 subiu de 9,5% para 10%.
O que há por trás dos alertas do Banco Central?
Dirigentes do PT, membros do governo e a esquerda toda darão a resposta de sempre: o alegado bolsonarismo de Campos Neto, que preside o Banco Central por indicação de Jair Bolsonaro. Na visão deles, ele quer prejudicar a economia brasileira – e, consequentemente, o presidente Lula – para colher frutos políticos.
Ocorre que Galípolo, o outro mensageiro, foi nomeado ao cargo pelo próprio Lula, que já o chamou de "menino de ouro". Ele é tido como provável escolha do petista para suceder Campos Neto na presidência do órgão a partir de 2025.
Nos últimos dias, Galípolo não apenas falou abertamente sobre a hipótese de subir os juros, como foi mais contundente que Campos Neto. A ponto de – naquele exagero que com alguma frequência acomete a Faria Lima – o indicado de Lula ser visto agora como hawk (falcão, que advoga juros mais altos) e o de Bolsonaro, como dove (pomba, que defende juros menores).
O povo das finanças ficou ressabiado com o atual presidente do BC porque, numa entrevista publicada nesta terça (20), ele cortou o barato de quem dava como certo o aperto monetário. "O mercado já vinha colocando um pouco de expectativa de alta na curva. Mas não depende só do mercado, precisa olhar o cenário daqui para frente", disse Campos Neto à jornalista Miriam Leitão.
Ainda na terça, talvez ciente da repercussão, Campos Neto buscou ressaltar a unidade do Copom. Fez referência a uma decisão dividida do colegiado, em maio, e reconheceu que ela causou ruídos: "A gente entendeu que teve um problema que gerou um prêmio de risco, que não foi bom para o Banco Central e nem para a economia".
Segundo ele, "a equipe está focada e comprometida em levar a inflação para a meta". "Vamos fazer o que tiver que fazer e, se tiver que subir os juros, vamos atuar", reforçou.
Se um Campos Neto dove ainda parece um delírio, muita gente está longe de ser convencida pelo Galípolo hawk. Parte da direita vê sua postura recente como um cavalo de Troia, um jogo de cena para iludir o mercado até assumir o comando do Banco Central e, aí sim, tocar a política monetária "de Lula". A missão seria facilitada pela renovação da diretoria do BC: se hoje há cinco indicados de Bolsonaro e quatro de Lula no Copom, a partir de janeiro serão sete "lulistas" e dois "bolsonaristas" decidindo o preço do dinheiro.
Interpretações político-partidárias e adivinhações à parte, é fato que o Banco Central lida hoje com um cenário mais complexo que o de meses atrás.
A inflação subiu. As expectativas se afastaram da meta. O dólar avança a cada vez que Lula diz o que pensa sobre o uso do dinheiro público. A economia e o mercado de trabalho estão mais aquecidos que o esperado – e não deveria haver um "mas" após essa notícia, mas pelo jeito o país já não consegue crescer 2% sem pressionar a inflação. Por outro lado, os Estados Unidos podem finalmente começar a cortar seus juros, o que pouco tempo atrás abriria caminho para uma redução aqui também. Não será assim desta vez.
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