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A gente cresce ouvindo autoridades dizerem que “decisão judicial não se discute, se cumpre”. Parece arbitrário, mas, de tanto que repetem, supomos que convém obedecer.

Volta e meia, no entanto, a gente se surpreende pensando se é assim mesmo que funciona. Neste fim de semana, por exemplo.

Na sexta-feira (6) à noite, três deputados petistas decidiram que o momento era adequado para pedir a liberdade do ex-presidente Lula. Talvez não o tenham feito mais cedo porque à tarde o Brasil jogava com a Bélgica – e você sabe como as coisas são nessas horas.

Às 19h32, então, recorreram ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), onde encontraram o desembargador Rogério Favreto, cujo plantão havia começado apenas meia hora antes. Favreto foi filiado ao PT por 19 anos e exerceu cargos no governo Lula até que, em 2011, foi nomeado por Dilma Rousseff para o Tribunal, para ocupar vaga destinada a advogados.

Talvez seja só coincidência que o pedido de habeas corpus tenha sido feito justamente no plantão de Favreto. Fato é que no domingo (8) pela manhã, às 9h05, após passar duas noites estudando o caso, o plantonista mandou a Polícia Federal soltar o ex-presidente, preso na sede da corporação em Curitiba desde 7 de abril.

Para decidir individualmente, no meio do plantão, sobre um caso que a 8ª Turma do TRF-4 já havia encerrado, Favreto argumentou que havia um “fato novo”: a pré-candidatura de Lula. Coisa que nem sequer existe formalmente (porque não há a figura do “pré-candidato” na legislação eleitoral), mas que de todo modo foi lançada pelo PT há meses, mais especificamente em 25 de janeiro, um dia depois de Lula ter sido condenado pelo mesmo Tribunal.

Pode-se concordar ou não com o desembargador. Pode-se indagar se ele era isento. Pode-se questionar se ele, de plantão, podia fazer o que fez. Muita gente está questionando tudo isso.

Mas não há dúvida de que o desembargador, uma autoridade judicial no exercício da função, emitiu uma ordem. Ele próprio escreveu o alvará de soltura, determinando ao diretor da PF em Curitiba – ou a quem estivesse em seu lugar – que pudesse o ex-presidente em liberdade “incontinenti”, isto é, imediatamente.

Nada aconteceu. Às 11h49, petistas protocolaram reclamação avisando da demora em soltar Lula e da ausência de um delegado na sede da PF.

Foi só às 12h05, três horas depois da decisão de Favreto, que o juiz federal Sergio Moro entrou em cena. Não se sabe como ele, em férias, tomou conhecimento do alvará de soltura. De todo modo, o juiz determinou que a PF ignorasse a ordem do plantonista – que, pela hierarquia da Justiça, está acima de Moro – até que viessem esclarecimentos de outro desembargador, João Pedro Gebran Neto, relator da Lava Jato no TRF-4.

Às 12h44 Favreto reiterou a ordem de libertação de Lula.

Gebran Neto, que não estava de plantão, se pronunciou às 14h13, pedindo a volta dos autos para seu gabinete e mantendo Lula na prisão.

Às 16h12, Favreto, pela terceira vez, determinou a soltura do ex-presidente, desta vez dando prazo de uma hora para ser cumprida.

Nada feito. Lula continuou preso até que, às 19h30, apareceu um novo personagem. O presidente do TRF-4, Carlos Thompson Flores, que também não estava de plantão, encerrou a questão, devolvendo os autos a Gebran Neto e mantendo Lula na prisão.

Eminentes juristas discutem, agora, sobre quem fez o que não devia – e quem não fez o que devia.

Minhas dúvidas são mais pedestres. De leigo, mesmo. De quem busca saber como se portar para não causar problema.

Se eu discordar da decisão de um juiz, qualquer juiz, posso descumpri-la? Se a ordem parecer ilegal e vier de um plantonista, vale menos? Ainda devo aguardar os devidos trâmites e recorrer na sequência ou posso discutir a decisão antes mesmo de obedecê-la? Tenho direito a ligar para outro magistrado antes de me decidir? De quantas horas disponho para acatar ou não a determinação?

E, por último: numa situação dessas, devo seguir o exemplo das autoridades?

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