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Pescadores tradicionais coletam peixes de uma rede de pesca em Kampung Jawa, em Aceh, Indonésia, setembro de 2019
Pescadores tradicionais coletam peixes de uma rede de pesca em Kampung Jawa, em Aceh, Indonésia, setembro de 2019| Foto: EFE/EPA/HOTLI SIMANJUNTAK

Se o leitor tivesse que dizer qual país é maior, a Micronésia ou o Cazaquistão, qual seria sua resposta? Provavelmente diria Cazaquistão, certo? Afinal, é o maior país incrustado do mundo, compensando a falta de litoral com mais de 2,7 milhões de quilômetros quadrados de terra. Estava até na lista de “dez maiores países do mundo” do livro didático de geografia na escola. Ainda assim, a resposta está errada, algo relacionado a uma das últimas corridas por recursos naturais da Terra.

Os Estados Federados da Micronésia aqui são apenas um exemplo, ilustrando os vários países insulares, especialmente do oceano Pacífico. O país é formado por centenas de ilhas que proporcionam uma zona econômica exclusiva de três milhões de quilômetros quadrados. A tabela mundial de tamanho de países fica bem diferente quando se considera a soma da área seca, da plataforma continental e da zona econômica exclusiva. Países grandes no mapa, como Cazaquistão e Ucrânia, vão lá para baixo.

Enquanto isso, países que precisam de uma lupa em um globo terrestre escolar vão lá para cima. Kiribati, por exemplo, um país formado por atóis, virtualmente sem massa seca, fica quase do tamanho da Argentina. A Indonésia torna-se maior que a Índia e as ilhas Marshall eclipsam o enorme Sudão. Os exemplos poderiam ser alongados, mas, provavelmente, o ponto já foi feito: existem países pouco notados, mas que possuem grandes territórios possíveis de serem explorados.

Exploração econômica

Obviamente, isso representa maiores oportunidades de negócios. Novamente, quando se pensa em um país insular do Pacífico, se pensa em turismo, belezas naturais, praias paradisíacas e pouco mais que isso. Duas grandes fronteiras econômicas estão se abrindo na região, entretanto. Uma delas é a da pesca. Não do vilarejo de pescadores ou da pesca de subsistência, que existe ali há milênios, mas a pesca de larga escala, com frotas industriais. E não necessariamente locais.

A China é, de longe, o país com a maior frota pesqueira do mundo, o que inclui incidentes diplomáticos recentes. Navios pesqueiros chineses causaram protestos em Madagascar e no Equador, por causa das ilhas Galápagos. Em 2018, um navio pesqueiro chinês chegou a causar distúrbios na costa do Rio Grande do Norte, aqui no Brasil. Imagine a riqueza aquática contida em um “Cazaquistão” oceânico como a Micronésia e pronto, temos um foco de disputa e de oportunidades.

Mês passado, o ministro de Relações Exteriores das Filipinas, Teodoro Locsin Júnior, visitou a pequena Palau, onde se encontrou com o presidente Surangel Whipps. Palau sofre com a invasão de suas águas por navios pesqueiros filipinos, indonésios e chineses. Além disso, os dois países possuem uma fronteira marítima em disputa. Qual o objetivo de Palau, então? Resolver essa divergência marítima para então assinar um acordo de exploração de suas águas com a república das Filipinas.

Palau não possui, nem possuirá em curto prazo, recursos suficientes para “peitar” a Indonésia ou a China e exercer sua soberania em suas próprias águas. Pelo acordo de exploração, os filipinos podem explorar a pesca ali, pagando determinada quantia ao governo de Palau. Além disso, seria responsabilidade, e interesse, filipina garantir que as águas sejam exploradas de acordo com o tratado, fiscalizando eventuais transgressões por navios de outros países.

Seria uma espécie de “arrendamento aquático”, e a coluna não vai ousar dizer que é o primeiro caso desses no mundo, mas é uma possibilidade, ao menos envolvendo Estados contemporâneos. Ah, e a divergência fronteiriça entre os dois países é de uma área de cerca de trinta mil quilômetros quadrados, uma Bélgica. Para um mundo cuja História é marcada por conflitos motivados por pequenas divergências em um mapa de uma abarrotada Europa, é uma área enorme. A diferença é que não é seca.

Mineração

Outra notícia importante de 2021 nesse sentido foi a de que Nauru solicitou um parecer sobre a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar. Em seu pedido, Nauru busca se tornar o primeiro país do mundo a regulamentar a mineração em águas profundas, ou seja, a atividade mineradora no leito marítimo. Empresas já estão testando robôs e submarinos de carga para esse tipo de atividade. A Rússia também está desenvolvendo um “submarino cargueiro”.

A diferença da exploração do petróleo é que o fluxo de óleo para a superfície é facilitado pelas leis da física. As promessas, entretanto, pouco a pouco compensam os riscos. Reservas intocadas de Terras Raras, manganês e até ouro já foram confirmadas no leito do oceano Pacífico. Os impactos ambientais possíveis ainda são analisados, parte dos motivos do parecer solicitado por Nauru. Essa é a segunda fronteira econômica que vai se abrir, e também terá uma corrida pelo seu desbravamento.

Nos últimos anos, as principais potências expandiram seus investimentos e parcerias com países insulares do Pacífico. Isso não é motivado apenas por questões como mudanças climáticas ou prestígio internacional, mas também pela construção de alianças de médio e de longo prazo, que abram as portas para essas mesmas potências num futuro não muito distante. Isso inclui a cooperação militar. Não é por caridade que a Austrália colabora para o fornecimento de novíssimos navios de patrulha aos países insulares.

Esse tema já havia sido parcialmente abordado aqui no nosso espaço dois anos atrás, quando falamos do projeto de independência de Bougainville, uma  região autônoma parte de Papua Nova Guiné. O principal território da província é a ilha de mesmo nome, Bougainville, com cerca de 230 mil habitantes distribuídos em pouco mais de 9 mil quilômetros quadrados, mas com grande riqueza mineral. Outros possíveis separatismos na região são os movimentos papuásios na Indonésia e o da Nova Caledônia, posse francesa.

O que motivou uma nova coluna foram as notícias recentes citadas, que mostram a velocidade da expansão dessas novas fronteiras econômicas. Sim, o Mar do Sul da China ainda é o maior foco de tensão entre potências, mas o Pacífico como um todo será palco de disputas, descobertas e explorações nos anos que virão. Não se deve subestimar a importância desses países pelo seu tamanho diminuto no mapa. Até porque, como vimos, sequer pequenos eles são.

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