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Em agosto do ano passado, o Ibope Inteligência divulgou uma pesquisa que media o Índice de Confiança Social (ICS) do brasileiro nas instituições do país. Os dados mostram que, na última década, o ICS não parou de cair. Digna de nota é a queda vertiginosa de credibilidade da imprensa, que despencou nada menos que 20 pontos na série histórica, passando de 71 a 51. Quando se fala, portanto, numa “crise de representatividade” em vigor no país, usualmente em referência ao mundo político, seria honesto incluir aí os próprios meios de comunicação. Embora seja essa uma verdade nada lisonjeira para a orgulhosa classe jornalística, o fato é que o establishment midiático se tornou provinciano e ensimesmado, distanciando-se da realidade vivida pelo brasileiro médio. Que, por exemplo, uma professora universitária de Jornalismo descreva a profissão como a arte de “pensar contra os fatos” e “promover um novo senso comum” é revelador desse estado de coisas.

Diante do problema, abrem-se dois caminhos àqueles que trabalham com jornalismo, quer de notícia, quer de opinião. O primeiro é buscar bodes expiatórios como forma de se furtar a uma autocrítica profunda. Lamentavelmente, é o caminho adotado pela maioria da imprensa, que passou a ver as redes sociais como uma terra de bárbaros, ignorantes, produtores e consumidores de fake news, usurpadores, portanto, da nobre missão de bem informar. Outrora monopolistas no poder quase demiúrgico de construir e destruir reputações a partir de simples escolhas editoriais, hoje jornalistas se dizem vítimas de “ataques”, não raro confundindo, com suscetibilidade histriônica, críticas à sua atuação individual com um atentado generalizado à liberdade de imprensa.

O segundo caminho é o de, em vez de lançar a culpa sobre os ombros de terceiros, procurar examinar as próprias falhas. Um exemplo é o que fez Arthur S. Brisbane, ombudsman do New York Times entre 2010 e 2012. Em sua coluna de despedida, intitulada “Sucesso e risco nas transformações do Times” (25 de agosto de 2012), na qual comentava sobre os desafios da imprensa na era digital, escreveu: “Percebo que o formigueiro na Oitava Avenida [onde fica a sede do jornal nova-iorquino] é fortemente moldado por uma cultura de mentalidades afins – um fenômeno que acredito ser mais facilmente percebido de fora que de dentro… Através dos muitos departamentos do jornal, tantos são os que compartilham uma espécie de progressismo político e cultural – por falta de melhor termo – que essa visão de mundo virtualmente transborda para dentro do noticiário. Como resultado, processos tais como o movimento Occupy e o casamento gay parecem quase irromper dentro da redação, superestimados e mal dimensionados, mais como causas que como objetos de notícia”.

Sob esse aspecto, as redações brasileiras não diferem da do Times, também elas culturalmente homogêneas, e, com raras exceções, igualmente tomadas por progressismo. Tudo se passa como se, nesse ambiente, uma norma tácita fora admitida por todos, uma espécie de 11.ª tese marxista sobre Feuerbach em versão adaptada: até hoje, os jornalistas se limitaram a noticiar o mundo; chegou a hora de transformá-lo. Mas, num mundo que democratizou o acesso à informação, os meios de comunicação dispostos a escapar da irrelevância e recuperar a credibilidade terão fatalmente de revogar essa norma, deixando de lado o ativismo e recuperando o gosto pela boa reportagem.

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