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Manifestantes acendem um coquetel molotov durante protesto em Minneapolis.| Foto: Kerem Yucel/AFP

Em O Combate das Trevas. A esquerda brasileira: das ilusões perdidas à luta armada, de 1987, o historiador comunista Jacob Gorender comenta que, dentre as ideias mais influentes na esquerda brasileira nos anos 1964-1968, ascendia ao primeiro plano uma revisão da ortodoxia marxista-leninista quanto ao protagonismo na revolução. Com o avanço das revoluções cubana e argelina, bem como da Guerra do Vietnã e da Revolução Cultural na China, fixava-se na mente dos esquerdistas de todo o mundo a imagem do campesinato como substituto do proletariado na condição de classe revolucionária essencial.

Nas palavras do autor: “Foi possivelmente em Os Condenados da Terra, publicado em 1961 e última obra de Frantz Fanon, que a tese da superioridade revolucionária dos camponeses ganhou exposição mais taxativa. Nos países colonizados – afirmava Fanon, médico negro da Martinica identificado com a revolução argelina –, o proletariado urbano constitui pequena camada e pertence ao rol dos privilegiados. Os camponeses são a imensa maioria, nenhum privilégio lhes concede o colonizador, nada têm a perder. Daí serem eles a única força realmente revolucionária”.

Ao lado do campesinato, continuava Gorender, outro segmento social surgiu à época como alternativa: os marginais, o lumpemproletariado. “Marx não confiava no lumpen, nos trabalhadores degradados pelo vício e pelo crime” – escreve o comunista baiano. “Porém nos países atrasados e oprimidos, as circunstâncias são diferentes. O marginal, seja cafetão ou prostituta, pode ser arrancado da colaboração com a polícia e convertido em revolucionário”.

Não é obra do acaso que a criminalidade aumente sempre ali onde partidos, movimentos ou agentes de extrema-esquerda conquistem posições de poder e influência na sociedade

Os efeitos dessa reorientação teórica e prática da cosmovisão comunista são bem conhecidos no Brasil, país em que, nos anos 1960, o encontro entre presos políticos de extrema-esquerda e criminosos comuns deu origem às grandes facções criminosas que há décadas infernizam as nossas grandes cidades. Desde então, temos visto manifestações recorrentes dessa aliança mórbida entre esquerda e banditismo – ilustradas, por exemplo, pelo lema hélio-oiticicano “seja marginal, seja herói”, pela sugestão de um conhecido jornalista de “dar voz aos bandidos”, ou pela, digamos, filósofa – candidata petista ao governo do Rio – que se declarou “a favor do assalto”.

Por vezes, a discrição vai para as cucuias, e algum ultraesquerdista mais afoito – e menos dotado intelectualmente – dá com a língua nos dentes, explanando a visão dos pares sobre a função revolucionária da criminalidade. Foi, por exemplo, o caso do blogueiro petista Eduardo Guimarães, que postou em suas redes sociais: “A revolução está chegando, mas não será daquele tipo em que o povo se arma e marcha tal qual exército para cima dos opressores. A revolução se dará através da explosão da criminalidade. Será uma revolução de guerrilha. A justiça será feita nos semáforos, em cada esquina [sic]”. Ou de Anderson França, colunista da Folha de S.Paulo, que, em seu perfil no Facebook, propôs uma espécie de frente ampla reunindo a militância de esquerda e o Comando Vermelho: “Pense comigo que: A PM arrega pro crime [sic], mas bate em militante. Imagine o dia em que a militância fechar com o crime, APENAS PENSE [sic], a força do aço dos menino [sic], a disposição dos manifestante [sic]. CVRL e esquerda junto [sic]. Aliás, né? A História já conta. Eu fechava lindo nessa frente. LINDO [sic]”.

Não é obra do acaso, portanto, que a criminalidade aumente sempre ali onde partidos, movimentos ou agentes de extrema-esquerda conquistem posições de poder e influência na sociedade. Basta ver, por exemplo, o que ora se passa nos EUA, nos estados e cidades dominados pela ideologia desarmamentista e antipolícia. Na América Latina, em especial, o fenômeno foi demasiado evidente. O caso da Venezuela é paradigmático. Com o chavismo no poder, os números de homicídios só fizeram aumentar de maneira exponencial, atingindo, já com Nicolás Maduro, sucessor de Chávez, impressionantes 92 homicídios para cada 100 mil habitantes.

O sociólogo venezuelano Roberto Briceño-León, que estuda a criminalidade no seu país há mais de 20 anos e integra o Observatório Venezuelano da Violência, pesquisou a fundo as causas do fenômeno. Em artigo indispensável sobre o tema, que deveria nos servir de lição – a nós, que ficamos década e meia submetidos ao regime dos parceiros de Chávez, período em que a criminalidade também disparou por aqui –, Briceño-León concluiu que a explosão de crimes violentos durante a vigência do regime chavista era, antes que obra do acaso, resultado de cálculo político e ação sistemática.

O sociólogo mostra que, no ano de 1998, durante a campanha eleitoral, 4.550 homicídios haviam sido cometidos em todo o país. Em 2004, após seis anos de governo Chávez, esse número quase triplicara, passando a 13.288 homicídios. A taxa de homicídios por cem mil habitantes, que em 1998 era de 19,5, saltou para 51 no ano de 2003 – um crescimento, sem dúvida, muito fora do padrão. Se, de um lado, a crise política impulsionava a violência, de outro – eis o ponto crucial do artigo – o governo chavista impedia o seu controle e repressão.

Nas palavras do autor: “Há políticas que favorecem a violência. Uma delas tem sido o descrédito sistemático ao qual foi submetida a polícia e que levou tanto para uma campanha de agressões e desqualificações verbais, como as medidas de desarmamento dos funcionários. No ano de 2002, a emissora de televisão do governo transmitiu sistemática e repetidamente a promoção do filme venezuelano intitulado Disparem para matar, como sempre fazem os canais de tevê quando estão preparando a audiência para uma estreia. Nas cenas escolhidas do filme para os comerciais, apresentava-se um oficial de polícia ordenando morbidamente a repressão em um bairro pobre; depois mostrava-se o crime cometido por um funcionário da polícia num rincão escuro; após um som estrepitoso do disparo, escutava-se o grito raivoso e longo da mãe da vítima que acusava os policiais: ‘Assassinos!’. Antes e depois da propaganda, agregavam-se frases políticas contra a oposição política ao governo”.

No Brasil dos anos 1960, o encontro entre presos políticos de extrema-esquerda e criminosos comuns deu origem às grandes facções criminosas que há décadas infernizam as nossas grandes cidades

“Isso não parece ser casualidade” – continua Briceño-León. “Em diversas oportunidades o presidente da república tem se dedicado a contradizer uma velha crença popular venezuelana. Por décadas, ensinou-se às crianças venezuelanas que ‘a violência é a arma dos que não têm razão’. A expressão tem sido difundida como um valor destinado a desestimular a maneira violenta de resolução de conflitos entre os grupos de menores de idade nas escolas e vizinhanças, embora também entre as pessoas adultas, sobretudo na passagem da vida rural para a vida urbana. Tem sido surpreendente observar como, nos longos discursos de várias horas por todas as rádios e todos os canais de tevê, o presidente tem falado várias vezes que tal afirmação ‘não é verdade’, sugerindo que a violência pode ser usada e procurando mudar uma ideia que ele sabe fortemente arraigada na população”.

O prognóstico do autor: “Num contexto de violência política como a que descrevemos, a violência delinquencial, a violência das gangues e da polícia tenderão a se intensificar de modo notável, pois os indivíduos violentos encontrarão um espaço de fácil atuação e isso é o que já está acontecendo nestes últimos anos”.

Em resumo: a esquerda tende e ver a criminalidade positivamente, como força revolucionária. Daí que, onde chegue ao poder, os índices de criminalidade subam vertiginosamente, como ocorreu na Venezuela e no Brasil na última década. E como tem ocorrido nos EUA. Não é acidente. Como confessa o blogueiro petista: a “explosão de criminalidade” faz parte dos planos da esquerda revolucionária.

Conteúdo editado por:Marcio Antonio Campos
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