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O governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel| Foto: Mauro Pimentel/AFP

“A sociedade é um inferno de salvadores” (Emil Cioran, Genealogia do Fanatismo)

Em Caldas Novas (Goiás), uma cidadã brasileira, dona de casa, aparentando ter algo perto dos 65 anos, pôs-se a discursar sobre a pandemia que ora nos assombra. Aproximando-se de uns poucos transeuntes em frente a uma agência bancária, disse mais ou menos o seguinte: “Quem tiver de ficar em casa se resguarde. Grupo de risco, se resguarde. Mas serviços essenciais têm de voltar, senão vai acontecer o pior. Vai faltar arroz, feijão, remédio, produto de limpeza”.

Ato contínuo, foi cercada por três policiais, detida e algemada. Sim, algemada! Seus protestos desesperados, ademais de ignorados pelos agentes da lei, como se não mais que o ruído incômodo de uma máquina enferrujada que é preciso manusear, também não encontraram ouvidos solidários na massa de curiosos ao redor, que a tudo assistiu, bestializada.

Numa cidade do Pará, um barbeiro dava os últimos retoques com a máquina no cabelo de um cliente quando um grupo de policiais militares entrou na barbearia e, obedecendo a um decreto autoritário do governador emedebista Helder Barbalho (filho de Jader Barbalho, de quem herdou a capitania), determinou o seu fechamento e conduziu o trabalhador à delegacia.

Idosos são algemados por falar contra a quarentena, policiais arrastam banhistas solitários, tuítes sobre a cloroquina são censurados

Em Poços de Caldas (Minas Gerais), um padre fazia uma transmissão on-line da missa. Foi quando a igreja vazia, na qual se encontrava apenas uma pequena equipe de cinco pessoas, incluindo o cinegrafista e auxiliares do sacerdote, foi invadida por agentes da lei, que ordenaram a interrupção imediata do culto.

Em Barra de Guabiraba (Pernambuco), uma internauta registrou policiais militares fazendo um bloqueio na entrada de supermercado, impedindo o acesso dos cidadãos a produtos essenciais de subsistência.

No Guarujá (São Paulo), numa praia vazia, uma banhista que saía do mar foi violentamente agarrada e arrastada por três policiais e um salva-vidas, seus gritos por socorro ecoando em vão no ar salgado. Uma matéria jornalística reportou o caso em tom distante, não o suficiente, todavia, para disfarçar a aprovação da ação, que cumpria determinação da prefeitura.

Na Praia da Galheta, em Florianópolis, banhistas foram surpreendidos com a aproximação brusca de um helicóptero da Polícia Civil, que, com voos rasantes, e a fim de evacuar o local, envolveu-os numa tempestade de areia. Mais uma vez, uma reportagem do telejornal local chancelou acriticamente a ação. O apresentador chegou a dizer que o rasante do helicóptero tinha por objetivo “tentar orientar ainda mais essas pessoas”.

No Rio de Janeiro, o governador Wilson Witzel, com patética pose de Mussolini e um frasco de álcool gel junto ao corpo (um ditador com consciência epidemiológica é outro papo!), ameaçou prender os cidadãos que saírem às ruas para protestar “contra o que quer que seja”. Dias depois, redobrou as ameaças, dizendo que ficar em casa era uma ordem. Ademais, sugeriu denunciar o presidente da República ao Tribunal Penal Internacional pelo crime de desobedecer a OMS.

No ambiente virtual, tuítes de personalidades do mundo político, a exemplo do ex-prefeito de Nova York Rudolph Giuliani (que mencionava a eficácia da hidroxicloroquina no tratamento da Covid-19) e do presidente Jair Bolsonaro (que defendia o fim do confinamento total e também fazia menção à cloroquina), foram sumariamente censurados, sob a alegação de representar uma ameaça à saúde pública.

A pandemia de coronavírus é também uma epidemia de totalitarismo como há muito não se via em nações ocidentais e (ao menos formalmente) democráticas

Num conjunto de diretrizes verdadeiramente orwellianas, o Twitter informou que irá “atuar em conteúdos que vão diretamente contra as informações globais e locais de saúde pública orientadas por fontes oficiais” a fim de “instituir um rigoroso sistema global de triagem de conteúdo, por isso priorizamos as possíveis violações de regras que apresentam o maior risco de danos, reduzindo, assim, a carga das pessoas em denunciá-los”.

Em particular, toda menção ao sucesso do uso da hidroxicloroquina no tratamento da Covid-19 tem sido vetada por integrantes do Ministério da Verdade global. E não apenas na imprensa e nas redes sociais. Na França, por exemplo, o médico e microbiologista Didier Raoult, talvez o maior apologista mundial do uso de cloroquina no tratamento da Covid-19, chegou a ser ameaçado por conta de suas posições.

Em suma, a pandemia de coronavírus é também uma epidemia de totalitarismo como há muito não se via em nações ocidentais e (ao menos formalmente) democráticas. Sob o pretexto de salvar vidas, políticos, jornalistas e formadores de opinião têm se permitido defender toda sorte de arbítrio. Cenas que, não faz muito tempo, costumávamos ver apenas em países como China, Rússia, Coreia do Norte, Venezuela e Cuba hoje viram rotina ao lado de casa. Enquanto a maioria das pessoas anseia desesperadamente pela cura, alguns torcem para a doença. No futuro, talvez se venha a notar que, para uma certa elite política, financeira e intelectual, o combate não era contra o vírus – mas contra você.

Conteúdo editado por:Marcio Antonio Campos
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