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Combatente do Talibã monta guarda em um posto de controle na cidade afegã de Kandahar.
Combatente do Talibã monta guarda em um posto de controle na cidade afegã de Kandahar.| Foto: EFE/EPA/Stringer

No dia 2 de julho, os EUA e seus aliados da Otan abandonaram a principal base militar utilizada pelo exército americano no Afeganistão. No dia 8, perguntado por repórteres sobre a possibilidade de uma nova Saigon, Joe Biden disse que “não haverá cenas de pessoas sendo retiradas às pressas dos telhados da embaixada em nossa retirada do Afeganistão” e que “a hipótese de o Talibã assumir o controle de tudo e passar a comandar todo o país é altamente improvável”.

Que timing do presidente-eleito-sabe-se-lá-como! Vinte dias depois, o Talibã já avançava desenfreadamente em direção à capital Cabul, deixando para trás um rastro de violência que incluiu o massacre de crianças. No dia 28 de julho, em reunião entre o ministro das Relações Exteriores Wang Yi e o mulá Abdul Ghani Baradar, a China consolidava sua aproximação com o grupo terrorista, “uma força política e militar fundamental”, como o descreveu o chanceler chinês.

A retomada do Afeganistão pelo Talibã, a menos de um mês do 20.º aniversário do 11 de Setembro, é um dos maiores fracassos da política externa americana em todos os tempos

Passada outra vintena de dias, o Talibã tomava Cabul e assumia de vez o controle do Afeganistão, provocando as cenas terríveis a que todos assistimos nos últimos dias, quando milhares de afegãos lotaram o aeroporto da capital, em desesperadas tentativas de fugir do país nos aviões americanos. A China, por óbvio, foi a primeira nação a reconhecer o novo governo. Enquanto isso, Biden descansava e tomava margaritas em Camp David, a casa de campo dos presidentes americanos. Como escrevi aqui nesta Gazeta em dezembro de 2020, “com Biden, a China volta a sorrir”.

A retomada do Afeganistão pelo Talibã – fazendo do país, a menos de um mês do 20.º aniversário do 11 de Setembro, um novo paraíso para o terrorismo islâmico – é um dos maiores fracassos da política externa americana em todos os tempos. É Benghazi elevada à enésima potência. Ou, como sugeriu o senador republicano Ben Sasse no National Review, é pior até que Saigon. E a coisa pode ficar ainda mais feia.

Segundo informou o repórter Josh Rogin, do The Washington Post, com base no depoimento em off de uma fonte do governo, estima-se haver ainda cerca de 10 mil cidadãos americanos presos no país, a grande maioria em Cabul ou em seus arredores. São residentes, jornalistas, voluntários, funcionários de ONGs, pessoas com dupla cidadania, filhos de americanos sem passaporte ou visto, que não recebem da Casa Branca qualquer instrução sobre como regularizar sua situação e conseguir escapar. Enquanto esperam, encurralados e escondidos, soldados do Talibã batem de porta em porta à caça de infiéis. “Precisamos de mais tropas do Pentágono, e de mais recursos do Departamento de Estado para evacuar os americanos” – disse a fonte de Rogin. “Sinto que estou lutando contra o meu próprio governo para conseguir retirar as pessoas do meu país.”

De acordo com matéria do Daily Mail, o número de cidadãos americanos em risco pode ser ainda maior. Ontem, dia 17, funcionários do Departamento de Defesa do governo Biden prometeram evacuar 5 mil americanos por dia, muito embora só tenham conseguido retirar 1,4 mil nos três dias subsequentes à queda de Cabul. Enquanto isso, John Kirby, porta-voz do Pentágono, estima restarem entre 5 mil e 10 mil americanos somente em Cabul. E Robert Charles, assistente do secretário de Estado no governo de George W. Bush, acredita que o número pode chegar a 40 mil em todo o país. Caso o Talibã consiga apanhá-los antes da evacuação, a chance de uma carnificina é considerável.

A postura tíbia e pusilânime de Biden, que abusa de mentiras e evasivas em suas coletivas de imprensa, já tem produzido efeitos político-eleitorais. Na segunda-feira (dia 16), por exemplo, uma pesquisa revelou que quase 70% (69,3%, mais precisamente) dos entrevistados desaprovam a condução do presidente-eleito-sabe-se-lá-como da situação no Afeganistão. Em pareceria com o Trafalgar Group, The Convention of States Action (COS) publicou os resultados das entrevistas com mil eleitores. “Não há dúvidas de que a população americana não está engolindo as mentiras sobre o Afeganistão. Isso é Saigon, e até pior” – também declarou Mark Meckler, da equipe do COS.

Há 20 anos, o Talibã ajudou a Al-Qaeda a executar o 11 de Setembro. Só Deus sabe o que farão agora, contando ademais com o apoio da China

Hoje, dia 18, as notícias para o democrata são ainda piores. Pesquisa fresquinha do Rasmussen Reports indica que muitos eleitores se arrependem de seu voto em Biden, e que, se a eleição fosse hoje, ele perderia para Trump por seis pontos percentuais (37% a 43%). Um detalhe curioso da pesquisa, que entrevistou mais democratas que republicanos, é que Trump conquistaria hoje mais votos entre mulheres e negros (51,3%) do que o fez em 2020 (46,8%).

A vergonhosa saída americana do Afeganistão é uma bênção para a indústria de propaganda terrorista, tal como foi com Saigon. Explorando a fraqueza da América, o Talibã poderá posar como um “exterminador de superpotências”. Há 20 anos, o grupo terrorista ajudou a Al-Qaeda a executar o 11 de Setembro. Só Deus sabe o que farão agora, contando ademais com o apoio da China. Não por acaso, apoiadores de Trump têm postado nas redes um cartaz do ex-presidente com os dizeres “Já sentindo a minha falta?”. E é bem possível que, nos próximos meses, a mensagem deixe de ser apenas uma brincadeira trumpista.

Conteúdo editado por:Marcio Antonio Campos
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