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Foto: Wilson Dias/Agência Brasil
Foto: Wilson Dias/Agência Brasil| Foto:

Muitas coisas me incomodam no Brasil, mas uma delas especialmente: nosso país nos impõe situações em que nos deparamos com duas ou mais escolhas ruins e nenhuma boa. É o famoso paradoxo de Ney Matogrosso – se correr o bicho pega, se ficar o bicho come.

Esse abuso moral com que a pátria tupiniquim nos atinge é materializado em ocorrências diversas e corriqueiras. O empresário, por exemplo, muitas vezes se depara com a escolha entre declarar todo o seu movimento e pagar uma quantidade extorsiva de impostos ou sonegar para manter seu negócio andando sem demitir ninguém e sem deixar de tirar um pró-labore de subsistência para si mesmo. E os processos de obtenção de licenças? Seja para uma construção doméstica ou para o início de operação de um comércio ou indústria, os brasileiros são obrigados a escolher entre prosseguir sem licença nenhuma e torcer para que ninguém perceba, molhar a mão de algum funcionário público intermediário para ter o processo andando a passos de tartaruga – afinal, andar devagar é melhor que ficar parado numa gaveta – ou sentar e chorar.

Mas é na política que esse desdouro se manifesta quase que sem exceções. Nas últimas eleições presidenciais, por exemplo, fomos obrigados a escolher entre Aécio Neves e Dilma Rousseff. Tempos atrás, as opções eram Lula e Serra. Os cariocas que o digam: tiveram de optar pelo Marcelo ruim para deixar de fora o Marcelo muito ruim. Quantos de nós já não disseram um dia que iriam votar no menos pior? Infelizmente, essa é a normalidade da política brasileira.

A votação de quarta-feira no Congresso Nacional – a que decidiu arquivar a denúncia contra Michel Temer – é mais um ataque à nossa já combalida moral. Muitos ficaram aliviados porque Temer continuará na Presidência e não teremos de lidar com um Rodrigo Maia na cadeira mais poderosa do país e nem com a ameaça de uma eleição indireta em que qualquer coisa poderia acontecer, incluindo o fortalecimento de partidos de esquerda cujo único objetivo é transformar o Brasil na próxima Venezuela. Ao mesmo tempo, ficaram transtornados porque Temer continuará na Presidência apesar de suas falcatruas e crimes, e apesar de ele ter sido o vice do nosso ornitorrinco político, Dilma Rousseff. No meio dessa mistura de alívios e transtornos surgiram as mais diversas análises, desde as equilibradas até as recheadas de chavões como “não tenho criminoso favorito” ou “os fins não justificam os meios”.

Como este é o meu espaço de opinião, nada mais justo que deixar a minha sobre a famigerada votação. Não tenho apreço por Michel Temer, não duvido que ele seja um criminoso e nunca desejei que ele fosse o presidente do Brasil. No entanto, se tivesse de escolher entre jogá-lo agora aos lobos da esquerda e deixá-lo terminar o mandato, eu votaria como a maioria dos deputados. Não cabe, de maneira alguma, a acusação de que pensar assim é usar fins para justificar meios. Temos de analisar a situação como um todo de maneira mais profunda. A verdade é que a delação que serviu como base para todo esse movimento de condenação de Temer foi fabricada e obtida de forma obscura e sinistra. Basta lembrar que o dedo-duro da vez foi para Nova York curtir suas férias criminosas enquanto sua empresa lucrava bilhões com a sacudida que o mercado de câmbio levou justamente por causa da divulgação de sua delação. Quem assiste às séries policiais americanas já deve ter se deparado com o termo “fruto proibido”. São as provas que não podem ser usadas no tribunal por terem sido obtidas de forma irregular ou não prevista na lei. As gravações de Joesley são um verdadeiro pomar de frutos proibidos. E o acordo que ele conseguiu foi melhor que o de Pablo Escobar, que ao menos tinha de ficar preso em sua colônia penitenciária de férias. Criminoso que coopera geralmente tem a pena reduzida, quando muito. Nos estados americanos que têm a pena de morte, muita gente coopera para se livrar da agulha e passar o resto da vida preso.

Se Temer é criminoso, como tudo parece indicar, que seja investigado com base em fatos e achados reais, e não por gravações fabricadas por um outro criminoso que só teve vantagens em delatar a quadrilha da qual fazia parte e compiladas por um procurador-geral que não inspira nenhuma honestidade e confiança. Se Temer é criminoso, que vá para a cadeia sem a contrapartida de enfrentarmos uma eleição indireta e uma articulação da extrema-esquerda para retomar poder e influência. Se Temer é criminoso, que seja execrado e condenado depois que tivermos a chance de eleger um novo presidente no ano que vem.

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