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Retrospectivas 2019 — Não Ficção
| Foto: Reprodução/Wikimedia Commons

Como eu havia prometido na minha coluna da semana passada, hoje vou listar os melhores livros de não ficção que li neste ano de 2019 de Nosso Senhor. Eu sei que não apresento critérios muito objetivos para determinar a presença de certos livros nesta lista; confesso que, na idade que estou, só leio por prazer e para satisfazer algumas obsessões intelectuais. Não tenho qualquer compromisso, vamos dizer assim, “profissional” com a leitura – considerando que não faço qualquer distinção entre ler por prazer e ler para o bem da minha vida profissional como professor de Filosofia. Digo isso porque, especialmente este ano, na categoria de não ficção, li três tipos de livros: os de teologia filosófica, os de filosofia política e alguns ensaios a respeito de temas mais abrangentes como a cultura, a sociedade, os dilemas do homem moderno etc.

O primeiro livro que eu destacaria foi Ser e Deus: Um enfoque sistemático em confronto com Heidegger, Levinas e Marion (Unisinos, 2011), de Lorenz B. Puntel. Para ser sincero, Lorenz B. Puntel é um dos filósofos que eu mais tenho lido ultimamente. Curiosamente, ele nasceu na cidade de Sobradinho (RS), em 1935. Foi para a Alemanha e lá se formou como filósofo. Estudou com Heidegger e foi aluno de um dos mais importantes teólogos do século 20, o jesuíta Karl Rahner. Em 2006, Puntel publicou sua grande obra Estrutura e Ser: um quadro referencial teórico para uma filosofia sistemática (no Brasil foi publicada pela Unisinos em 2008). Mas, a respeito de Ser e Deus, a pergunta básica que percorre toda obra é a seguinte: qual a forma adequada de se falar filosoficamente de Deus? E faz uma diferença absurda saber responder essa simples perguntinha. No Brasil, a melhor introdução à obra de Puntel é a do professor Manfredo A. de Oliveira: A metafísica do ser primordial: Puntel e o desafio de repensar a metafísica hoje (Loyola, 2019).

Especialmente este ano, na categoria de não ficção, li três tipos de livros: os de teologia filosófica, os de filosofia política e alguns ensaios a respeito de temas mais abrangentes

A segunda melhor obra que li este ano aborda a relação entre teologia e política. E, se você se interessa pelo debate acerca do “Estado laico” ou das relações entre Igreja e Estado, fé e poder, cristianismo e política, então você não pode deixar de ler A Metamorfose da Cidade de Deus: filosofia social no cristianismo (Cultor, 2018), de Étienne Gilson. Sem dúvida nenhuma Gilson merece destaque entre os maiores filósofos e historiadores da filosofia no século 20. Se você não conhece, recomendo muito dar uma olhada em obras como O Espírito da Filosofia Medieval; A Filosofia na Idade Média; Introdução ao Estudo de Santo Agostinho; O ser e a Essência; Introdução à Filosofia Cristã; O Filósofo e a Teologia. De qualquer forma, o livro A Metamorfose da Cidade de Deus trata “do Povo que formam os cristãos dispersos através das nações da terra”.

O terceiro livro que gostaria de destacar entre minhas principais leituras foi A política em Aristóteles e Santo Tomás, do autor argentino Jorge Martinez Barrera (editora CDB, 2018). Eu gostei muito da discussão proposta pelo autor a respeito da relação e das diferenças entre a filosofia prática (ética e política) de Aristóteles e de Tomás de Aquino. Basicamente, a tese de Martinez Barrera é a de que não faz muito sentido falar em filosofia “aristotélico-tomista”. Para quem fala em “civilização ocidental” como se fosse uma unidade cultural (filosófica e moral) tranquila, trata-se de uma obra decisiva para entender que o problema é bem mais complexo quando visto a partir dos confrontos, muito bem articulado a partir dos textos sobre filosofia prática, entre Aristóteles e Tomás.

Para o quarto livro da lista, destaco uma obra que me surpreendeu muito, sobretudo no que se refere a uma crítica muito dura à tradição política liberal: Ethos y Polis: Bases para la reconstrucción de la filosofía política, do filósofo Alfredo Cruz Pardos, ligado ao Departamento de Filosofia da Universidade de Navarra, na Espanha. Já o primeiro capítulo aborda uma análise rigorosa e muito consistente a respeito das atuais categorias políticas. Alfredo Cruz Pardos mostra a irracionalidade do liberalismo e a necessidade de reabilitar a tradição republicana. É uma das melhores introduções que li a respeito do tema do republicanismo diante da força hegemônica do liberalismo. Para quem está acostumado com o debate “socialismo x liberalismo”, “direita x esquerda”, essa obra será uma surpresa. Trata-se de um livro de “resgate” da tradição da filosofia política.

Para encerrar, gostaria de mencionar alguns ensaios com temas mais abrangentes que merecem destaque nesta retrospectiva. O primeiro é livro de Martim Vasques da Cunha: A Tirania dos especialistas: desde a revolta das elites do PT até a revolta do subsolo de Olavo de Carvalho (Civilização Brasileira, 2019). O segundo é de Mathieu Bock-Côté: O multiculturalismo como religião política, publicado pela É Realizações. O terceiro foi publicado, também este ano, pela Editora LVM: Por que gênero importa?, de Leonard Sax – um dos melhores livros a respeito do debate sobre “gênero”. O quarto e último é a excelente obra de Peter van Inwagen: O problema do mal, publicada em 2016 pela UnB.

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